Baile Charme: a riqueza cultural de um Rio que fica do outro lado do túnel

Melissa Makers
Melissa  Mexe
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4 min readOct 3, 2016

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Passar a semana toda preparando uma roupa, treinando um passinho com a galera e ouvindo os sons que vinham da efervescência da black music norte-americana. A história do Baile Charme do viaduto de Madureira é a história de uma mistura estética e de uma relação com o espaço urbano que revela, ainda hoje, outras belezas do Rio — esse Rio que fica do “outro lado do túnel” e extrapola a Zona Sul. Géssica Justino, produtora, dançarina e pesquisadora de “riodejaneirices”, fez com que a gente soltasse o nosso charme na Zona Norte carioca e é quem conta um pouco da história desse rolê imperdível na capital carioca.

Remontando a origem do Baile, Géssica conta que essa cena começa junto com o movimento R&B. O Charme é o encontro desse R&B vindo dos EUA com um jeito de dançar que era próprio do carioca. “Começou assim, com a mistura daquela melodia com um estilo de movimento carioca — movimento do corpo, mesmo. Toda vez que chegava o momento num baile de disco, no fim dos 70s e início dos 80s, em que se tocava o R&B, se falava assim: ‘solta seu charme’. E aí começava um tipo de dançar muito próprio.”

Aos poucos esse movimento foi se alastrando e migrando entre o subúrbio carioca e os bailes da Zona Norte até chegar em Madureira, como um movimento de rua que acontecia embaixo do viaduto Negrão de Lima. Depois, com a organização de camelôs que trabalhavam ali embaixo, acabou se fixando por ali o Baile, área que em 2000 ganhou o nome oficial do governo carioca de Espaço Cultural Rio Charme.

Apesar de ainda ser criança nessa época, o começo da história do Baile é também um pouco a história de Géssica, que conta que via sua mãe se preparando durante dias, escolhendo a roupa e treinando as coreografias. Essa ansiedade boa de pensar no look, ensaiar os passinhos e se inteirar desde cedo nos sons que seriam tocados na noite, é algo muito típico do Baile e segue forte até hoje.

Ainda que tenha ganhado bastante visibilidade nesses 26 anos de história, o Baile Charme segue sendo um espaço ainda a ser descoberto por muitas pessoas que visitam e habitam o Rio. “O fato de que muita gente no Rio não conhece ainda o Baile é só um reforço dessa segregação que a gente tanto luta pra que seja rompida por aqui. O poder criativo de ditar moda e cultura da região que fica ‘do túnel pra trás’, como a gente chama, ou seja, Centro, Zona Norte e Zona Oeste — e até mesmo a Baixada — é incomparável. Esse é um grande problema ainda, um Rio que pouco se mistura.”

“Sendo um grande legado da cidade, todas as pessoas — independente de gênero, de classe, de gosto — fazem do Baile um lugar de lazer e de referência de noitada”, reflete Géssica sobre a atual importância desse movimento.

Atualmente, quem faz o baile — que acontece todo sábado, a partir das 22h — é uma galera que cada vez mais traz outras influências de dança e de moda, dialogando com o indie rock e também com o funk. “Você consegue ver ali pessoas que vão pra curtir um samba, mães que levam seus filhos adolescentes, gente jovem que quer dançar muito… O Baile é um mix de todos os tecidos culturais e estéticos que existem em Madureira, no subúrbio e, por que não, no Rio como um todo”, finaliza Géssica.

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Melissa Makers
Melissa  Mexe

Em 2016, Melissa Makers é um convite à mistura. E é desse encontro criativo que surgiu o Melissa Mexe!