Rico não vai preso: a maior mancha da história do Santos Futebol Clube

Robinho ser contratado por uma equipe em meio a um caso tão grave é um desrespeito aos torcedores, às mulheres e a toda a sociedade

Danilo Jordão
Mezzala
6 min readOct 17, 2020

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(Foto: Reprodução)

São 108 anos de vida. Casa do maior jogador de todos os tempos. Títulos mundiais, continentais, nacionais, estaduais. Nunca caiu para a segunda divisão. Esse é o Santos que o torcedor se orgulha de cantar, chorar, festejar. Esse é o Santos que não desiste, que para guerra, que vence. Essa semana, o Santos perdeu. Mas não foi de pouco não, foi goleada. Se nunca havia caído, hoje se encontra no fundo do poço.

Mesmo com a notícia da suspensão do contrato, essa continua sendo a maior vergonha da história do alvinegro praiano. As notas oficiais ironizam a situação; afirmam que “estamos vivendo na era do cancelamento”. A desculpa de que não sabia dos detalhes do processo lançados ontem nas mídias de comunicação do Brasil.

O caso judicial era aberto, não viu quem não procurou. O Santos não suspendeu o contrato entendendo o erro grave que cometeu ao contratar esse atleta, o Santos suspendeu para não perder dinheiro.

O jogador Robson de Souza, mais conhecido como Robinho, foi anunciado como novo reforço do Santos no dia 10 de outubro. Essa seria a quarta passagem dele no clube, se as duas partes não sucumbissem à pressão dos torcedores, população e, principalmente, dos patrocinadores. Ao todo, o atacante participou de 253 partidas e marcou 111 gols, sendo considerado por muitos ídolo do Peixe. Revelado na Vila, Robinho é famoso pelos seus dribles, mais especificamente por suas pedaladas desconcertantes. Porém, agora o drible é outro, seu adversário também. Não se trata de um jogador, se trata da Justiça Italiana. Não se trata de pedaladas, se trata de um crime de estupro.

O jogador foi condenado a nove anos de prisão no fim de 2017, acusado de violentar sexualmente, junto com outros 5 amigos, uma mulher albanesa. De acordo com os detalhes do processo, uma conversa no carro do jogador foi determinante na decisão de condená-los. Em três trechos de diferentes momentos de uma ligação por telefone Robinho combina o que será dito às autoridades. O jogador também detalha, sem cautela, o que ocorreu naquela noite. Os trechos da conversa foram divulgados pelo GE, e estão públicos nos detalhes do processo do Tribunal de Milão.

AVISO: CONTÉM GATILHO

Falco: –Ela se lembra da situação. Ela sabe que todos transaram com ela.

Robinho: — O (NOME DE AMIGO 1) tenho certeza que gozou dentro dela.

Falco: — Não acredito. Naquele dia ela não conseguia fazer nada, nem mesmo ficar em pé, ela estava realmente fora de si.

Robinho: — Sim.

Outro momento importante da conversa mostra quem é o Robinho fora de campo:

– Estou rindo porque não estou nem aí, a mulher estava completamente bêbada, não sabe nem o que aconteceu.

Robinho completou:

– Olha, os caras estão na merda… Ainda bem que existe Deus, porque eu nem toquei aquela garota. Vi (NOME DE AMIGO 2), e os outros foderam ela, eles vão ter problemas, não eu… Lembro que os caras que pegaram ela foram (NOME DE AMIGO 1) e (NOME DE AMIGO 2)…. Eram cinco em cima dela.

Depois, combinando o que dizer no julgamento:

Robinho: –A polícia não pode dizer nada, eu direi que estava com você e depois fui para casa.

Jairo: — Mas você também transou com a mulher?

Robinho: — Não, eu tentei. (NOME DE AMIGO 1), (NOME DE AMIGO 2), (NOME DE AMIGO 3)…

Jairo: — Eu te vi quando colocava o pênis dentro da boca dela.

Robinho: — Isso não significa transar.

Para conseguir as informações, a Justiça Italiana grampeou telefones do atleta e gravou ligações. A condição da vítima, completamente embriagada, é evidenciada com ironia por Robinho, que admite o ato de colocar seu órgão sexual na boca da albanesa.

