Campeões de Champions: Real Madrid 13/14

Com o super trio de ataque BBC, a equipe merengue conquistou a “La Décima” em uma campanha marcada por várias goleadas

João Terra
Mezzala
12 min readJun 12, 2020

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Real voltou a conquistar a Champions 12 anos depois de seu último título europeu (Foto: Divulgação/realmadrid.com)

A temporada 2013/2014 está marcada na história do Real Madrid. Além de ser praticamente imbatível dentro de campo, aquela campanha simbolizou a volta do time a uma final de Champions após 12 anos, um tempo bastante considerável para um clube como o Real. Em 2002, derrotou o Bayer Leverkusen na decisão, por 2 a 1. Nesse tempo, os merengues acumularam vexames e eliminações precoces.

Esse período poderia ter sido um pouco menor, porém, em 2013, os blancos foram eliminados na semifinal pelo Borussia Dortmund. Após sofrerem 4 a 1 na Alemanha, os espanhóis venceram por 2 a 0 a partida de volta, faltando apenas um gol para a classificação à final. Foi bastante dramático, e ninguém queria que a história se repetisse.

Para a temporada 13/14, o Real Madrid contou com algumas contratações notáveis, como Isco (vindo do Málaga) e Gareth Bale (comprado do Tottenham). A transferência do galês, na época, era a mais cara do mundo, estimada em 101 milhões de euros. No comando do ótimo elenco, um novo comandante: Carlo Ancelotti. O italiano chegou do Paris Saint-Germain e acumulava dois títulos de Champions League, ambos com o Milan, nas temporadas 2002/03 e 2006/07. Carletto foi muito bem em sua primeira temporada à frente da equipe espanhola, conseguindo conquistar a Europa pela terceira vez na carreira.

Como jogava o Real de Ancelotti?

Time base do Real na temporada 13/14

A principal arma da equipe merengue eram os contra-ataques, explorando bastante a velocidade de seus jogadores ofensivos, principalmente de Bale, mas também de Ángel Di María e Cristiano Ronaldo, além da ótima leitura de espaços de Karim Benzema.

Na saída de bola, Xabi Alonso, muitas vezes, buscava a bola entre os zagueiros em uma saída de três, dando aos laterais o papel de amplitude. Pela direita, Luka Modrić se mantinha na base da jogada para dar o primeiro passe, geralmente para Bale, que se posicionava nas entrelinhas adversárias. Do outro lado, havia mais liberdade de movimentação, principalmente por ser o setor de Cristiano Ronaldo. Quando o português recebia bem aberto pela esquerda, cabia ao lateral infiltrar por dentro. Se encostasse mais em Benzema, Marcelo ou Fábio Coentrão atacava mais próximo à linha lateral. Di María era outra peça fundamental na questão de criação das jogadas. O argentino, jogando como um meio-campista pela esquerda — diferentemente de na maioria da carreira — , atuava como um elemento surpresa para chegar à área ou atacar por fora, no espaço deixado por Cristiano.

Em zonas mais próximas à meta adversária, a constante movimentação do seu trio ofensivo era bastante perceptível. Não era nada incomum ver Cristiano recebendo do lado direito ou Bale flutuando pela esquerda. Benzema também saía bastante da área, condicionando as entradas em diagonal dos seus companheiros de ataque.

Em fase defensiva, o Real também era competente. Ancelotti orientava muito bem seus atletas a cumprirem os papéis na defesa, que era um ponto forte do time. Os jogadores já eram muito bons individualmente, o que ajudava bastante. A dupla de zaga, formada por Pepe e Sergio Ramos, ganhava a maioria dos duelos, tanto por baixo quanto os aéreos. Dos atacantes, Bale era quem mais contribuía, quase sempre recompondo e se alinhando aos jogadores do meio. Cristiano tinha pouquíssima obrigação nessa fase do jogo e ficava à espera dos contra-ataques. Como o camisa 7 não voltava tanto, cabia ao jogador mais à esquerda do meio-campo cobrir essa faixa, ajudando o lateral.

Organização defensiva do Real na temporada 13/14

Fase de grupos

O Real dividiu o grupo B com Galatasaray, Copenhagen e Juventus, ganhando os três primeiros jogos e já disparando na liderança. Na estreia, uma goleada pra cima do Galatasaray: 6 a 1, com direito a hat-trick de Cristiano Ronaldo. Pela primeira vez em casa, os merengues golearam novamente, dessa vez o Copenhagen, por 4 a 0. Na terceira rodada, os espanhóis enfrentaram a Juventus, o adversário considerado mais difícil, e venceram mais uma vez, mas com um placar mais apertado, de 2 a 1.

