Situações pontuais: Há incentivo nas universidades para a saúde mental dos estudantes?

Jaqueline Rodrigues
Moderna Parahyba
Published in
6 min readSep 29, 2020
Imagem: Banco de imagens oficial da UFPB

Ano passado, neste mesmo mês voltado à saúde mental, um adolescente que estudava no Instituto Federal da Paraíba tirou a própria vida. O caso gerou enorme angústia entre os alunos.

Particularmente, por ter sido aluna deste Instituto e ter passado tantos anos vagando entre aqueles corredores, me leva a pensar que ao mesmo tempo muitos possam não ter enxergado o sofrimento de várias pessoas. Indivíduos estes que tendem a repelir todo tipo de aproximação e informação que seja para ajudá-las.

É necessário entender a finalidade da campanha do Setembro Amarelo. Ela surgiu no ano de 2015, com o intuito de alertar as pessoas sobre uma questão ainda muito invisibilizada: a forma de como encarar, prevenir o suicídio, de modo que alerte àqueles que sofrem com alguma doença ou aqueles que estão ao seu redor. Nos últimos anos houve um notório crescimento de casos de pessoas que passaram a sofrer com algum tipo de transtorno, levando-as até ao caso mais extremo. Segundo o levantamento do ano de 2016, a OMS (Organização Mundial da Saúde) alertou que o suicídio é a segunda principal causa de morte entre os jovens de 15 a 29 anos em todo mundo.

Diante desse fato, a discussão trazida é sobre a questão de como tantos estudantes estão a mercê desses problemas psicológicos. Além da área acadêmica, o meio em que aquela pessoa está inserida pode afetá-la radicalmente. A professora Silvana Carneiro Maciel, do curso de graduação em Psicologia da Universidade Federal da Paraíba, falou sobre os tipos de transtornos que assolam os estudantes, além do suporte oferecido pelas Universidades.

Alguns transtornos psicológicos acabam sendo mais recorrentes por todo o mundo, como a ansiedade, a depressão e os causados pelo consumo de drogas. A professora explica que estes tipos de transtornos podem ser gerados a partir de vários fatores.

“Importante alertar que os transtornos podem ter causas variadas como problemas emocionais, genéticos, orgânicos, podendo haver articulação entre eles.”

O estudante do curso de graduação em Engenharia Civil da UFPB, Witamar Bernardo, passou a diagnosticar a ansiedade na Universidade. Após a sua entrada, ele relata que nos primeiros períodos do curso de Engenharia Mecânica, em 2017, ele sentia algumas coisas e percebeu que eram situações pontuais.

“Ficava muito ansioso, pré-prova principalmente, coração acelerado, respiração difícil, passei a comer muito mais e não sentia nenhum tipo de confiança mesmo quando estudava muito para a prova”.

Outra questão que geralmente causa desconforto aos pacientes, é sobre como os familiares e amigos lidam com a situação de quem se encontra com algum transtorno. Isso deve-se ao fato de muitos serem levados a considerar esse assunto como uma besteira e que pode ser passageiro. Porém, na maioria dos casos, o suporte familiar e o ciclo de amizades chegam a ser primordiais, principalmente atentando-se a enxergar a situação como uma questão de saúde.

Por estarmos no mês de uma campanha fundamental, sempre fica a indagação acerca do que pode ser feito para prevenir o suicídio. Ao ser procurada, a professora Silvana alerta: “Buscando ajuda de profissionais da área. Não tendo vergonha de falar da sua dor, de buscar ajuda. A política do avestruz — ignorar situações ou problemas — , do isolamento não ajuda em nada.”

Juarez Inácio, estudante de Jornalismo da UFPB, lida com a depressão e expõe algumas de suas dificuldades. Ele relatou que os sintomas se intensificaram durante a sua primeira graduação. Em 2016, ele estava no curso de Relações Internacionais. Após esse período, ele relata:

“No meu primeiro curso, eu entrei sem muita noção do meu problema (apesar de sempre ter suspeitado), já que nunca tinha passado por um profissional, então tentava o tempo todo me colocar no mesmo nível dos meus colegas de classe. Com isso, já no segundo semestre eu me vi completamente sobrecarregado e perdido, precisando trancar o curso pela primeira vez. Depois disso, eu troquei de turno numa tentativa de dar um ‘restart’ no curso e, aconselhado por alguns colegas de classe, procurei ajuda psicológica, e foi aí que veio o meu diagnóstico de depressão (primeiro por uma psicóloga, depois por um psiquiatra).”

