O que não falta em Maria Luiza Maia

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6 min readJun 24, 2020

Escrito por Bruno Santana, Rayssa Machado e Victor Lucca Cerqueira

A jovem escritora baiana fala sobre flores, teatro, Bon Iver e seu primeiro livro, “Algumas Histórias Sobre a Falta”.

Uma livraria simples, pequena e escondida entre a agitação e a beleza do Porto da Barra. Um verdadeiro “planeta-leitura” de atmosfera reconfortante. Ao subir as escadas do estabelecimento, logo à direita, uma velha estante recheada de livros te convida ao simples olhar.

Ao centro, duas poltronas meio desgastadas — uma vermelha, outra florida — anunciam um espaço de aconchego para qualquer um que queira ler. As duas estão na companhia de uma clássica mesa de centro, onde o frequentador pode relaxar os pés e repousar os livros. Embaixo, um tapete de lã compõe a cena com maestria.

Nenhum lugar poderia ser mais apropriado para conversar com Maria Luiza Maia, jovem escritora baiana que, aos 23 anos, já lançou seu primeiro livro, “Algumas Histórias Sobre a Falta”. A obra, uma coletânea de contos e poemas publicada pela Editora Mondrongo, não poderia ter outro título: a própria autora, afinal, afirma que “nós não somos pessoas inteiras nunca”.

A afirmação não é gratuita. Maria Luiza tenta transportar para seu livro o olhar clínico de uma estudante de psicologia de traços intimistas e atentos para a humanidade: “eu gosto de ler sobre gente, sobre vida e me identificar com o que estou lendo”, conta.

De fato, tanto gosta, que pretende “piratear” o próprio livro via Internet. A autora afirma que esse não é o momento para tal ação por conta da sua relação com a editora, que bancou a segunda edição do seu livro após uma primeira tiragem publicada de forma independente. Ainda assim, está nos planos: segundo Maria Luiza, a ideia é espalhar seus escritos e seus sentimentos para a maior quantidade possível de pessoas e contribuir para a difusão da cultura de forma democrática.

A paixão por tudo que fala é acompanhada (ou, talvez, contrastada) pelo rosto redondo, pelos cabelos cacheados e pelos grandes óculos que lhe dão um ar tranquilo. As expressões sempre vêm acompanhadas de inúmeros gestos com as mãos, mas ao terminar cada explicação, Maria Luiza volta para uma pose mais contida, à espera de outra pergunta.

Nos momentos de entusiasmo ao discutir um tema, às vezes, lhe escapole algum palavrão. No momento em que nota o deslize, logo o recolhe ou o disfarça com um “caramba”. Se não o percebe, por outro lado, continua empolgada a falar de suas paixões e experiências.

O teatro

Maria Luiza — ou Malu, para os íntimos — é de Feira de Santana, onde morou até vir fazer faculdade de psicologia em Salvador. A Princesa do Sertão, entretanto, não era muito propícia para os hobbies da jovem escritora, especialmente os artísticos. Ela conta que, quando morava na sua cidade natal, cansava de vir à capital baiana para ver filmes e peças de teatro. Esse último, inclusive, ela toma como a própria religião: “eu rezo antes de entrar em um teatro”, revela.

O amor é tanto que ela já foi a inúmeras cidades, de São Paulo até Londres, atrás de espetáculos. Tentou ser atriz, mas percebeu que não era muito sua praia. Há um ano, decidiu tentar o sapateado — algo que de fato foi recompensador, de uma forma bem mais significativa que a dança. Grande parte dos seus companheiros e amigos de salão também são atores, o que ocasionalmente lhe garante a presença em peças para prestigiar os colegas e lhe dá uma oportunidade para deleitar-se com seu grande fascínio. “Não imagino minha vida sem o teatro”, exprime a sua dependência a essa forma de arte.

