Introduzindo a Comunicação não-violenta em times ágeis

Fábio Brasil
Mindset Ágil

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Olá pessoal! Esse é meu primeiro artigo para o Medium da Mindset Ágil — Consultoria e Treinamentos.

Vivemos em um mundo violento, cheio de preconceitos, conflitos e mal-entendidos. Conseguir escutar o que de fato está sendo dito pelo outro ou expressar o que queremos dizer, costuma ser uma tarefa difícil.

Muitos conflitos do dia a dia poderiam ser amenizados ou até mesmo evitados apenas com palavras.

Meu objetivo neste post é compartilhar algumas formas que um Scrum Master pode introduzir a comunicação não-violenta em times ágeis.

O que é e de onde veio a Comunicação não-violenta (CNV)?

A CNV, também conhecida como a linguagem da vida, é um processo poderoso que fortalece a capacidade das pessoas de se conectarem compassivamente consigo mesmas e com as outras. Vem sendo amplamente utilizada mundialmente para evitar e resolver conflitos de forma pacífica e construir relações mais positivas.

Marshall Bertram Rosenberg, psicólogo americano, cresceu em um bairro turbulento de Detroit e tomou conhecimento da violência e preconceito ainda muito jovem. Com um desejo forte de compreender o que contribuía para que as pessoas fossem violentas e cruéis umas com as outras, ele desenvolveu o processo da CNV no início dos anos 60, mesma época em que obteve seu PhD em Psicologia Clínica pela Universidade de Wisconsin — Madison.

Livro Comunicação não-violenta: técnicas para aprimorar relacionamentos pessoais e profissionais
Livro Comunicação não-violenta: técnicas para aprimorar relacionamentos pessoais e profissionais.

Marshall Rosenberg explicou em seu livro “Comunicação não-violenta — Técnicas para aprimorar relacionamentos pessoais e profissionais” que a nossa natureza gosta de dar e receber de forma compassiva e propõe utilizarmos a CNV para nos expressarmos honestamente e receber empatia por meio de 4 componentes:

  1. Observação
    As ações concretas que estamos observando e que afetam o nosso bem-estar;
  2. Sentimentos
    Como nos sentimos em relação ao que estamos observando;
  3. Necessidades
    As necessidades humanas, valores, desejos que estão gerando nossos sentimentos;
  4. Pedidos
    As ações concretas que pedimos, da forma mais clara possível, para enriquecer nossa vida.

CNV é sobre ser bonzinho?

O termo não-violência é oriundo de AHIMSA na língua sânscrita, e poderia ser traduzido como “poder desencadeado quando a vontade de ferir o outro é superada”.
A Comunicação não-violenta é mais um estado de consciência do que uma forma correta de falar.
Ao ouvir “não-violenta” algumas pessoas podem equivocadamente relacionar o termo a ser bonzinho ou omisso.
Muito pelo contrário, a CNV é sobre desenvolver conexão com o outro mais do que ter razão. É sobre observar sem adicionar julgamento de valor, ter coragem de entender e expressar necessidades e sentimentos e fazer pedidos claros.

“Entre o certo e o errado existe um campo. É lá que quero me encontrar com você”
Rumi (poeta persa do século VIII)

Mas como começar a falar sobre o assunto com o meu time?

#1 Comece por você

Um dia comum de um Scrum Master, é repleto de diálogos, atividades e interações. Silenciar o turbilhão da mente e escutar atentamente o outro pode ser uma tarefa difícil, muitas vezes.
Cuidar da saúde mental, meditar, ler sobre ou participar de um workshop de CNV, podem te ajudar a começar a desenvolver esse estado de consciência e a entender suas próprias necessidades e sentimentos. A empatia e a comunicação não-violenta começam em você!

#2 Pratique a escuta ativa

Esteja presente e atento à pessoa que está falando. Foque na outra pessoa, no que ela sente e precisa. Muitas vezes a forma como nos comportamos durante uma escuta impedem a geração de conexão com o outro, para ouvir genuinamente tente evitar:

Aconselhar/oferecer soluções não solicitadas
“Acho que você deveria fazer isso ou aquilo”

Interpretar/analisar o outro
“Acho que você tem traumas do passado, deve ser algo que vem da relação com seus pais”

Consolar/diminuir o problema
“Não fica assim, vai passar!” ou “isso não é nada!”

Trazer o foco para você, contando uma história própria ou competindo pelo sofrimento
“Uma vez, aconteceu algo muito pior comigo!”

