Os Panteras Negras (1968), de Agnès Varda

Janderson Felipe
Mirante Cineclube
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4 min readMay 5, 2019

Antes tudo apresentar qual a proposta deste canal, o Mirante Cineclube iniciou através da reunião de pessoas que estavam dispostas a estudar a crítica cinematográfica e há dois anos ajuda a fomentar o pensar cinema em Maceió, sendo desde o começo o desejo de ter um próprio veículo que pudesse expandir essas reflexões. Então estamos aqui iniciando com um filme que compôs a curadoria da nossa última sessão “Cléo das 2 às 5”, no dia 04 de maio de 2019.

Filmado em 1968 com apenas 2 anos de existência do Partido Panteras Negras para Autodefesa com uma clara preocupação de Varda em apresentar o partido através de um ponto de partida: o julgamento de Huey P. Newton, fundador e líder do partido. Esta proposta de Varda em colocar luz sobre o movimento num momento tão crítico foi fundamental para o processo de popularização das ideias dos Panteras Negras.

De primeira já temos uma reunião de famílias, homens, mulheres e muitas crianças com a presença de uma banda Soul num bairro negro em Oakland, a narração em off diz “que isso não é um picnic”, ali está ocorrendo um protesto, este início é um movimento consciente de Varda em quebrar a alcunha de partido violento que os Panteras Negras receberam durante toda a sua história por iniciarem como uma patrulha armada do povo negro para defesa e monitoramento da violência policial.

Num exercício de Cinema Verdade, onde o que não é mostrado, é dito, é perceptível a necessidade pulsante de “mostrar como as coisas são” tão presente nesse filme, e por isso ela vai passar pelos ideais do partido, o programa por qual lutam, tudo isso através das falas dos próprios integrantes, deixando claro quão eram maoistas, marxistas, seguidores de Malcolm X e influenciados pela Revolução Cubana.

Durante todas essas falas que davam compreensão sobre o partido, existia em paralelo uma efervescência devido a situação do julgamento de Huey, fazendo praticamente do filme de Agnès um filme-protesto, devido a diversas falas em púlpito de lideranças como Stokely Carmichael, Bobby Seale, Eldridge Cleaver e Kathleen Neal Cleaver, e é marcante ver como o movimento estava próximo da população, devido à sua grande presença nos protestos e Varda não se poupava em colocar diversas falas de apoio e defesa da libertação de Newton.

Varda faz questão de revelar que o partido é vanguarda por também colocar as mulheres em papeis de igualdade dos homens, ao se ver uma grande presença de mulheres no movimento passando pelos mesmos treinamentos que os homens e se colocando em posições de liderança, como na fala de Kathleen Neal Cleaver sobre suas funções e quando discursa sobre a potência política que existe sobre a estética negra para a recuperação da autoestima do povo negro.

É como se a diretora fizesse o partido ir se desvelando camada a camada, os colocando como os revolucionários que eram, onde em plenos anos 60 lutavam pelo desencarceramento da população negra e que não via na prisão de Huey um caso isolado, num dos momentos Carmichael afirma “é uma força de opressão que ataca o povo oprimido”. É histórico o registro em prisão de Newton pouco antes do julgamento, o potencial revolucionário do grupo é medido pelo seu líder onde mesmo preso não se reprime ao falar sobre a violência sofrida e se coloca como o grande pensador que era.

No filme é dito que os Panteras Negras têm esse nome devido a um animal belo e negro que nunca ataca, mas se defende ferozmente e é importante perceber o deslocamento que Agnès Varda faz mesmo como estrangeira para que o conceito do movimento perpasse por todo filme, ao buscar quebrar a ideia de partido violento desde sua cena inicial, ao fim Varda revelando que ocorreu um ataque da polícia logo após a condenação de Huey em que as imagens de Newton e Cleaver são alvos de tiros.

Pode parecer premonitório por parte da Agnès ao dizer que a história dos Panteras Negras não acabaria ali, pois o que se deu foi uma série de revoltas e protestos que levaram a soltura de Huey P. Newton em 1970 e sendo a década de 70 um grande marco para o partido devido ao grande crescimento que teve e influencia alcançada nas lutas do direitos civis.

Os Panteras Negras se defenderam.

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Janderson Felipe
Mirante Cineclube

Estudante de Jornalismo na UFAL, membro do Mirante Cineclube, um protótipo de realizador e vê Cinema em tudo.