Tudo sobre a Ilha do Sal

Cabo Verde

Miliuma
miliuma
10 min readMay 30, 2019

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O transfer lá estava à minha espera, do operador Sol Trópico. Um rapaz preenche com voz projectada os vinte minutos de camioneta que separam o aeroporto do hotel, naqueles paleios de animador turístico que me recordam porque não gosto de excursões. Passados esses vinte minutos há a deliciosa garantia que só se volta a ouvir a conversa no transfer de regresso.

Dica nº 1 — Se voltar a voar no voo da noite da TAP, não apanharei um transfer de regresso, mas sim um táxi partilhado. O transfer vai para o aeroporto com uma antecedência de horas absolutamente desnecessária e trata-se de um espaço sem nada para fazer.

O primeiro impacto do Hotel é o pessoal que lá trabalha. Não podia ser mais simpático, digo. Toda a gente tem um sorriso e um bom dia para oferecer. Fui para um Bungalow Superior pela simpatia de uma amiga de um amigo de Portugal, que me fez upgrade do quarto. E fiz check-out tardio pela mesma simpatia de amigos. Quem puder ajudar, na ilha, ajuda a troco de nada e isso não pode passar sem ser mencionado. Obrigada!

O Oásis Belorizonte está em remodelação e expansão e acredito que no futuro seja mais agradável, mas não poderia recomendá-lo. A falta de qualidade na alimentação e bebidas é escandalosa. Quando compro um regime de tudo incluído, faço-o por valer a pena a inclusão das refeições todas. Acabei por visitar muitos restaurantes (boas experiências) para fugir ao restaurante principal que era francamente pior que o refeitório da faculdade. Contudo, é dos hotéis mais bem situados na Ilha, a poucos metros do centro de Santa Maria, onde toda a animação se concentra. Por falar em animação, contem com uma programação de hotel simpática, em que não há qualquer pressão para entrar em actividades que não são do gosto de todos (eu, pelo menos, não sou fã de animações de resorts). Elas existem, nos espaços que lhes são atribuídos e só os hóspedes que querem é que participam. Thumbs up! Assim, se voltaria ao Belorizonte? Sem dúvida. Mas com regime de Pequeno-Almoço apenas, deixando o resto do orçamento para comer noutros lugares.

Segundo parece, come-se melhor no Riu Funaná e ainda no Oasis Salinas, mesmo ao lado do Belorizonte. Há resorts melhores, como o Meliá Dunas, mas que se localizam bastante longe da cidade e com praia não tão boa. Para isso alugava uma casinha em Tróia. Prefiro, de longe, caminhar para o pontão, ver os peixes a chegarem das pescas matinais, as negociações entre locais, os instrumentos nas mãos dos idosos que cantam a morna, as crianças a saltitarem à porta da escola e a lagosta a ser grelhada nas mãos de uma cabo-verdiana bonita como só elas. Eu e os meus milium neurónios curiosos.

Dica nº2 — Reservar um hotel em regime de Meia Pensão e ir com os nomes apontados dos restaurantes para jantar. Morabeza e Salinas são óptimas opções.

Apesar da distância do Oásis Belorizonte ao centro de Santa Maria e respectivo pitoresco pontão ser bastante reduzida (15 minutos a pé), à noite vem o cansaço, a preguiça ou até o receio de voltar por ruas nem sempre iluminadas. Um táxi do centro ao Belorizonte ou ao Salinas são apenas 200 escudos cabo-verdianos (ou arredondados 2€). Dica nº3 — perguntar antes de entrar no táxi quanto é, para não apanhar surpresas. Para este trajecto são sempre 200 escudos, não há taxímetro nem há que enganar (desde os resorts Riu já se cobram 3€, segundo me disseram).

Lá para 2013, a SIC produziu uma série chamada Sal, gravada maioritariamente em Cabo Verde. Nessa série, como actor, participou um tipo que é hoje dos meus melhores amigos. Na série Sal, esse meu amigo interpretou a personagem “Emídio”, um homem que arranjava tudo o que era necessário a quem chegasse ao Sal, uma espécie de facilitador, um português simpático, dos que conhece toda a gente e o que é de melhor na ilha.

Há umas semanas, jantámos num restaurante com espectáculo de Burlesco na rua do poço dos negros, onde lhe disse que finalmente tinha escolhido o destino das minhas férias e que me tinha decidido pela ilha do Sal. Ele disse, fala com o Emídio, ele ajuda-te em tudo. Ri-me, claro. Sim, levas a tua personagem e ele que trate de mim. Não, Helena, há mesmo um Emídio, a minha personagem é real — disse o JC. Não queria acreditar, a viagem estava a ser deliciosa ainda antes de começar.