O time de Madri foi líder do grupo, com 16 pontos (Foto: Lucas Valeiro)

O único jogo que o Real não venceu na primeira fase foi o segundo contra a Juve, na Itália, onde os times empataram em 2 a 2. Nas duas partidas seguintes, mais duas vitórias tranquilas: 4 a 1 no Galatasaray, na Espanha, e 2 a 0 visitando o Copenhagen. A equipe comandada por Ancelotti confirmou seu favoritismo e avançou sem grandes preocupações para a fase seguinte.

Oitavas de final

O primeiro adversário na fase de mata-mata foi o Schalke 04, que se classificou em segundo lugar no grupo E. Os espanhóis eram os favoritos e confirmaram isso no campo. Na partida de ida, na Alemanha, o trio BBC fez uma de suas melhores atuações. Benzema abriu o placar com 12 minutos de jogo, em uma bela jogada do trio de ataque. Bale e Cristiano marcaram na sequência, já deixando o time confortável com o placar. Mas os três craques não estavam satisfeitos, e cada um fez mais um gol. Um verdadeiro massacre, que, mesmo com o golaço de Huntelaar nos acréscimos, não esteve perto de ser revertido. 6 a 1, dois gols de cada atacante e uma vantagem enorme para a partida de volta.

Na Espanha, jogando com um time misto, os mandantes conquistaram mais uma boa vitória, suficiente para confirmar a classificação para as quartas. Aos 20 minutos, Cristiano Ronaldo recebeu um cruzamento rasteiro de Bale para fazer o primeiro da partida. Dez minutos mais tarde, Hoogland arriscou uma jogada individual e chutou de fora da área. A bola desviou em Sergio Ramos, tirando as chances de defesa do goleiro Casillas. Apesar do empate no placar, o jogo já estava praticamente definido por conta do primeiro resultado entre as equipes. No segundo tempo, Bale se mostrou atento defensivamente e recuperou duas bolas cruciais no meio de campo. Em ambas as situações, serviu a Cristiano e Morata, que ampliaram a vantagem espanhola. Como já era esperado, o Real avançou de fase, com incríveis 9 a 2 no placar agregado.

Hoogland em dividida com Cristiano Ronaldo (Foto: ESPN)

Quartas de final

O time de Madri teria como próximo adversário o Borussia Dortmund, seu carrasco na temporada anterior e então vice-campeão europeu. A equipe alemã não tinha a mesma força de um ano atrás, já que Mario Götze havia se transferido para o Bayern de Munique e, especialmente para essa partida, não contava com Robert Lewandowski, cumprindo suspensão. Com isso, o Real novamente era apontado como favorito, apesar de jamais poder duvidar da capacidade do organizado time de Jürgen Klopp.

O primeiro confronto, disputado no Santiago Bernabéu, começou bastante agitado. Com apenas dois minutos de jogo, Bale recebeu de Carvajal na área e deu um toque sutil para tirar de Weidenfeller, inaugurando o placar. Aos 26, Isco aproveitou a sobra na entrada da área para ampliar a vantagem, com uma finalização rasteira no canto direito do goleiro alemão. Já na segunda etapa, Modrić realizou uma bela interceptação no campo de ataque e deixou Cristiano Ronaldo cara a cara com Weidenfeller. O português, com muita categoria, não desperdiçou a oportunidade e fez o terceiro e último gol do jogo. Mais uma vez, o Real conseguiu ir para a partida de volta com uma ótima vantagem.

Carvajal, Xabi Alonso e Bale comemorando gol contra o Borussia (Foto: AP)

Na Alemanha, o Borussia contava com a apaixonada Muralha Amarela no Signal Iduna Park para tentar uma reação contra os merengues. Com a volta de Lewandowski, os aurinegros pressionaram desde o início da partida, dando bastante dificuldade para o Real avançar no campo. Apesar disso, aos 15 minutos, os blancos conseguiram chegar ao setor ofensivo com Fábio Coentrão (Marcelo estava machucado, e o português conquistou a vaga de titular na equipe), que tentou um cruzamento para o meio da área. A bola bateu no braço esquerdo de Piszczek, e o pênalti foi marcado. Na cobrança, Di María escorregou milésimos antes de encostar na bola, o que facilitou a bela defesa de Weidenfeller. O jogo teria sido bem mais tranquilo para o Real se o argentino convertesse a penalidade. Isso fortaleceu ainda mais o time alemão, que já era superior na partida. Alguns minutos após a grande defesa do seu capitão, Friedrich tentou uma bola longa para o ataque, e o zagueiro Pepe escorou para trás, na tentativa de recuar de cabeça para Casillas. A distância entre os dois, porém, era grande, e Marco Reus conseguiu interceptar e ficar frente a frente com o goleiro merengue. O camisa 11 aproveitou a oportunidade e marcou o primeiro da partida.

