The witness(2016)

The witness: a experiencia do jogo em sua materialidade

Lucas Nóbrega
5 min readJul 29, 2019

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The Witness” é um jogo de quebra-cabeça (ou puzzles), de primeira pessoa em um mundo aberto com diversos locais a serem explorados. Foi desenvolvido por Jonathan Blow, publicado pela Thekla, Inc. em janeiro de 2016 e encontra-se disponível para todas as plataformas, consoles, PCs e Mobile. Encanta com todo o seu visual realista, a falta de interfaces mecânicas e seus únicos controles que são um cursor e a movimentação do personagem.

A estrutura do jogo interage de forma pedagógica com o jogador: na introdução, ensina como funcionam os quebra-cabeças, o que ocorre em um estilo labirinto que movimenta o cursor de um ponto central a um ponto final. Os puzzles são inseridos com variadas propriedades de acordo com o ambiente e assim sua lógica é progredida para mais puzzles, chegando a maiores complexidade progressivamente.

Assim que o jogador acessa as dimensões da ilha (mundo) não existe nenhum impedimento: o jogador tem o poder de agência, está livre para começar de qualquer ponto do ambiente, aberto a conhecer os variados locais e como os puzzles se manifestam em cada um. É um contexto muito instintivo, desenvolvido à preferência e atração do jogador a conhecer os ambientes da ilha, não sendo obrigado a seguir nenhum roteiro imposto.

Sem um caminho estabelecido, a experiência do jogador é a mais mutável possível, podendo começar e já produzir uma frustração por não entender como o enigma se comporta. Esse problema é transportado para o jogo em si: tanto o personagem não entende o que acontece quanto o jogador não compreende, de princípio, os padrões do jogo. Assim, as nuances se desenvolvem em entender o ambiente, entender os quebra-cabeças, entender o cenário e o protagonista.

A forma como é feito esse simulacro que desenvolve o entendimento, trata-se de uma empatia simulacional. Assim, todos os fatores ambientes do jogo desenvolvem tal empatia. O cenário conta com um mais vasto detalhamento e realismo, com lindas paisagens e minuciosos sentimentos. As cores são bem vivas, o que simula paisagens reais mais destoantes de um contexto urbano. Os sons que são como um campo quase silenciosos por não possuírem uma trilha sonora, conectam o jogador a esse momento e não ditam a forma como desenvolve a experiência: são apenas elementos de imersão. Estão propondo uma interação a esse sistema de forma mais aberta, contando uma narrativa em que você a constrói com sua própria vivência, com o olhar de pessoa para a situação da simulação.

O sistema de jogo de quebra-cabeça é apropriado ao ambiente apresentado uma vez que todo o repertório de quebra cabeça — sua vivência, o fato do seu estilo de labirinto ser tão comum a nosso cotidiano — trazem uma certa familiaridade, que se encaixa muito bem a esse sistema de jogo. Trata-se de um olhar diferente para essas ferramentas, para o campo com vegetação, para o quebra cabeça. Isso ocorre porque, muito diferente de jogos casuais que utilizam essa mecânica, “The Witness” usa dos elementos de imersão para dar outro valor a esses elementos.

O jogador, dependendo da sua plataforma, vai experimentar o jogo de uma forma diferente. Porém, pela falta de uma interface gráfica com dados do personagem, de um mapa e de um ícone ou intermédio visual fora o ambiente e a visão do personagem (que faz o contato direto ao jogador, a primeira pessoa, em seu sentido simulacional), todos os intermediários de um jogo de primeira pessoa são excluídos em “The Witness”. Dessa forma, o jogador é o mais próximo da realidade da ilha, o mais imerso aos problemas e deslumbres visuais proposto para a maior empatia do jogador às experiências desse mundo.

Os controles adicionam à experiência, como já dito, e o personagem só pode andar em suas diversas direções, acionar e controlar o cursor. Essa mecânica é mais do que uma ferramenta: é um elemento material e narrativo, pois a convivência no mundo de “The Witness” é moldada pela sua experiência no ambiente do jogo. Assim, seu olhar ao redor vai refletir no entendimento dos quebra-cabeças. Desse modo, o papel do jogador é tão presente quanto o personagem que só passeia pelos lugares e só observa o ambiente em sua volta. A ação do jogador que determina o aprendizado do personagem e a resolução dos puzzles. Como as limitações das mecânicas conectam o personagem ao jogador, pode-se chegar a assimilar as semelhanças simulacionais.

Assim que é entendida essa conexão do ambiente do jogo e os puzzles, o jogador entra em uma nova experiência de jogo, em que os quebra-cabeças não estão só em caixas, mas na ilha toda. Além disso, o jogador chega a descobrir que o próprio cenário se torna um quebra-cabeça que pode ser solucionado. Assim, a forma como o usuário interage com o meio é totalmente diferente, prestando atenção em todos os cantos, em lugares onde ele já havia passado e, nesse sentido, o significado é interpretado de outra forma. Desse modo, o jogador assimila padrões na natureza e dá um ressignificado ao ambiente, pensados para que ele possa apreciar o momento jogado, praticar o olhar e valorizar a arborização e eventos naturais.

A narrativa é tão indireta que só conseguimos acessar e compreender as pistas com o avanço na resolução dos quebra-cabeça. Nesse sentido, o jogador é mais provocado pelo desafio da resolução dos problemas do que um chamado narrativo. Assim, todas essas ferramentas do jogo para aproximar o jogador ao mundo jogado são propositais, uma vez que a mensagem do jogo é contada por detalhes no meio de todos os quebra-cabeças e ambientes realísticos.

A curiosidade em entender a trama e a recompensa por desvendar os quebra-cabeças narrativos tornam mais que única a experiência do jogo. O jogador é tão criador da sua experiência com o próprio Jonathan Blow. O jogador é formador da realidade da sua narrativa, as interpretações são tomadas por parte dele mesmo, sem interferência direta: é como uma conversa que é amarrada aos poucos e não se sabe onde começa ou termina. Mas sua trajetória de crescimento de absorver as frustrações mecanis em prazeres interpretativos.

Toda a relação desse meio que envolve, é fazer com que o pensamento do jogo, o raciocínio cultuado, seja passado para um pensamento mundano. A observação do ambiente é levada para o reflexo do nosso ambiente, dos nossos puzzles do cotidiano. Trata-se do parar para olhar o que está acontecendo e entender a sua realidade sob um novo olhar dos seu problemas; revisar seu locais com outro ponto de vista; entender sua realidade e ter um poder de agência empática. “The Witness” trabalha o jogador fora da tela.

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