No dia seguinte a chegar à ilha, contactei o Emídio, o verdadeiro. Disse que era amiga do actor que fez de Emídio, o falso. Num piscar de olhos estávamos a tomar um café matinal numa esplanada sobre o mar e noutro piscar de olhos se passou o dia, na companhia dele, mais tarde da companheira e de mais amigos que se foram juntando. Eu e um mar de portugueses simpáticos que residem na Ilha do Sal e que me mostraram onde comer, onde beber um copo e nos acompanharam na comida e na bebida. Uma maravilha a descoberta, não tem outro nome. Depois disto, considero que devia haver um Emídio em cada país que se visita pela primeira vez.

Dica nº 4 — assim que chegarem ao Sal, dirijam-se ao pontão e perguntem pelo Emídio Simões. O seu submarino turístico é uma forma de ver peixinhos e o cristo dos mares (está tudo na série da SIC!) e se forem pessoas incríveis como ele, trazem convosco um amigo.

Dei uma volta de umas horas no barco de pesca do Emídio. Trouxe dois peixinhos de aproximadamente trinta centímetros. Vegans, matem-me, eu sei. E agora que falámos dos peixinhos, vamos lá à comida.

Onde comer em Santa Maria, na Ilha do Sal? Eu digo-vos. Mas digo-vos antes: se tinham a ideia romântica que iam para lá comer peixe, lagosta e gambas até cair para o lado por preços simbólicos, desenganem-se. As refeições são caras e as doses extremamente pequenas para uma pessoa. Na minha primeira noite fui ao Odjo D’Água, que é lindo para caramba, mas de um sugestivo “bacanal de peixe” (nome do prato, não tenho culpa), surgiu-me um prato branco de porcelana com três postinhas singelas sem acompanhamento. Acabei o jantar a pagar 75 euros e a correr para o terrível buffet do hotel para comer frango e batatas fritas. Se vale a pena ir ao Odjo D’Água ver as vistas? Sim!! Mas para jantar, levem uma carteira recheada.

Dica nº 5 — Restaurantes Barracuda, Pubim, Americo’s e Caranguejo.

As vezes que forem precisas. Se eu voltar ao Sal, fico-me por estes. E talvez pelo Rei do Marisco, que no dia que lhe havia designado a visita, estava fechado.

O Barracuda é o meu favorito. Se assistirem à série, reconhecerão a gerente do restaurante. Come-se estupidamente bem e por preços mais que justos.

No Pubim, as doses são pequenas mas com entrada e sobremesa já fica toda a gente satisfeita. Aqui, sim, comi aquele arroz de marisco que tem mais marisco que arroz. Com umas gotinhas de picante cabo-verdiano e o céu desce à terra. Ao jantar no Pubim, vivi a bonita experiência de jantar na esplanada singela de uma rua típica e transversal à principal, sem grande turismo nem adornos, ao som da morna de um músico talentoso e das crianças que brincavam por ali. E, claro, sem tirar o mérito ao arroz de marisco com as tais gotinhas de picante, sem ele não havia quadro idílico para contar.

No Americo’s comi um belíssimo polvo grelhado e aconselho. Os preços não são os mais simpáticos, mas não são tão inflacionados como em outros restaurantes e come-se realmente bem.

Por fim, o Caranguejo, onde o Tataki de Atum me conquistou. É um restaurante português de um português, mas é cool, com bons preços e para além da comida portuguesa tem o tal Tataki e ainda uma carta de pizzas que nos aguçou a curiosidade. Ah! E tem francesinha, amigos conterrâneos, não vá a saudade incomodar.

Dica nº 6 — Ir ao Relax comer Cachupa lá pras 10h30, 11 da manhã. Imaginem que é um Brunch, pronto. Sobre a cachupa, ao que parece, esta não é assim tão simples de preparar. Há a rica e há a pobre, a rica com diversas carnes e a pobre com peixe, devido à abundância de peixe na ilha. Convenhamos que é tudo relativo, porque em Portugal uma Cachupa com um bom peixinho pode sair muito mais cara. Ainda assim, deixo-vos um link para uma receita que me pareceu muito boa e semelhante à que nos descreveram na Ilha do Sal:

Comi Cachupa pelo almoço, em Espargos, na capital da ilha do Sal. Estava a fazer uma volta à ilha, que é o passeio mais interessante e o momento turístico mais recomendado para as férias. A volta à ilha pode ser adquirida através dos packs dos operadores turísticos ou então junto às praias, em banquinhas que vendem viagens de moto-quatro, alugueres de mota de água e etcéteras de entretenimentos. Nenhuma das opções me pareceu barata e depois de falar com muita gente, pareceu-me que a volta à ilha era o mais giro de tudo (afinal, já tinha ido pescar no barco do Emídio). E foi. E quando voltar ao Sal, volto a fazê-la.

