BANDA DESENHADA

Navegando em Outros Mares

Uma resenha do EP Brisa Nórdica

André Lissonger
Microphonia
Published in
3 min readJul 3, 2021

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A Marlargo revela uma conjunção de afinidades sonoras e poéticas de singular identidade. Uma estética musical que foge do lugar comum.

Após o seu debut com o álbum “Ressonância” (2018), complementou suas investigações estilísticas com a produção de audiovisuais e o amadurecimento com a realização de shows.

Nesses tempos pandêmicos, o grupo entrou em estúdio e preparou um novo álbum. Com seis canções, o EP Brisa Nórdica é obra de uma banda que soa mais coesa e arrisca outras experimentações sonoras.

É perceptível que o DNA da Marlargo, envolvendo um mergulho profundo na poética das palavras e das texturas sonoras harmônicas, melódicas e rítmicas, ainda está presente no EP “Brisa Nórdica”. Todavia, a sua bússola já aponta novas direções. E o maior exemplo disso é a faixa título homônima, que abre o álbum.

Brisa Nórdica”, a composição, já mostra a guinada minimalista. É um novo rumo trilhado com leveza e apuro, como o alívio que vem após a árdua tarefa de tripulantes que necessitam excluir as águas que pareciam insistir em pôr à pique a embarcação. A tensão desacelerada, sincopada, dessa jornada, atinge o seu clímax de frescor acentuado pela ambiência latina do seu solo: é como o piso lisboeta, em pedras portuguesas, revisitado por Burle Marx nos calçadões da sua Copacabana. Essa brisa é uma das músicas que traduzem novas coordenadas. Já nasceu clássica.

A linda melancolia de “Nada Errado Aqui” retoma o encontro das texturas harmônicas das águas existencialistas do pós-punk com as influências melódicas do Clube da Esquina, temas muito caros ao grupo. Caminho este também minimalista, sutil, delicado.

A terceira faixa, “Palavras ao Vento”, se articula com as ambiências etéreas, sincopadas e psicodélicas da Marlargo do seu álbum primogênito. São ressonâncias da “Ressonância”. Ainda assim, apesar da complexidade aparente daqueles elementos, a canção é lapidada como uma bela balada pop.

Já “Lívia”, é uma pérola cultivada por longo tempo. Aberta a preciosa concha justamente neste álbum, esta composição nos agracia com uma alta dose da paixão da banda pela aclamada MPB mineira, alimentada por sucessivas marés diaspóricas de jazz. Uma música sobre um ser humano… onde só o amor consegue, ao menos, esboçar uma leve e carinhosa tradução.

A quinta faixa, “Coma”, segue como uma espécie de trilha marcial em síncopes rítmicas levemente regadas a breves elementos do cool jazz. As pausas reforçam a aparência de várias vinhetas existencialistas que parecem ter sido coladas.

O EP encerra com “Me Esqueça”, uma balada rock que contém e fecha o ciclo visceral, existencialista e poético de todo o percurso realizado até então.

Enfim, a Marlargo está de volta. É a mesma nau e são os mesmos tripulantes, agora com o auxílio luxuoso de mais um marítimo. Além das velhas, novas técnicas de navegação, mas, sobretudo, são outros, além dos antigos, os mares singrados.

Aproveite que eles aportaram neste EP… e embarque!

Sejam bem vindos e ouçam! Ou melhor, viajem novamente com eles.

André Lissonger para o Microphonia.

Ouça aqui:

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André Lissonger
Microphonia

Microphonia editor and reporter . Architecture . Urban planning Professor . Rock music . Urban sketchers . Art