As principais características do Vasco de Ramon Menezes em seis meses de trabalho

Ex-meia estabeleceu um padrão de jogo para o cruzmaltino, superando as expectativas do começo da temporada

João Terra
Mezzala
7 min readSep 30, 2020

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(Foto: Rafael Ribeiro)

Há exatos seis meses, no dia 30 de março, o então auxiliar fixo do Vasco da Gama, Ramon Menezes, foi anunciado como treinador do clube para a sequência da temporada. Com um elenco longe de figurar entre os melhores do país, o ex-meio-campista vem conseguindo extrair o melhor de alguns jogadores, dando uma identidade à equipe, que apresenta um futebol com características marcantes.

Como todo treinador, Ramon sofre alguns questionamentos válidos por parte da torcida. É inegável, porém, que sua trajetória no comando do Gigante da Colina obtém um saldo positivo, comparado às expectativas para a temporada no começo do ano, quando Abel Braga era o técnico.

Apesar de completar seis meses no cargo, o treinador de 48 anos tem apenas 14 jogos em 2020, por conta da pandemia do coronavírus. Nessas partidas, Ramon conquistou oito vitórias, empatou em três oportunidades e foi derrotado três vezes.

Entre esse tempo, o time passou por uma eliminação na Copa do Brasil contra o Botafogo, na quarta fase da competição, mas figura entre os primeiros colocados do Campeonato Brasileiro desde o começo.

Voltando a falar da identidade de jogo dada por Ramon Menezes à equipe do Vasco, vamos conhecer e entender alguns padrões repetidos ao longo dos jogos e as principais características do time.

Time base do Vasco de Ramon Menezes (Foto: Pedro José Domingues/Mezzala)

Vale ressaltar que, a cada partida, há um número alto de desfalques, principalmente com a ainda presente transmissão da COVID-19. No time base, estão os jogadores que Ramon mais confia e mais utiliza quando disponíveis. Dito isto, vamos analisar como joga a equipe vascaína:

SAÍDA DE BOLA

Apesar de, em momentos de muita pressão por parte do adversário, o time executar uma ligação direta para o setor ofensivo (geralmente para o centroavante Germán Cano), o Vasco busca priorizar uma saída curta e elaborada, construindo o jogo desde o goleiro Fernando Miguel.

O lateral-esquerdo Henrique sempre baixa à linha dos zagueiros (Ricardo Graça e Leandro Castán) para realizar uma saída de três, visando à superioridade numérica contra os atacantes adversários que tentam pressionar a saída vascaína. Como a maioria dos times brasileiros defende com dois jogadores mais avançados (4–4–2, geralmente com meia-atacante e centroavante tentando atrapalhar os defensores do rival), o Vasco consegue ter mais jogadores que o adversário nesta fase, facilitando os avanços do time para o ataque.

Saída de bola do Vasco contra a pressão adversária, tendo superioridade numérica em 3x2

Além dos três jogadores que iniciam o momento com bola, o primeiro homem de meio-campo é fundamental para auxiliar na saída. Andrey é o responsável por se posicionar por trás da primeira linha de marcação do adversário, sendo a primeira opção de passe dos zagueiros. Com a bola chegando ao camisa 15, o time encontra facilidade para continuar avançando no campo.

Em momentos de muita dificuldade para progredir, Fellipe Bastos pode aparecer ao lado de Andrey, sendo mais uma opção de passe para os três jogadores que realizam a saída. O camisa 8 tem uma certa liberdade quanto à sua movimentação, podendo ser um auxílio para Andrey ou aparecer em zonas mais avançadas, preenchendo o campo de ataque.

Apesar dessa ajuda, Andrey é o principal elemento desta fase do jogo, exercendo um papel fundamental nas costas dos atacantes adversários.

Primeira fase de construção do Vasco em 3+1

ATAQUE POSICIONAL

Vasco em ataque posicional

O Vasco busca uma ocupação racional dos espaços no campo adversário, utilizando alguns elementos do Jogo de Posição. As características dos atletas favorecem a prática desses conceitos, que serão detalhados um pouco mais aqui.

A utilização da amplitude — dois jogadores bem abertos, quase colados à linha lateral, simultaneamente — tem o objetivo de fixar os laterais adversários nos dois lados do campo, tentando abrir a linha defensiva rival para aproveitar os espaços com infiltrações. No caso do Vasco, a amplitude é feita pelos pontas. Tanto Vinícius Paiva quanto Talles Magno são desequilibrantes no um contra um e muito velozes, levando vantagem nos duelos individuais, na maioria das vezes.

