ENTRE CORDAS E POESIA

Quando o mar deveria não mandar ondas.

Junior Vaz
Microphonia
Published in
2 min readMar 23, 2020

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Foto: Érico Amaral

Hoje tirei uns acordes estranhos da guitarra. Pareceu-me que ela não tinha dormido bem ou tinha sofrido um precoce ataque de pânico pela recém imposta quarentena. Também com tão pouca coisa a fazer…

O certo é que os devaneios sonoros da Hurricane — nomezinho ordinário para um modelo strato — trouxeram-me um lampejo harmônico onde o Fá se fazia dominante, talvez dizendo: “faça você mesmo!”

Paralisei! Pra quem não sabe, sou um crítico feroz do “do it yourself” — acho que por incapacidade de compreender tamanha riqueza musical — que produziu uma safra de músicos entediantes e textos horrendos. Podem jogar pedras…
O barato de jogar pedra no telhado musical alheio é a certeza de que pelo menos uma telha (ou corda) se quebra, mas depois podemos gritar um ruidoso: FODA-SE!

Voltando ao Fá e não ao “faça você mesmo”, percebi de cara que aquele sketch não ia adiante, já que essa nota sempre me soa sombria. Lembro-me da adolescência tentando copiar, na guitarra, a introdução de “Last Night I Dreamt That Somebody Loved Me”, que com suas notas maiores com quartas e sextas, era um misto de tensão e prazer. Abandonei a bichinha, saquei o bloco de notas e deu na seguinte poesia, já musicada pelo mestre André Lissonger:

“NADA A ESPERAR

Pés em desacordo
Unhas amálgamas
Dorso esguio suplicante

E eu dizia
Só pare quando ver o mar

Sinapses aleatórias
Suspiro leve sem sono
Sons ecos lirismo

E eu dizia
Só pare quando ver o mar

Provérbios repetidos
Argumentos distraídos
Bem que esqueci
Esperto olhar lince
Vejo sinto carne força

E eu dizia
Só pare quando não se encontrar”

Só sei que já disse numa outra canção: “Dedos sutis embalavam devaneios felizes”.

Junior Vaz para o Microphonia.

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