Para entender ainda mais sobre estudantes com transtornos psicológicos, foi entrevistado o estudante de psicologia da UFPB, Heitor Marinho, pesquisador e ativista pelos Direitos Humanos. Ele contou um pouco sobre algumas experiências como estudante da área e como o ambiente acadêmico influencia na saúde mental.

Na sua visão como estudante de psicologia, o entrevistado conta que é grande a quantidade de amigos e conhecidos que o procuram para obterem informações acerca de formas de tratamento: “Dentro dessas questões que eles me trazem vêm sempre: onde fazer atendimento clínico por um preço acessível, onde eles podem ter acesso a psicóloga pelo Sistema Único de Saúde e dúvidas a respeito de abordagens da clínica psicológica.”

Ele ainda fala sobre uma recente iniciativa: a conquista da presença de psicólogos e assistentes sociais no ensino público, e as expectativas que carrega em relação a isso.

“Com isso, esperamos ver um salto qualitativo no que diz respeito a proteção e qualidade do ambiente escolar, já que como sabemos o bullying e as condições de vida (não ter internet para acessar uma aula online), por exemplo, é um fator que afeta negativamente a qualidade de nosso bem-estar.”

Heitor considera que é bastante comum que o ambiente universitário acabe se tornando propício para a manifestação de transtornos de ansiedade. Para ele, isso se deve a como o modelo de produção chega a ser aplicado no meio acadêmico, através de cobranças institucionais advindas de professores, pela própria instituição, pelas suas pró-reitorias e políticas de assistência com base no tripé: pesquisa, extensão e ensino.

”Por exemplo, se pensarmos em estudantes em condições pauperizadas de vida que necessitam de benefícios, bolsas de ensino e das políticas de assistência das universidades, vamos entender que é eminente que essas pessoas estejam em um estado constante de alerta, já que ao longo dos anos acompanhamos um desmonte de políticas públicas voltadas para os mais pobres e de políticas com as bolsas de pesquisa, extensão e monitoria.”

A Universidade Federal da Paraíba conta com uma clínica de psicologia. Ela geralmente é muito procurada pelos estudantes da própria instituição. Isso gera uma grande demanda e muitas das vezes, torna-se impossível o atendimento a todos. Sobre esse ponto, Heitor ressalta a importância de ir além desta clínica e procurar outros lugares que possam auxiliar nisso.

Daí a importância de conhecermos para além da clínica da UFPB, como também as de outras instituições da cidade: Uniesp, Unipê, Uninassau e outras. Os serviços ofertados pelas unidades de saúde que cobrem a região que vivemos: unidades de saúde da família, centros de práticas integrativas, centro de cidadania LGBT, casa de acolhimento da mulher, espaço LGBT.”

Ao nos depararmos com tantos casos de transtornos acontecendo dentro das instituições educacionais, a professora Silvana Maciel destacou algumas sugestões de como poderiam agir, sendo elas:

1. Mudanças nos projetos dos cursos, de forma a contemplar mais as necessidades reais dos alunos e da sociedade;

2. Centros de apoio psicológico aos alunos com possibilidade de rodas de conversas, atendimento psicológico, trabalho de orientação aos alunos;

3. Uma universidade acolhedora e apoiadora com diálogo entre professores e alunos e aluno-aluno;

4. Alimentação de qualidade para os alunos;

5. Bons espaços de sala de aula, de livros e internet;

6. Lazer e esporte;

7. Criar uma rede de apoio sobretudo para os alunos que são de outros lugares (cidades de Estados diferentes);

8. Inserção de disciplinas sobre questões emocionais e relação estudantil em todos os cursos.

“Hoje, 4 anos depois que eu ingressei no meu primeiro curso, acho que é a primeira vez que eu me vejo lidando bem com a experiência universitária. Ainda há dias em que eu acho que o mundo é feito exclusivamente para pessoas saudáveis e que alguém como eu não deveria sequer tentar ser alguma coisa, mas são pensamentos que eu venho aprendendo a lidar.” — Juarez Inácio, estudante de Jornalismo da UFPB

Caso tivéssemos alguma dessas possibilidades dentro das instituições, possivelmente a campanha do setembro amarelo surtiria mais efeito do que apenas posts nas redes sociais. A questão do suicídio e os agravantes prévios são sinais que estão em constante crescimento ao nosso redor, não apenas em um mês do ano. Que possamos trazer o pensamento de que tanto a academia, quanto o suporte familiar são mais do que necessários para uma diminuição de casos. Com isso, contribuirá para a melhora dos estudantes como Witamar Bernardo e Juarez Inácio, que tiveram dificuldades devido este ambiente.

Revisão: Caroline Sales

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Jaqueline Rodrigues
Moderna Parahyba

Em constante evolução, amante de histórias e estudante de jornalismo.