ON THE ROCKS

Eros e Thanatos

Walter Hupsel
Microphonia
Published in
2 min readMar 31, 2020

--

A tentação de Santo Antonio (Hieronymus Bosch, 1495/1515).

A crise que estamos passando coloca em cheque nossas ideias e caminhos. Nesses momentos enfrentamos a zona cinzenta de verdade, e não mais como exercício intelectual. A crise nos testa, sobretudo nossos valores e crenças.

É, portanto e paradoxalmente, o momento ideal. Eu, por exemplo, me descobri menos humanista que achava que era e passei a desejar a morte de algumas pessoas. Sim, não é nada bonito o que eu estou sentindo, mas é um puro cálculo utilitário (que também recusava, kantianamente): se essa ou essa pessoa morrer, outras vidas serão salvas.

Não é metáfora dizer que a história é feita de sangue, mas saber disso não significa desejar a morte do outro. Sempre soube, nunca desejei. Nunca até agora. Hoje chego a sonhar com isso, a gritar a plenos pulmões, a imaginar uma cena lenta, tarkovskiana, de sacrificar alguém.

(Comecei esse texto pensando em escrever sobre as possibilidades abertas pela crise, de imaginação, erotização, de arte, de um futuro diferente… mas a mente fluiu para o exato oposto… prometo tratar no próximo)

Voltando, então.

A pulsão de morte só se combate com a pulsão da vida. Essa crise, seu gerenciamento, suas inações e declarações criminosas, me fez me enxergar diferentemente e fez surgir em mim desejos estranhos. Não os nego, estão aqui, pululando, esperando que se realize. Quero muito que se realize, melhor ainda se fosse pela gripezinha.

Desculpem, mas não sou humanista, sou apenas humano. Demasiadamente humano.

Walter Hupsel para o Microphonia.

--

--

Walter Hupsel
Microphonia

Cientista político, punk, anarco… uma caralhada de moléculas em choque constante. Aqui é barulho, dissonâncias e muito fuzz. Só JESUS (AND MARY CHAIN) SALVA!