Alguns sinceros fragmentos de uma malabarista cansada

Jéssica Modinne
Modinhas
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2 min readNov 21, 2022

Tenho vivido dias atipicamente estressantes.

Acho que estou presa em uma

armadilha de um labirinto

emperrada no tempo.

Estou tentando terminar um quebra-cabeça com peças faltando; estou tentando resolver uma equação onde eu errei um cálculo linhas atrás; estou tentando construir um castelo de cartas na praia; tenho tentado fazer malabarismo com facas afiadas.

Sinto-me cansada de perguntar onde estou errando, porque respondo essa pergunta, todas as vezes, com uma resposta diferente. Se todas as respostas são diferentes, talvez, não haja resposta; na verdade, talvez essa nem seja a pergunta certa.

Talvez eu não esteja errando

e isso seja um processo muito antigo,

muito ancestral

sobre o que eu penso em relação a mim

no presente.

É algo bem primário e que, sendo bem honesta, é capaz de nunca ser descoberto; pode ser elaborado, mas nunca revelado. Pistas, apenas.

A minha terapeuta se refere a minha autoculpabilização como um chicote, analogia que me contempla muito. Eu não preciso mais que alguém me diga

quais desejos eu não devo desejar,

eu mesma não me permito vivê-los mais.

– Os atos disciplinares foram incorporados à minha discreta existência com muito sucesso — penso, foucaultianamente, e a(s) psicóloga(s) ri(em).

Estou em um processo doloroso de olhar o quanto eu me esqueci, me abandonei. Chegou o tempo de parar de correr em muitos sentidos: parar de correr na jornada, parar de correr da jornada. Esse processo tem me convocado a me expressar de outra forma, a olhar com gentileza para os fragmentos do quebra-cabeça e achá-los bonitos na sua ausência;

tem me convocado a olhar

a pele ressecada das palmas das minhas mãos

Pedindo atenção de mim

Da mesma, de si, submersa

afogada, cansada

Escrever sobre mim é um desafio tão grande e igualmente bobo, pois estou aqui e não estou, sou eu mesma e tenho que me observar apartada de mim. Algo simples e extremamente complexo.

Meu corpo pede um descanso de dimensões astronômicas, hercúleas, drásticas,

mas meus pensamentos atravessam

medrosos e tensos

o funil temporal de um

mar vermelho

em breve estio

como uma multidão de vozes que ressoa oca em minha cabeça;

o tempo apenas passa.

Não há tempo suficiente para que todos esses pensamentos passem pelo mar [aberto e eles se afogam (eu me afogo).

É hora de apreciar os espaços vazios do quebra-cabeça; de desistir desse imenso cálculo sem sentido; de deixar o vento levar as cartas pela praia; de curar os ferimentos do malabarismo com as facas.

(Concebi esse texto em um momento de muita honestidade. Eu não sou boa em explicar as coisas que eu faço, invento. Mas acho que sou boa em fazê-las).

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