Koeman fora! O que esperar da Holanda?

Com a confirmação do ex-jogador no Barcelona, a “laranja mecânica” esta na procura de um substituto à altura para a Euro de 2021.

Kaio Sauaia
Mezzala
7 min readAug 27, 2020

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(Foto: Getty Images)

Em 1974, a Copa do Mundo sediada na Alemanha Ocidental presenciou uma revolução dentro do esporte. A seleção holandesa, treinada por Rinus Michels, levava ao principal evento do futebol uma nova ideologia de jogo, o futebol total. O “carrossel holandês” era encantador, exigia dos jogadores da seleção de serem capazes de jogar em diversas posições dentro de campo, ampliando sua formação quando com bola e a compactando quando sem. Mesmo não ganhando aquela edição do mundial (perdendo para os donos da casa na finalíssima), Michels deixou um legado, não só pelo modelo de jogo, mas de como seus jogadores eram moldados. O técnico fez da figura que ficava na beira das quatro linhas em algo muito maior para os neerlandeses, quando tal não fosse apenas alguém que clamava por organização, apontando aonde tal jogador deveria se posicionar e dando broncas quando erravam, mas sim, um líder, no qual mostrava a importância de aprender e pensar o jogo.

Anos depois, em 2018, a mesma seleção holandesa não vinha bem das pernas, com essa figura de um líder fora das quatro linhas em falta. A “laranja mecânica” pouco demonstrou do futebol por qual ficou conhecida, tendo três treinadores na era “pós van Gaal”, com Guus Hiddink, Danny Blind e Dick Advocaat falhando no cargo, gerando quedas precoces em classificatórias para a Eurocopa de 2016 e para a Copa do Mundo de 2018. Nessa situação, a federação se viu na obrigação de contratar alguém para apagar o incêndio que ameaçava se alastrar nas terras de Amsterdã, com um nome que retomasse os princípios de liderança e trouxesse resultados rápidos. A bola da vez foi Ronald Koeman, ex-jogador da seleção e discípulo de Cruyff, que vinha de um período sabático, após boa passagem no Southampton e uma péssima no Everton.

O ex-zagueiro cumpriu com as expectativas, controlando os problemas e utilizando da jovem geração de jogadores para formar uma equipe competitiva, na qual chegou à final da Liga das Nações e que se classificou para a próxima Euro, que seria este ano, mas que devido a pandemia, foi adiada para 2021.

O problema é que o Barcelona passou por uma situação semelhante à da Holanda em 2018, com um clima de terra arrasada, vendo em Koeman uma potencial solução, pois além de salvar a própria Holanda, catalães e holandeses tiveram excelentes relações no passado, com Michels, Cruyff e Rijkaard sendo alguns dos grandes pensadores por trás do futebol dos anos de glória do time “culé”. Sem contar que Koeman conhece o clube e La Masía como poucos, ganhando um projeto e um salário nos quais a federação holandesa não pôde competir.

Agora sem Koeman, as especulações sobre a seleção na mídia local e internacional começam a repercutir, inclusive, por aqui.

Possíveis substitutos

(Foto: Kaio Sauaia/Mezzala)

A federação já confirmou que o auxiliar Dwight Lodeweges será o técnico interino, já que a Liga das Nações começa logo mais, em setembro. Com isso, há uma possibilidade de vermos do que Lodeweges é capaz, pois, por lá, ele já é um treinador que está não só na pauta da mídia, mas de seus chefes, devido ao conhecimento e a possibilidade de continuidade das quais os dirigentes tanto prezam. Se sua equipe mantiver o nível de jogo diante Itália e Polônia, é bem provável que a probabilidade de efetivação se torne real.

Mas o interino não é um favorito, nem um nome que remeta à seleção, diferente de, por exemplo, Erik ten Hag. O comandante do Ajax se tornou uma sombra para Koeman desde a gigante campanha de sua equipe na UEFA Champions League de 2018/2019, revelando diversos nomes que são titulares indiscutíveis no time laranja, como De Jong, De Ligt e Van de Beek e, com eles, jogando um futebol que recordava ao dos tempos de ouro de sua nação. Porém, além de ter ideias e estilos bem diferentes aos de Koeman, ten Hag descartou a chance de qualquer conversa, já que se considera muito bem no Ajax.

Outros dois candidatos influentes são Peter Bosz e Phillip Cocu, sendo que ambos também tem cargos vigentes e seus respectivos clubes. O técnico do Leverkusen já manifestou interesse em treinar a seleção de seu país e é um treinador de estilo mais parecido ao do ex-comandante da Holanda, priorizando uma defesa bem armada, tendo contra-ataques efetivos e movimentações intensas no setor ofensivo. Todavia, o dirigente da equipe e ex-treinador e jogador, Rudi Völler, comunicou que Bosz faz parte do projeto do Bayer, que o mesmo está bem por lá e não deve sair tão cedo.