Ainda no primeiro tempo, novamente Reus recuperou a bola no meio de campo, após um passe errado de Illarramendi. O alemão encontrou Lewandowski dentro da área, que finalizou na trave. No rebote, o autor do primeiro gol fez mais um, deixando o Real bastante ameaçado e com medo de reviver a triste eliminação da temporada 12/13. Isso tudo que aconteceu nos 45 minutos iniciais fez com que o time de Ancelotti voltasse bem mais atento e focado na segunda etapa. Jogadores como Modrić e Pepe tiveram um crescimento perceptível e contribuíram para o Real avançar à semifinal. Mesmo com todo o momento de apreensão vivido em Dortmund, a equipe espanhola disputaria uma semifinal de Champions pela quarta vez consecutiva.

Semifinal

Chegando à fase em que caiu na temporada anterior, o time de Madri teria pela frente ninguém menos que o então campeão europeu: Bayern de Munique. Os alemães vinham praticamente com o mesmo elenco que conquistou a Europa, mas agora com Pep Guardiola no comando. Nenhum era considerado o favorito, pois seria um duelo de dois gigantes com grandes elencos e excelentes treinadores.

Jogando em casa, os madrilenhos viram seu oponente monopolizar totalmente a posse, como já era esperado. Apostando em contra-ataques e na sua forte defesa, o Real conseguiu impedir que o controle da bola por parte do Bayern se transformasse em grandes chances. Com 18 minutos de jogo, Cristiano Ronaldo achou Coentrão infiltrando na área bávara, com um ótimo passe. O lateral-esquerdo cruzou para Benzema na pequena área. Neuer já estava vendido no lance, e o camisa 9 se posicionou bem para apenas empurrar a bola para dentro do gol. Com isso, o Bayern passou a pressionar ainda mais, mas sem sucesso. Os mandantes tiveram uma atuação defensiva irretocável, e nada que os alemães faziam era capaz de furar o bloqueio adversário. Como na partida anterior pela competição, o Real passou por momentos de drama e sufoco, mas conseguiu segurar a vitória até o final.

Foi a 22ª partida entre os times na história da Champions (Foto: goal.com)

Na Alemanha, talvez um dos maiores jogos do Real na temporada. Novamente, o Bayern dominou a posse, mas os visitantes mataram o confronto em lances de bola parada e contra-ataque. Com 15 minutos jogados, Modrić cobrou escanteio pela direita, e Sergio Ramos pulou mais alto que todos para acertar uma forte cabeçada, fazendo o primeiro. Apenas quatro minutos depois, o zagueiro ganhou nova disputa aérea, após cobrança de falta de Di María e um desvio, também de cabeça, de Pepe. Esse resultado já praticamente sacramentava a classificação dos espanhóis, mas o show não parou por aí.

Ainda no primeiro tempo, aos 33, uma aula de contra-ataque. Bale recuperou a bola quase dentro de sua área e deixou para Di María conduzir rapidamente e já lançar Benzema no campo de ataque. O francês apenas dominou e tocou para Bale, em ultrapassagem. O camisa 11, pouco antes de invadir a área, rolou para Cristiano Ronaldo ficar sozinho com Neuer e marcar o terceiro do Real. O camisa 7 chegou a incríveis 15 gols naquela edição da competição, feito inédito, até então. Inclusive, ele é o único a conquistar a marca e não foi só nessa vez: nas temporadas 15/16 e 17/18 o craque também marcou 15 (ou mais) vezes na Champions.

A partida ficou marcada por duras dividias, discussões e um clima bem quente e revoltante para o Bayern, por conta do péssimo resultado. Os 3 a 0 ficaram no placar quase até o fim do jogo. Aos 43, Cristiano Ronaldo sofreu uma falta de Toni Kroos na entrada da área. Ele mesmo se preparou para a cobrança e surpreendeu todos com um chute rasteiro, por baixo da barreira. O goleiro bávaro ficou parado e apenas olhou o Real fazer o quarto na Allianz Arena e comemorar a classificação para a finalíssima, com o placar agregado de 5 a 0.

