Troia: um conflito léxico.

Juliana Gallo
Medium Brasil
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2 min readApr 12, 2015

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Como brasileira, considero a língua portuguesa um dos aspectos mais lindos do nosso enorme país. Tanto pela sonoridade quanto pela complexidade de nossas palavras que, convenhamos, parecem ter sido desenhadas à mão e com todo o carinho do mundo.
Depois dessa pequena declaração de amor à minha língua materna, também sei que há tantos outros idiomas no mundo que são lindos, cada um com suas particularidades encantadoras, com suas diferenças e alfabetos de traços distintos. Entretanto, às vezes essa sopa de letrinhas que são as tantas línguas existentes se esbarram nas fronteiras do entendimento, o que pode causar efeitos colaterais, entre eles o riso. Ou o constrangimento. Ou ambos.
O espanhol, por exemplo, pertinho do português em tantos aspectos que se pode construir um diálogo em ambas os diomas e todos se entendem perfeitamente bem. Isto é, até que a conversa vira uma esquina para o trânsito congestionado e a palavra “buseta” chega ao malicioso ouvido brasileiro. Ou português. E eis o riso incontrolável.
O italiano por sua vez, que se fala com paixão, com o corpo inteiro, tão próximo e tão distante do português, tão inofensivo, e eis que o inevitável constrangimento vem à tona. E claro, o riso, sempre o riso.

Um dia, enquanto dividia apartamento com italianos viventes do mundo, a TV estava ligada em seu habitual ruído de fundo, com o filme “Troia” passando. E então eu resmungo o nome do filme com o nome em português, como quem não quer nada, só pra quebrar o silêncio que se instalou durante o café da manhã:

Hum, Troia.
E percebo a italiana me olhando de maneira quase brava. Não dei bola, até que alguns segundos depois ela questiona:
- Troia.
- Sim.
- Puta?
Minha reação foi como se um parafuso tivesse caído da minha cabeça. Por que estava ganhando uma colher de ofensa sem razão no meu café preto? Quebrei a cabeça pensando se o filme, por alguma razão, ofendia os italianos de alguma forma que eu não fazia ideia. Teria eu perdido essa aula de história? Após alguns segundos de desgosto mútuo, simplesmente disse:
- Oi?!
- Troia. Significa “puta” em italiano, é extremamente ofensivo.
E fez-se a luz.
Despenquei a rir e apontei para a TV. Tudo naturalmente acabou em ainda mais riso.

E aprendi o porquê do nome “Elena” não ser muito comum por lá.

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