Uma Olimpíada contra a vontade do povo

Mesmo tendo sido adiada para este ano, maior parte dos japoneses não querem que os Jogos Olímpicos de Tóquio sejam realizados

Luan Fontes
Mezzala
4 min readJul 23, 2021

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Fonte: Divulgação

É certo que o período pandêmico deu um tom inusitado a diversos eventos esportivos, justamente pelas condições nas quais são realizados desde o ano passado. As finais da NBA e da Champions League de 2020 sendo realizados em uma espécie de bolha exemplificam bem esse tipo de coisa, e é o que as Olimpíadas de Tóquio tem em comum com os dois eventos citados.

Mas mesmo com protocolos de segurança, ausência de público e todas as restrições possíveis devido ao ainda existente cenário da pandemia, a maior parte da população japonesa é contra a realização das Olimpíadas na capital japonesa, ou teme que o evento faça com que os casos de covid-19 aumentem no país.

Fonte: Divulgação

Segundo dados mais recentes da Kyodo News, uma das principais agência de notícias do país, 57% das pessoas querem que as Olimpíadas sejam canceladas e 87% teme que os Jogos Olímpicos causem um aumento considerável no número de casos de coronavírus no Japão.

Das pessoas consultadas pela agência, 25% respondeu que é favorável a realização dos eventos sem público e outros 12% defende que as Olimpíadas sejam disputadas com presença de público, porém com restrições. Em comparação a uma pesquisa anterior, o número de favoráveis subiu e o de contrários caiu.

Muito dessa postura contrária da população à realização das Olimpíadas se deve ao aumento de casos de covid-19 no país. O premiê japonês Yoshihide Suga declarou estado de emergência no Japão pouco mais de um mês antes da abertura oficial dos Jogos Olímpicos, no dia 23 de agosto, com o status ainda em vigor.

Não foi só a população que se mostrou receosa com a realização dos Jogos Olímpicos em Tóquio. A Agência da Casa Imperial confirmou que o imperador Naruhito também se mostrou extremamente preocupado com a possibilidade de um aumento de casos de covid-19, com as Olimpíadas, além de estar “visivelmente abalado” com o fato de a opinião pública ser contra a realização do megaevento. Mesmo assim, o monarca confirmou presença na cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos.

Mesmo com a repulsa da população, o Comitê Olímpico Internacional já deixou claro que não irá cancelar a realização das Olimpíadas na capital nipônica, ainda mais agora, com a abertura dos jogos já realizada e com todos os atletas no país

Protestos de japoneses contrários à realização das Olimpíadas no país Fonte: Divulgação/Julian Ryall

Outro problema é dentro da Vila dos Atletas, onde estão hospedados mais de 11.000 atletas de diversas nações. Até o momento da publicação dessa matéria, nove atletas já contraíram a covid-19, mesmo com toda a rigidez dos protocolos de segurança, incluindo vacinação total de todos os esportistas e provavelmente haverá mais casos de coronavírus durante as Olimpíadas.

Pode parecer louco, mas 10 anos depois de um tsunami que matou 19.000 pessoas, a Olimpíada que serviria muito para mostrar ao mundo um Japão reerguido após a tragédia, será realizada em meio a um grande desafio vivido pelo país no momento, com relação à crise da pandemia.

Além disso, o país passa por um momento de transição, visto que o ex-premiê Shinzu Abe renunciou ao cargo no último mês de setembro. Seu substituto, Suga, tem a missão de não só dar conclusão ao processo de organização das Olimpíadas, mas também de garantir que a economia japonesa se recupere da pandemia de pé, equiparando-se às demais potências. Vale lembrar que o PIB do Japão no ano passado caiu em 4%, o que fez com que o país se antecipasse na entrada em recessão.

A “soberania” é um ponto muito importante para entender a decisão de manutenção ou não dos Jogos, muito devido a uma disputa que os nipônicos têm com a China. Pequim foi sede das Olimpíadas de 2008 e sediará os Jogos Olímpicos de Inverno no ano que vem — a realização destes eventos tendem a passar uma imagem triunfal de uma China com alta tecnologia e infraestrutura.

Vale ainda lembrar que, em 2011, os chineses se tornaram a segunda maior economia do mundo, superando o Japão. Assim, dá para entender que os nipônicos não querem ficar atrás de seus rivais milenares. Esse tipo de postura é parte dos planos dos últimos governos, nos quais contariam com apoio dos EUA e da Europa.

Com um cenário turbulento gerado pela pandemia, é possível dizer que as Olimpíadas gerem aos japoneses um dilema entre fazer o que é melhor aos olhos do público ou o mais viável para organização e atletas. É mais importante a sensatez da preservação à saúde pública e o cuidado máximos, ou pensar na necessidade dos esportistas e do Japão, com o desejo de recuperar sua soberania? É uma indagação para a qual há muitas respostas, mas que não deixa de pairar a cabeça dos que vivem na Terra do Sol Nascente.

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Apenas um rapaz sul-americano que sonha em ser jornalista esportivo, quem sabe, narrador