No alicate das horas
há uma angústia espessa
pintando as paredes de uma
baforada ébria
que anuncia o campo de concentração
em um suspense infinito
somos milhões a aspirar o gás
dos facínoras
trabalhando feito porcos no chiqueiro refrigerado
rumo ao abatedouro
jogamos farelos ao rei de cristal
adoramos um deus falso que nos trai
a todo momento
enquanto jabuticabas brotam dos pés
recortamos simulacros do fascismo
retirados de cadernos de palavras cruzadas
que se anunciam com doses de humor
em preto e branco
vomitamos balas de fuzil
com fios de cobre enfiados no ânus
jurando de morte
a sutileza final
respiramos o pó dos cadáveres mutilados
que nos esperam
no espelho do alçapão
quando tudo for treva e ruína
e o grito ecoar miúdo
calado
na neblina dos dias
gozaremos do prestígio dos profetas do acontecido
dos óbvios empilhados em páginas de jornal
dos rostos desfigurados de robôs
e transeuntes atrevidos
tropeçando no alicate das horas
ruminaremos o desgosto da complacência
da baba triunfante dos mentirosos
a nos torcer o pescoço frágil da democracia
desmembrada em ralés de glória