Por uns singelos 25€ por pessoa dá-se uma volta inteira, passando por todos os pontos interessantes a visitar. Desde a vila piscatória Palmeira, pelo deserto, atravessa-se a ilha quase deserta de trinta quilómetros de comprimento, passando pela capital Espargos. Sentada na caixa aberta de uma pick-up almofadada, observei tudo de muito perto, senti o vento quente, a terra, passei pelos bairros de lata, por literalmente quase todo o território. O Olho Azul. A Buracona (na foto). Termina-se a viagem no ponto mais turístico, privatizado e vendido a um italiano: as Salinas de Pedra Lume. Tinha pensado em colocar aqui uma foto a boiar, mas nunca será ilustrativa daquela sensação única. Situadas na cratera de um vulcão (discutivelmente) inactivo, a água quente e de altíssima concentração salina diz causar a sensação de mergulhar no Mar Morte. Confesso, é uma mesmo sensação incrível! Menos quando entra uma pinguinha de água nos olhos. Aí, já dava para toda uma outra aventura contada.

Dica nº 7 — Façam a volta à ilha com o Dany Lopes. É o mais respeitado pelos locais, pelos portugueses que conheci e pelos próprios agentes dos operadores turísticos. Ele tem uma banquinha na praia, em frente ao Oásis Belorizonte, mas pode pedir-se o contacto dele em qualquer recepção de hotel.

Nessa viagem, aproveitem por passar numa loja realmente típica (o Dany saberá dizer-vos onde as há) e tragam Grogue e Ponche de Santo Antão. Vão perceber que é, possivelmente, o único recuerdo material a trazer de lá. O resto são memórias, das de qualidade.

Por fim e antes de voltarem ao nosso velho continente, há todo um mundo nocturno na ilha do Sal a visitar. A discoteca mais conhecida pelos turistas sempre foi a “Pirata”. Contudo, foi vendida a um chinês e dizem que já perdeu mais de metade do charme. Pelas ruas do centro de Santa Maria encontram-se a partir da hora do jantar muitos lugares luminosos (alerta aliteração) que se podem visitar. Por ordem de preferência, aqui vai a minha última:

Dica nº 8 — Se é para sair à noite, os nomes Buddy, Calemba, Ocean e Blu são os nomes a memorizar.

Com o nome Buddy, achei que ia para um sítio cheio de ingleses alcoolizados, coisa que também no Sal se vê com frequência. É, todavia, o bar menos turístico que visitei em Santa Maria. Uma maravilha cabo-verdiana e, quando lá voltar, será nosso por muitas noites. Música ao vivo, da óptima, gente simpática local e bonita. Não é preciso mais nada!

Em sete dias, houve um universo que me distanciou do quotidiano a apenas quatro horas de distância de casa. Foi quase como passar um portal para um mundo mágico, de paz e harmonia, foi como descobrir um truque novo, não há como não voltar.

Espero que quem tiver vontade de saber mais me contacte, para que eu tenha uma desculpa para falar sobre a viagem. Um grande bem-haja, fellow companions.

TRÈS IMPORTANT:

  • O vírus Zika já chegou a Cabo Verde. É importante cobrir todas as áreas expostas com repelente. Aconselho o Moustidose ou o Pré-Butix. Este vírus também se transmite por relações sexuais, portanto, por mais esta razão: protejam-se!
  • Não se pode beber água canalizada, só de garrafa. Aconselho a terem uma ou duas garrafas de litro e meio na casa de banho para lavar os dentes e, em nenhuma circunstância, a consumir bebidas com gelo.
  • Cabo Verde situa-se entre o Trópico de Câncer e a linha do Equador, pelo que as insolações são muito mais fáceis de ocorrer do que em Portugal. Muito protector! Usei o 50 da ISDN e mesmo assim fiquei queimadinha na cara. Não deixem de usar por causa do bronze, mesmo quando está nublado, não há como voltar com o mesmo tom de lula que temos por terras lusitanas.
  • Há registos de roubos de bens em quartos de hotéis. Guardem os vossos bens.
  • Peçam o visto ainda em Portugal. A fila à chegada ao Sal para pedir visto de entrada no país é quase infinita e muito demorada.
  • Números de telefone úteis: Polícia: 132; Bombeiros: 131; Emergências médicas: 130.

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Helena Canhoto — Performer — Aspiring Writer