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Por Quem Os Sinos Dobram

Reverendo T aka Tony Lopes
Microphonia
Published in
3 min readNov 21, 2020

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A música chegou cedo em minha vida. No início peguei carona nos discos que meu irmão mais velho ouvia. Início dos anos 70. Por volta dos 10 anos de idade, ainda em Gandu. A cidade que nasci.
Logo no início, lembro, gostei de Suzi Quatro (paixão total) e do Kiss.
O espectro era eclético. MPB, rock e outras variáveis. Tudo pelo filtro do meu irmão, André.
Quando vim morar em Salvador, com 14 anos, para estudar, descobri o rádio, que até então era usado apenas para ouvir futebol, e as suas múltiplas possibilidades e variedades musicais. Mergulhei…
Aí a música começou a mexer comigo e eu fui me apaixonando e tendo cada vez mais a sua companhia em dias solitários.
Naquela época não existia um monopólio de um determinado ritmo. Tudo era bem misturado e atirava em várias e boas opções.
Com uns 20 anos, já era um voraz colecionador de discos de vinil. Comprava tudo que minha grana podia alcançar. E não media esforços para usar cada vez mais a minha droga predileta: discos.
Curiosamente, quando passei no vestibular de Museologia na UFBA, algumas pessoas incrédulas indagavam pelo meu gosto repentino por música. Kkkk. Um trocadalho do carilho.
Logo depois disso, quem sabe até por isso, resolvi tentar ser músico. A essa altura já escrevia poemas ou letras de músicas e até já tinha participado de alguns festivais estudantis. E também já havia entrado em uma banda como back vocals, que nunca fiz. O nome dela era Dúvida Externa. Já com letras minhas no repertório.
Finalmente, com 20 anos, resolvi definitivamente tentar tocar algum instrumento musical.
Por preguiça mental e pouco conhecimento optei por me meter a tocar bateria. Coisa que faço, mesmo sem ter aprendido, até os dias atuais. E que gosto muito apesar de ser o baixo o meu instrumento preferido.
A primeira dificuldade foi comprar a danada. Início dos anos 80. Era cara. Na época os estúdios de ensaio mal existiam, se existiam. E as novas eram inatingíveis.
Aí o destino conspirou ao meu favor. Meus pais, que agora estavam morando comigo, resolveram passar um período viajando.
Por isso deixaram uma grana extra para que, eu e André, pudéssemos usar com as despesas de alimentação e manutenção do apartamento no período.

Pronto, tinha a grana, e logo fui a caça da bateria. André, quem o conheceu sabe, topava qualquer loucura e ficar sem comida certa por um mês não lhe parecia uma má ideia. E, claro, apoiou a aposta.
Procurando nos anúncios classificados dos jornais encontrei uma bateria Pinguim por um preço a altura das minhas pequenas e usurpadas economias.
Não tive dúvidas e me mandei para a Barra, eu morava em Brotas, em busca do sonho.
Chegando lá, vi que a bateria estava bem castigada mas é o que dava pra comprar. Levei naquela hora mesmo.
Alguns dias depois tive a minha primeira e única aula de bateria. Aprendi a segurar as baquetas, do jeito certo (não como a pegada de jazz) e que devia usar a mão esquerda para bater na caixa alternando com uma ou duas batidas com o pé direito no bumbo. A mão direita tocaria em sequência no chimbal e o pé esquerdo faria o trabalho na máquina de chimbau.
Pronto, vocês ganharam também a primeira aula, se quiserem, já podem também se arriscar no batuque.
Agora sim, eu estava finalmente preparado para conquistar o mundo do rock. E aí já é uma outra longa e infrutífera história que muitos de vocês até conhecem.
A nota triste é que ela ficou pouco tempo comigo…
Alguns meses depois comprei uma nova bateria. Uma Gope azul novinha.
Essa sim, me custou muito cara. Usei, para comprá-la, o dinheiro do seguro de vida do meu irmão.
O pacto de nunca deixar de tentar ser um baterista foi feito com sangue.
Mas nunca fiquei muito tempo sem tocar, até parei por alguns anos mas logo retornei na esperança de incentivar os meus filhos a tocarem um instrumento.
Espero algum dia, realmente, aprender a dominar essa grande amiga. E assim
recompensar essa parceira de bons e maus momentos. De boas e más lembranças. De muitos rocks para plateias quase inexistentes.
Enfim, de uma vida, quase, normal.

Reverendo T para o Microphonia.

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Reverendo T aka Tony Lopes
Microphonia

escrevo blasfêmias , orações e letras de músicas que poucos irão ouvir.