Quando o veredito condenou o atleta, ele estava atuando no Brasil, pelo Atlético Mineiro. Na época, o caso repercutiu pouco — protestos tímidos, por parte de núcleos femininos de torcedoras do Galo, foram realizados. Daniel Nepomuceno, presidente do clube no período, sequer se manifestou sobre o assunto. Os dirigentes afirmavam que se tratava de uma “questão pessoal do atleta”. O clube mineiro, dessa forma, não só despreza a gravidade do assunto como relativiza a violência contra a mulher.

Como o caso era de 2013, quando o atacante atuava pelo Milan, a imprensa não deu tanto valor. Os comunicadores e usuários de redes sociais movimentaram a situação essa semana. Grandes páginas exigiram a retratação dos patrocinadores, pedindo para as marcas ameaçarem rescisão de contratos com o Alvinegro Praiano. A Orthopride anunciou o término de relações com o Santos, enquanto a Kicaldo, a Kodillar e a Brahma confirmaram que fariam o mesmo se Robinho continuasse no clube. As empresas ocupavam pequenos espaços no uniforme alvinegro, ou seja, não eram patrocinadores de grande porte financeiro para o Santos. Porém, quando a Philco — uma das principais marcas — disse que sairia, o Santos anunciou a suspensão contratual do jogador. O dinheiro, mais uma vez, valeu mais que respeito e dignidade.

(Foto: Reprodução)

Esse não foi o primeiro caso polêmico do jogador. Quando atuava pelo Manchester City, em 2009, o atleta estava sendo investigado por uma suposta agressão sexual em uma boate noturna, em Leeds, na Inglaterra. À época, Robinho foi interrogado pela polícia local e ficou em liberdade sob fiança. O atacante, como esperado, negou a acusação. Poucos meses depois, a justiça local decidiu não dar continuidade ao processo, e Robinho ficou livre de julgamento.

O caso, agora, é diferente. Foi condenado em primeira instância, mas o julgamento pode ir até três instâncias. Dessa forma, o atleta não pode ser considerado culpado. Apenas depois dessas três fases, a sentença pode ser definitiva, com absolvição ou condenação. Os representantes do atacante já afirmaram que vão lutar até o fim, com o discurso de que a relação oral foi consensual.

Robinho se entregou nas ligações telefônicas? Sim. Mas rico não vai preso. Pelo menos não no Brasil.

Por mais que o jogador seja considerado culpado em todas as três instâncias, o processo, por se tratar de um crime cometido fora do país, teria mais brechas judiciais. Robinho só seria encarcerado com a abertura de um novo processo no Brasil, visto que a Constituição Brasileira não realiza a extradição de cidadãos nascidos no país. Entre milhares de recursos, o atleta seguirá vivendo sua vida luxuosa nas várias casas que ele possui. Essa é a “Justiça”.

O atacante nunca mais voltou à Itália. Ao longo do processo, Robson de Souza enviou seus advogados para Milão, mas não apareceu em nenhum dos julgamentos. Quando seu clube na época, Istambul Basaksehir, da Turquia, foi para o país europeu, Robinho não viajou e desfalcou a equipe, temendo ser preso no local.

Enquanto Robinho segue solto, Bruno joga bola e Jean defende as cores do Atlético Goianiense, a nossa sociedade continuará, assim como o Santos, no fundo do poço. Bruno foi condenado a 22 anos de prisão, em 2010, por ter participado do assassinato de sua ex-mulher Eliza Samúdio. Já Jean, também goleiro, foi acusado de agredir sua ex-namorada no início desse ano. Atuando pelo São Paulo, o clube rescindiu com o jogador, mas o Atlético entendia como um processo de inclusão a contratação do atleta. Esses clubes são os mesmos que se manifestaram contra a violência doméstica e violência contra a mulher.

Rico não vai preso. Rico joga futebol. Rico ganha dinheiro. Rico pode tudo.

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O que veio primeiro: o sorriso ou o mundo? Na felicidade tudo se cria.