#3 Use a retro

Retrospectivas são um bom momento para se discutir sobre como melhorar a comunicação, não é mesmo?

Fale sobre sentimentos
Se o momento do time permitir, utilize dinâmicas de retrospectivas que falem de sentimentos, por exemplo as conhecidas “Sentimentos e caminhos” e “Caixa de sentimentos”.
Usando a criatividade, você também pode adaptar a dinâmica Candy Love:

  1. Coloque um pacote de M&Ms, Skittles ou outro doce colorido em um pote
  2. Peça a um participante que escolha um doce do pote e depois compartilhe em que momento do sprint esse sentimento esteve presente, de acordo com a cor do doce:

Vermelho: Preocupado
Amarelo: Energizado
Verde: Motivado
Roxo: Incomodado
Azul: Distraído
Laranja: Outro sentimento

3. Repita o passo 2 até que todos participantes tenham a oportunidade de falar.

Baralho GROK
Você também pode utilizar o GROK, que é um jogo de cartas de sentimentos e necessidades baseado na comunicação não-violenta (CNV) e vem com um manual com diversas formas de jogar sozinho e em grupo.

Uma dose de escuta ativa

Como um icebreaker, você pode exercitar a escuta ativa em grupo. Essa atividade desperta nos participantes o senso de que não estamos acostumados a ouvir outro sem interromper ou pensar em uma resposta, enquanto deveríamos estar ouvindo atentamente.

Para rodar a dinâmica:

1. Divida o time em duplas
2. Coloque um timebox de 2 minutos.
3. Peça para um membro da dupla contar para o outro “Como foi o seu dia de trabalho ontem?”
4. Explique que quem estiver como ouvinte, não pode falar, somente ouvir atentamente o que o outro diz.
5. Quando o timebox acabar, coloque mais 2 minutos e peça para que o locutor pergunte ao ouvinte “O que você me ouviu dizer?”
6. Naturalmente, o ouvinte vai adicionar detalhes ou mudar completamente a história e boas risadas devem surgir.
7. Inverta ouvintes e locutores e rode a atividade novamente.
8. Quando terminar, peça para uma ou duas duplas contarem como foi a experiência.

#4 Faça palpites empáticos

Com a intenção de nos conectarmos e estimular o time a falar sobre necessidades e sentimentos, podemos fazer palpites empáticos.

Ao ouvir, por exemplo, “As pessoas desse time nunca me ensinam nada” você poderia arriscar:

“Você está chateado porque está precisando de mais suporte e parceria dentro da equipe?”

#5 Dê feedbacks

Sabe aquela conversa difícil que você está precisando ter com alguém? Utilizando os 4 componentes da CNV, essa conversa pode ser muito mais produtiva se você empregar expressões autênticas.

1. Observação
Observe o que está acontecendo de fato, sem julgamentos e juízos de
valor.

“Quando combinamos observação com julgamento, as pessoas tendem a
receber isso como crítica”
Marshall Rosenberg

2. Sentimentos
Identifique o que está sentindo em relação ao que se observa. Ou seja,
nomeie para si mesmo o que está sentindo: frustração, alegria, tristeza,
raiva, etc.

“Expressar nossa vulnerabilidade pode ajudar a resolver conflitos”
Marshall Rosenberg

3. Necessidades
Informe suas necessidades, valores e desejos que estão conectados aos
sentimentos que nomeou anteriormente. Em outras palavras, quais são as
reais necessidades que lhe fizeram sentir daquela maneira?

“Quando expressamos nossas necessidades, temos mais chances de vê-las
satisfeitas”
Marshall Rosenberg

4. Pedido
Peça o que deseja, de forma concreta, para que atenda suas necessidades.
Não espere que o outro adivinhe as suas necessidades e desejos.

“É comum não termos consciência do que estamos pedindo”
Marshall Rosenberg

Planeje um feedback ou uma conversa dificil que você está adiando, com base na estrutura abaixo:

“Quando eu vejo/escuto ______________ (observação) eu fico ______________
(sentimento) porque _______________ (necessidade) é importante pra mim
nessa relação. Você poderia _____________ (pedido)”

Exemplo de expressão autêntica utilizando os 4 componentes da CNV

Conteúdo extra: Cheque se o feedback faz sentido para o outro, ouça atentamente como ele se sente. No exemplo acima, a Andréa poderia estar com um problema pessoal e por isso teve que usar o celular durante as reuniões.

E aí, curtiu? Deixe me saber nos comentários como a CNV pode te ajudar a aprimorar relacionamentos pessoais e profissionais.

Abraço!

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