Já o treinador do Derby County parece ser uma opção mais viável, até porque o clube inglês não deve fazer muita frente a confederação holandesa, por não ser tão forte financeiramente e por ter um candidato direto ao cargo de Cocu, Wayne Rooney, já que o jogador visa deixar de integrar o 11 inicial dos “Rams” e se tornar comandante ou membro da parte técnica.

Caso Cocu seja mais um cortado da lista, muito se especula de que quem já tenha conhecimento e sucesso com a camisa laranja chegue para comandar. Dentre vários nomes debatidos, surgiram possiblidades como tirar Louis van Gaal ou Frank Rijkaard da aposentadoria, pelo menos até um dos empregados estarem disponíveis. Mas não para por aí. Outras opções que pipocaram na mídia neerlandesa foram Frank De Boer, que é alguém que conhece a casa, partilha de visões muito parecidas às de Koeman e está disponível no mercado depois de trabalhos fracos, Ruud Gullit e Edgar Davids, os quais se manifestaram mostrando interesse pelo cargo, mas não agradaram boa parte da imprensa e nem da federação.

Fala-se também na possibilidade de um estrangeiro, como Jurgen Klinsmann e Arsene Wenger, mas, como no Brasil, há uma tradição entre os holandeses de ter no comando da seleção um compatriota, dificultando tal probabilidade.

Ainda influente

(Foto: Hugo Delgado/EFE/EPA)

Mesmo fora, Koeman ainda interferirá na sua ex-equipe. Isso porque, com os plenos poderes prometidos por Bartomeu (enquanto ainda é presidente) no Barcelona e com a eminente saída de Lionel Messi, é bem provável que vejamos uma reformulação com alguns holandeses na equipe catalã, ou chegando, ou ganhando ainda mais espaço, como é o caso de Frenkie De Jong, que, segundo o próprio Koeman, não vinha jogando na posição certa:

“Observei Frenkie em uma posição que pensei ‘Eu nunca o colocaria lá’. Se você investe em um jogador que custa tanto dinheiro, você tem que jogar ele na sua posição…

…Ele comigo vai jogar mais próximo da defesa.”

Sobre quem deve chegar, vazaram possíveis pedidos do holandês aos dirigentes da equipe “culé”, com nomes como Memphis Depay, Donny Van de Beek e Georginio Wijnaldum.

Sem Messi, o atacante do Lyon pode ser um possível suplente ao argentino. Obviamente, Memphis não tem o mesmo nível técnico do que o melhor argentino de todos os tempos, mas pode sim ser alguém que contribua em um setor que é uma incógnita para a próxima temporada. O que pode atrapalhar o holandês é a adaptação à um time mais estrelado, já que quando no Manchester United, Depay não teve o mesmo destaque que no Lyon, time no qual ele é a grande referência.

Donny vive uma situação diferente, já que os moldes e as escolas de Ajax e Barcelona são muito parecidos e que o setor do meio de campo dos catalães não tem nome nenhum garantido além de De Jong, seu parceiro de posição quando foram semifinalistas de Champions League na equipe de Amsterdã, vivendo assim uma situação confortável comparada à a atual, tendo só a evoluir com a transferência.

Por último, Wijanldum, que foi um dos protagonistas na remontada da “laranja mecânica” à elite da Europa. A questão é que talvez ele seja mais um suplente de Van de Beek do que uma primeira opção. Com Koeman, o meia se tornou um homem mais presente ao redor da área, característica que, apesar de tal já ter exercido com Klopp, Gini faz frequentemente por sua nação, assim oferecendo ainda mais opções ao seu comandante caso rume à Espanha.

Desta forma, podemos dizer que o que acontecer na Catalunha deve alterar profundamente certos fatores na Holanda. Ou os melhorando, tendo em vista que o projeto e os jogadores citados consigam progredir dentro dele, ou os piorando, se o trabalho de Koeman for um fracasso e seus patrícios decaírem tecnicamente junto a ele. Ou seja, os laços entre catalães e holandeses podem se manter fortemente conectados, ou podem se romper e dificilmente voltar.

Enfim, vale a torcida para que ambos os trabalhos deem certo, principalmente para quem é fã do bom trato à pelota e deseja que o culto à camisa laranja nos últimos 50 anos permaneça intacto, seja pelas lendárias gerações que às representaram, seja pelos ideais progressistas que às rodearam, seja pelo bem do futebol.

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