“Plata o Plomo” : Como Pablo Escobar e o “narcofútbol” mancharam a Copa Libertadores de 1989 do Atlético Nacional

João Pedro Ramalho
Mezzala
Published in
5 min readSep 21, 2020

Em uma década em que a Colômbia foi dominada pelo narcotráfico, o futebol nacional se impôs e conquistou a América pela primeira vez em sua história

Há quase trinta anos atrás, o Atlético Nacional de Medellín conquistava a primeira Copa Libertadores da história do futebol colombiano. Todavia, o ceticismo em torno da glória máxima dos verdolagas é compreensível. A influência do narcotráfico dentro da Colômbia nas décadas de 1980 e 1990, abrangia entre outras esferas, o esporte mais popular da América Latina.

O auge do futebol no país é correlacionado com esse período sangrento e multibilionário. Os clubes colombianos tornaram-se os mais temidos do continente a partir da década de 80, alcançando quatro finais de Libertadores no período. Com contratos milionários, os narcodirigentes negociavam com astros sul-americanos, e assim, a Liga Colombiana se tornou a competição mais poderosa da América. Esse êxito futebolístico também atingiu a Seleção Colombiana, que se classificou para a Copa do Mundo de 1990 após 28 anos de ausência.

Em Paisa, mesmo torcendo para o Independiente Medellín, Pablo Emilio Escobar financiou, ainda que indiretamente, a histórica equipe do Club Atlético Nacional de 1989. Escobar nunca exerceu nenhum cargo diretivo dentro da instituição. Ademais, também não foi um mecenas oficial do clube. A relação dos verdolagas com o narcotráfico iniciou-se ainda na gestão de Hernán Botero Moreno, presidente do Nacional na época. Botero seria o primeiro narcotraficante extraditado aos Estados Unidos. Contudo, anteriormente, facilitou a entrada do Cartel de Medellín nos negócios do Rei de Copas.

Elenco verdolaga campeão de forma inédita da Libertadores

O vínculo de Pablo Escobar com o futebol vai além dos inúmeros campos construídos por ele nas periferias de Antioquia. O maior traficante da história financiava premiações, e é suspeito de praticar o branqueamento de capital de forma direta através dos clubes que adentrava. A partir da aquiescência da Liga Colombiana, empresas privadas passaram a patrocinar legalmente equipes do futebol no país. Dessa forma, a lavagem de dinheiro do narcotráfico foi viabilizada. O dinheiro corrupto do Cartel que subsidiava os clubes por meio de organizações “laranjas”, saía limpo através da renda das partidas. Nesse sentido, o esporte foi uma das maneiras encontradas para esclarecer o fluxo de aproximadamente US$ 20 bilhões anuais do tráfico internacional de cocaína.

CAMPANHA DE 89

A rivalidade entre os cartéis de Medellín e Cáli ia além do controle do mercado narcótico. Dentro de campo, essa disputa também fez vítimas. No Campeonato Colombiano de 1989, dos seis postulantes ao título, quatro equipes eram bancadas por essas organizações. Já nas fases decisivas da competição, o clássico nacional entre Independiente Medellín e América de Cáli aflorou essa problemática. O árbitro da partida, Álvaro Ortega, foi assassinado por sicários do Cartel de Medellín dias após o jogo. Álvaro passou a conviver com ameaças frequentes por ter anulado um gol do DIM contra o time do cartel rival. Sua morte, a mais infame violência do narcofútbol, causou a suspensão do Colombiano de 1989.

Com a competição nacional encerrada, a Copa Libertadores da América tornou-se o alvo dos clubes colombianos. Escobar e seu cartel montaram um time histórico do Atlético Nacional para vencer “La Copa”. O time comandado por Francisco Pacho Maturana figurava os melhores jogadores do país. Entre eles, Leonel Álvares, René Huguita, Andrés Escobar, Fajardo e Trellez. Os verdolagas terminaram em segundo no Grupo 3, atrás do também colombiano Millonarios, e avançaram às oitavas para despachar o Racing (ARG) e posteriormente o próprio Millonarios nas quartas de finais.

Um dia antes da semifinal contra o Danúbio (ARG), homens do Cartel de Medellín invadiram o hotel em que os árbitros estavam instalados, e com sua metodologia de Plata o Plomo (dinheiro ou chumbo), Escobar os coagiu e tentou suborna-los. A partida terminou 6 a 0 para o Verde Paisa, com pouca, ou quase nenhuma interferência da arbitragem.

Na decisão da Libertadores de 1989, os verdolagas haviam perdido o primeiro jogo por 2 a 0 para o Olímpia (PAR), em terras paraguaias. A realização do jogo decisivo na capital Bogotá, e não em Medellín, alimentou ainda mais as provocações dos rivais, que dizem que a partida trocou de lugar para preservar os árbitros da influência de Pablo. A versão oficial, porém, é que o Atanasio Girardot não tinha capacidade suficiente (34 mil pessoas) para abrigar um jogo daquele porte. Na partida de volta, em território colombiano, o Nacional devolveu o placar e a final da competição foi decidida nos pênaltis. Nas disputas alternadas, Leonel Álvarez marcou e deu o título inédito à Colômbia e ao Atlético Nacional de Medellín.

NOVA GESTÃO

A nova relação profissional do clube iniciou-se primordialmente com a gestão do presidente Juan Carlos de La Cuesta, que dirigiu o Rei de Copas de 2010 até 2017. O Atlético sob seu comando conquistou onze títulos em apenas sete anos, incluindo o bi da Libertadores. Além disso, nenhum dos títulos envolve algum tipo de ceticismo ou questionamento em relação a favorecimentos. Cuesta é o melhor símbolo da gestão empresarial implantada no Nacional desde 1996, quando o clube foi vendido ao grupo Organización Ardila Lülle (OAL), do bilionário Carlos Ardila Lülle.

O fantasma do narcotráfico e sua influência dentro da história verdolaga será eterna. Todavia, a filosofia de aprender com o passado, entender o hoje e seguir para o futuro, fez o Club Atlético Nacional se tornar uma potência latina e referência de gestão futebolística.

Torcida do DIM provoca o Nacional em tema sobre a Libertadores de 1989

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