REVIEW 01 | Radical, de David Platt

Raíssa Martins
Mitocôndria
Published in
4 min readJan 22, 2018

David Platt. Uma busca no Google e encontramos menções ao pastor mais jovem de uma megaigreja nos Estados Unidos. Só por esta informação, poderíamos supor que um livro escrito por alguém com este item no currículo, possivelmente, trataria de estratégias de multiplicação de membros, de métodos mirabolantes de evangelismo e discipulado… Mas não.

Logo no início, Platt já expõe um dilema interno seu: como lidar com o fato de ser pastor de uma megaigreja se Jesus, o modelo a ser seguido, passou a maior parte do tempo com doze homens e, quando deixou a Terra, tinha apenas 120 seguidores que, de fato, estavam por perto?

Esse dilema é a deixa para que Platt comece a demonstrar como Jesus sempre andou na contramão da nossa cultura, principalmente, no que se refere ao que enxergamos como sucesso.

Quando imaginamos uma igreja bem-sucedida, comumente, pensamos em um auditório amplo lotado, com cadeiras confortáveis, muitas luzes, mídias impecáveis, estratégias exitosas, recursos… Toda essa infraestrutura farta, contudo, pode nos levar a depositar nossa confiança nas coisas que temos, em nossa própria capacidade, de modo que, diz Platt, “o poder de Deus é, na melhor das hipóteses, um adicional às nossas estratégias”.

David nos convida a voltar para as bases: oração, leitura das Escrituras, evangelismo e discipulado. Nesse percurso, ele nos apresenta exemplos que nos causam constrangimento. Ele relata um encontro com cristãos que se reúnem clandestinamente em um país onde o Evangelho é duramente censurado. Na ocasião, após um tempo de estudo bíblico com aquelas pessoas, elas o convenceram a caminhar por todo o Antigo Testamento durante 10 dias seguidos em reuniões que duravam de oito a doze horas.

“Apesar do tamanho, sessenta crentes se apertam naquela sala. São pessoas de todas as idades, desde lindas garotinhas até senhores de setenta anos de idade. Eles se sentam no chão ou em banquinhos, alinhados ombro a ombro, amontoados com suas Bíblias no colo. O telhado é baixo, e uma lâmpada pendurada no meio do teto como a única fonte de iluminação.
Nenhum sistema de som.
Nenhuma banda.
Nenhum violão.
Nenhum entretenimento.
Nenhuma cadeira acolchoada.
Nenhum prédio com aquecedor ou ar-condicionado.
Nada além do povo de Deus e da Palavra de Deus.
E, estranhamente, isso é suficiente.
A Palavra de Deus é o bastante para milhões de crentes que se reúnem em igrejas domiciliares como essa”.

Por trechos assim, as palavras de Russel D. Moore sobre “Radical” são certeiras: “Às vezes as pessoas recomendam um livro dizendo: ‘Você não irá querer fechá-lo’. Eu não posso dizer isso sobre este livro. Você irá querer fechá-lo sim, muitas vezes. Se você é como eu, ao ler as palavras de David Platt, se encontrará desconfortavelmente como alvo do Espírito Santo”. As palavras de Platt não são fáceis de digerir, não massageiam o ego, mas provocam lágrimas.

O autor também passa por trechos da Bíblia Sagrada. Ele fala sobre a passagem de Atos na qual os discípulos se encontravam reunidos no cenáculo: “Eu vejo um pequeno grupo de discípulos tímidos amontoados num cenáculo. Eles sabem que precisam do poder de Deus. Eles são galileus, desrespeitados pelas classes mais altas de Jerusalém como plebeus de classe baixa, rurais e sem instrução. Esse é o grupo do qual depende a propagação do Evangelho. Então o que eles estão fazendo? Eles não estão traçando estratégias. Eles estão reunidos ‘sempre em oração’” (referência a Atos 1:14).

Ressalte-se, contudo, que Platt não faz uma ode à desorganização. Como enfatiza, na igreja que ele pastoreia, há, sim, planejamento, organização… Mas há uma busca para que tudo seja feito sob jejum e reconhecimento da dependência de Deus.

Platt ainda trata sobre o contexto, muitas vezes, de luxo e riqueza existente nas igrejas dos EUA, em contraste com a pobreza enfrentada por tantas pessoas pelo mundo. As palavras dele servem de alento. São vários os exemplos trazidos de pessoas de sua comunidade de fé que têm buscado servir ao Senhor de modo radical, inclusive, no tocante aos seus bens materiais. Para que não haja mal-entendido, ele ressalta: “A Bíblia não ensina em nenhum lugar que ajudar os pobres é um meio pelo qual alcançamos a salvação (…) De fato, ajudar os pobres (dentre outras coisas) é evidência da nossa salvação”.

“O fato de Jesus não ordenar que todos seus seguidores vendam todos os seus bens traz conforto apenas ao tipo de pessoa para quem Ele daria essa ordem”. (Robert H. Gundry citado por Platt)

Ao final do livro, David Platt nos desafia a cumprir o que ele chama de experimento radical. São cinco coisas para realizar durante o período de um ano. Não vou citar quais são para que você se sinta estimulado a ler o livro e descobrir, mas também porque elas fazem mais sentido após a leitura da obra.

O experimento radical se encaixa bem com uma frase dita por Platt no início do livro: “O Evangelho não nos induz a uma mera reflexão; o Evangelho requer uma resposta”.

Esta é uma das melhores coisas de “Radical”: não se trata de mais um livro sobre os grandes feitos de cristãos espalhados ao redor do mundo. Este livro diz respeito a nós, leitores, e ao que temos feito com o que vimos e ouvimos. Os exemplos trazidos ao longo da obra não devem nos levar a pensar, apenas, sobre a disposição que outros cristãos têm tido, mas sobre a disposição que devemos ter.

O grande desafio de “Radical” é o de nos levar a ir além da reflexão teórica. Mais do que nos impactar, o propósito da obra é nos conduzir à ação.

PLATT, David. Radical: Resgatando a sua fé de um cristianismo impotente. Edilan. Edição do Kindle.

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