ENTRE CORDAS E POESIA
Quando o mar deveria não mandar ondas.
Hoje tirei uns acordes estranhos da guitarra. Pareceu-me que ela não tinha dormido bem ou tinha sofrido um precoce ataque de pânico pela recém imposta quarentena. Também com tão pouca coisa a fazer…
O certo é que os devaneios sonoros da Hurricane — nomezinho ordinário para um modelo strato — trouxeram-me um lampejo harmônico onde o Fá se fazia dominante, talvez dizendo: “faça você mesmo!”
Paralisei! Pra quem não sabe, sou um crítico feroz do “do it yourself” — acho que por incapacidade de compreender tamanha riqueza musical — que produziu uma safra de músicos entediantes e textos horrendos. Podem jogar pedras…
O barato de jogar pedra no telhado musical alheio é a certeza de que pelo menos uma telha (ou corda) se quebra, mas depois podemos gritar um ruidoso: FODA-SE!
Voltando ao Fá e não ao “faça você mesmo”, percebi de cara que aquele sketch não ia adiante, já que essa nota sempre me soa sombria. Lembro-me da adolescência tentando copiar, na guitarra, a introdução de “Last Night I Dreamt That Somebody Loved Me”, que com suas notas maiores com quartas e sextas, era um misto de tensão e prazer. Abandonei a bichinha, saquei o bloco de notas e deu na seguinte poesia, já musicada pelo mestre André Lissonger:
“NADA A ESPERAR
Pés em desacordo
Unhas amálgamas
Dorso esguio suplicanteE eu dizia
Só pare quando ver o marSinapses aleatórias
Suspiro leve sem sono
Sons ecos lirismoE eu dizia
Só pare quando ver o marProvérbios repetidos
Argumentos distraídos
Bem que esqueci
Esperto olhar lince
Vejo sinto carne forçaE eu dizia
Só pare quando não se encontrar”
Só sei que já disse numa outra canção: “Dedos sutis embalavam devaneios felizes”.
Junior Vaz para o Microphonia.