Cristiano Ronaldo comemorando a chegada à 14ª final de Champions League do Real Madrid (Foto: AP)

Dérbi de Madri na grande final

Na decisão, os comandados de Ancelotti teriam pela frente um dos seus maiores rivais, também de Madri, o Atlético. A equipe comandada por Diego Simeone chegou à final após empatar sem gols, em casa, contra o Chelsea e vencê-lo na Inglaterra com um placar de 3 a 1. O jogo prometia muita emoção pela rivalidade, pela ótima campanha que o time do Santiago Bernabéu vinha fazendo e também pelo estilo de jogo de seu adversário. Apesar de ter menos nomes de destaque do que o Real, os colchoneros vinham fazendo uma temporada excelente, competindo com os melhores e demonstrando sua força. Os rivais de Madri protagonizaram a primeira final da história da Champions a ser disputada por dois clubes da mesma cidade.

Os merengues tiveram que lidar com duas ausências na finalíssima, jogada no Estádio da Luz, em Lisboa. Pepe chegou a ir para o banco como opção, mas uma lesão na panturrilha fez com que Raphaël Varane o substituísse no time titular. O outro desfalque foi Xabi Alonso, que estava cumprindo suspensão, dando lugar a Sami Khedira. O Atlético também não pôde contar com força máxima na maior parte do jogo. Isso porque o atacante Diego Costa, artilheiro do time na temporada — com 8 gols na Champions, — foi substituído, com uma lesão na coxa, por Adrián, com apenas nove minutos.

O primeiro tempo foi de maior destaque ao Atlético, com uma defesa muito sólida que impediu o Real de criar chances claras de gols. O único momento de mais perigo foi aos 31 minutos, em um lance que Bale recuperou a bola no campo de ataque e invadiu a área. O galês, porém, chutou para fora, excessivamente à direita de Thibaut Courtois. Quatro minutos se passaram e o time colchonero tinha um escanteio pela direita para cobrar. O capitão Gabi cruzou a bola na área, Varane afastou e Juanfran cabeceou de volta. O zagueiro Diego Godín venceu a disputa aérea com Khedira, e a bola passou por Casillas, que, adiantado, não pôde evitar o gol.

Godín comemorando seu gol na final da Champions (Foto: Getty Images)

Já no segundo tempo, Ancelotti fez duas alterações para tentar reagir. Marcelo, recuperado da lesão, entrou no lugar de Coentrão, e Khedira foi substituído por Isco. As mudanças surtiram efeito e o Real melhorou no jogo. Foram diversas chances claras na etapa final, mas nenhuma convertida em gol. Cristiano Ronaldo, Benzema, Bale, Isco… Ninguém conseguia marcar.

Estava praticamente decidido, o Atlético vencia por 1 a 0, e os times já jogavam os acréscimos. Mas o Real ainda tinha um escanteio para cobrar. Modrić cruzou na direção da marca do pênalti e Sergio Ramos foi de encontro à bola com a cabeça. Courtois pulou e se esticou todo, mas não conseguiu alcançar. O Real deixava tudo igual, aos 48 do segundo tempo.

Sergio Ramos cabeceando para empatar o jogo nos acréscimos (Foto: imortaisdofutebol.com)

Não deu tempo para mais nada no segundo tempo, obrigando os times a jogarem a prorrogação. O Atlético, obviamente, estava com o psicológico afetado pelo gol sofrido nos últimos minutos, e o Real jogaria a última meia hora da final confiante. A questão mental, como sempre, foi um aspecto decisivo para a partida. Já no segundo tempo da etapa complementar, Di María realizou uma grande jogada individual, coroando uma ótima temporada, individualmente falando. Foi conduzindo pela esquerda, invadiu a área e chutou para a defesa de Courtois. No rebote, Bale cabeceou para desempatar a grande final. Aos 13, Marcelo entrou na área adversária com uma certa facilidade e finalizou para marcar o terceiro do Real. Já estava tudo decidido e os colchoneros não tinham mais forças para reagir. Ainda deu tempo de Cristiano Ronaldo ser derrubado por Juanfran dentro da área. O então melhor do mundo cobrou à esquerda de Courtois, que pulou para a direita, e marcou o quarto gol para os blancos. Com o resultado final de 4 a 1, em uma virada histórica, o Real se sagrou campeão pela décima vez na história da Champions League.

O craque português terminou como artilheiro da competição, com 17 gols (Foto: Shaun Botterlli)

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