Por ser uma das referências técnicas do elenco, Talles, muitas vezes, sente a necessidade de estar mais perto do gol adversário, buscando finalizar mais as jogadas. Com isso, há uma liberdade entre ele e seu companheiro pelo lado esquerdo, Martín Benítez, revezando nas funções de abrir o campo e se aproximar do centroavante Germán Cano. Ora Talles espera aberto na extremidade esquerda com o argentino trabalhando por dentro, ora o camisa 10 abre o campo para o jovem de 18 anos se aproximar do gol.

Uma das marcas desse Vasco é o lateral-direito, Yago Pikachu, atacando por dentro. Ele exerce a função de explorar as zonas entre linhas do adversário e atacar o espaço entre zagueiro e lateral do rival para invadir a área, aproveitando a fixação feita pelo ponta-direita (Vinícius). Como suporte à dupla desse lado, Fellipe Bastos aparece trabalhando na base da jogada, para formar triangulações pela lateral, ou até mesmo aparecendo entre linhas, chegando como um elemento surpresa à área rival.

Outro atleta que trabalha entre as linhas rivais é Martín Benítez — que vai muito bem por ali, inclusive. Logicamente, também é possível ver Talles Magno por este setor, de acordo com o revezamento já citado entre os dois.

Espaço entre as linhas adversárias, aproveitado por Pikachu e Benítez/Talles

Artilheiro da equipe (16 gols em 27 jogos com a camisa do Vasco), Germán Cano é quem dá profundidade ao ataque, empurrando os zagueiros para perto de seu próprio gol, aumentando o campo efetivo a ser trabalhado. O argentino é especialista no movimento de ruptura, agredindo a linha defensiva para receber na frente. Cano também ajuda em apoios, participando entre linhas e acionando companheiros.

No entanto, o que mais chama a atenção no camisa 14 é seu aproveitamento e qualidade nas finalizações. Quando não participa muito diretamente da construção dos ataques, é fatal balançando as redes, geralmente com poucos toques antes dos chutes.

Cano é um dos vice artilheiros do Campeonato Brasileiro, com sete gols (Foto: Rafael Ribeiro)

MOMENTOS SEM BOLA

Assim que perde a posse, os comandados de Ramon Menezes costumam realizar uma pressão pós-perda para recuperar a bola o mais rápido possível. Caso não obtenha sucesso, se organiza defensivamente.

O Vasco, na maioria das vezes, se porta com um bloco médio/baixo na organização defensiva. Dependendo da situação de cada partida, avança sua pressão até a saída de bola adversária.

É possível visualizar duas estruturas na organização defensiva do Vasco:
4–4–2 e 4–1–4–1. A utilização de cada uma delas depende do posicionamento de Benítez. Quando o argentino fica ao lado de Cano, na primeira linha de marcação, duas linhas com quatro jogadores são formadas atrás dos dois. Já se o camisa 10 recuar mais para brigar no meio-campo, Cano marca isoladamente os zagueiros rivais, e Andrey se posiciona entre as duas linhas de quatro formadas.

Organização defensiva do Vasco em 4–4–2 (primeira imagem) e 4–1–4–1 (segunda imagem)

Uma das deficiências do time do Vasco é a proteção das zonas entre as suas linhas. Muitas vezes, Andrey fica totalmente exposto nessa área do campo, principalmente quando Bastos abandona sua posição para adiantar a pressão. Em situações que o camisa 15 não está disponível, é sentido ainda mais esse problema. Mesmo quando a reposição é o interessante Bruno Gomes, a equipe fica bastante fragilizada defensivamente.

No entanto, um ponto bastante positivo é a dupla de zagueiros. Ricardo Graça e Leandro Castán, ambos canhotos, dão enorme segurança protegendo a área, tanto em disputas aéreas quanto em dividias pelo chão. Os dois contribuem bastante defendendo sua área quando os adversários chegam com mais perigo perto da meta de Fernando Miguel.

Recuperando a bola no setor ofensivo, a equipe busca rapidamente Germán Cano para puxar os contra-ataques. Outro que contribui consideravelmente nas transições ofensivas é Benítez, jogador mais criativo do elenco. Contra adversários que reorganizam sua defesa rapidamente, busca controlar a posse para construir seus ataques com calma.

Analisadas as características do Vasco comandado por Ramon Menezes, pudemos entender um pouco mais sobre o padrão de jogo do cruzmaltino. Apesar de não ser um candidato para brigar pelo título brasileiro, o desempenho na atual temporada é bem acima do esperado nos primeiros meses do ano.

Pelo que parece, o Gigante da Colina não passará tanto sufoco para permanecer na elite do futebol nacional, algo que não é comum para o time de São Januário nos últimos anos. Mesmo com a precoce eliminação na Copa do Brasil, a superação das expectativas dentro de campo já fazem a temporada ser considerada positiva.

(Foto: Divulgação/Kappa)

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