Esse amor não se restringe aos palcos. É muito provável que você encontre Maria Luiza numa sala de cinema, numa apresentação artística, numa exposição, numa feira ou em qualquer tipo de evento que envolva uma forma de arte. Isso, claro, até que venha o puxão de orelha: “minha mãe fala que já está bom de exposição, teatro e essas coisas todo mês”, brinca ela, em referência ao controle financeiro da mãe nos gastos com seu hobbies.

As flores

“I told you to be patient” (“eu te disse para ser paciente”), toca os ouvidos de Maria Luiza, verso da música Skinny Love da banda Bon Ive, lhe deram uma nova visão de mundo. Os videoclipes do grupo norte-americano, com estética inspirada nas florestas temperadas, despertaram na jovem uma paciência, que nunca tivera, para apreciar a natureza.

A partir daí, ficou louca por plantas. Começou a procurar locais florestados perto de Salvador, querer plantar, ir a floriculturas e encher sua casa de verde. “Suculentas em promoção por dois reais… eu comprava 15”, conta Malu sobre sua “maluquice” com o reino vegetal.

Como não poderia ser diferente, as plantas também estão bem representadas em seu livro. Tanto na primeira versão, independente, quanto na mais recente publicada pela Mondrongo, o que se vê são flores na capa. Na primeira, flores rosas e amarelas saem das costas de uma mulher. Na segunda, um enorme buquê de rosas cobre metade do corpo de uma mulher enquanto, ao fundo, um casal é unido por uma rosa vermelha.

Maria Luiza lembra que, no processo de montagem da segunda edição do livro, deu carta branca aos designers responsáveis pela capa por já admirá-los há um bom tempo. Só havia um pedido: “tem que ter flor!”, relembra.

A capa, aliás, foi o que conquistou inicialmente a atenção do escritor Valter Hugo Mãe, um dos ídolos de Maria Luiza. Ela conta que o autor foi instantaneamente atraído pela arte em uma feira literária e dali mesmo engatou uma conversa enriquecedora com a fã. Ela define o momento como um dos destaques da sua (até o momento) curta vida de escritora e, quando perguntada se Valter virou fã dela também, responde, modesta: “acho que ele virou fã dos designers!”.

A clínica

Uma parte indissociável da imagem de escritora projetada por Maria Luiza é seu mergulho na psicologia. A poucos meses de concluir a graduação, ela conta que escolheu a área pelo mesmo motivo que começou a escrever: o gosto por ouvir e contar histórias, saber de pessoas e conhecer o universo dentro de cada um.

De fato, os estudos da jovem influenciam seus escritos e seu próprio jeito de falar. Dentre todas as experiências relacionadas à psicologia, entretanto, nenhuma carrega em Maria Luiza tal impacto quanto seu estágio numa clínica de oncologia. Lá, a estudante conversa com os pacientes em quimioterapia, aplicando uma abordagem profissional para confortá-los e ajuda-los a superar o momento de dificuldade.

Malu é rápida em acrescentar que nunca teve experiências traumatizantes na clínica. Por ser um ambiente mais restrito, onde geralmente se tratam pessoas com estágios menos avançados de câncer, é raro que ela aborde casos muito graves ou terminais. Ainda assim já houve casos dela receber a notícias de pacientes que morreram poucos dias após o atendimento, o que sempre causa uma forte emoção na jovem artista, em breve psicóloga.

Enquanto observa a prateleira na livraria reservada a jovens escritores (ela inclusa), a jovem aponta para todos os autores ali expostos, que são seus amigos, e pondera que é difícil se manter somente com a venda de livros.

Questionada sobre a dicotomia entre a escrita e a psicologia, Maria Luiza afirma não precisar escolher: ela se vê equilibrando as duas profissões no futuro e, quem sabe, até mesmo combinando-as. Uma mão lava a outra: a psicologia a abastece de histórias, enquanto a escrita lhe dá a habilidade de processá-las e colocá-las no mundo ao seu jeito. Parece a combinação perfeita.

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