Segredos, presentes e açúcares

Mauro Sérgio Lima
Motriz
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2 min readJul 23, 2018

É como se todo mundo soubesse de um segredo, menos eu. E, Deus, como eu sempre fui curioso. Eu me coçava todas as vezes que alguém sussurrava e ainda que compartilhasse a mesma língua, me sentia como se eu nunca pudesse realmente tocar o significado das palavras. E era o que eu queria, desde muito antes.

Era como encher o prato com todas as versões possíveis daquilo que eu queria e mesmo assim não sentir o gosto da comida de verdade. Tudo imitação. A vontade ia embora, mas quando voltava, era de molhar o queixo com baba viscosa.

Quando a gente deseja muito alguma coisa, vira criança num piscar de olhos. Eu tinha tantos argumentos para ser infantil que me sentia em casa. O caçula de primeiro signo que dificilmente ficava sem o que queria. Poucas vezes foram necessárias chorar para conseguir.

Nesse caso, não adiantava chorar. Antes de se ter o brinquedo, parece que tudo é válido, mas depois, sinceramente, que besteira. Usa-se, desusa-se, esquece-se, doa-se. Pega de volta, brinca mais um pouco, quebra, cola, arranha, envelhece, fica sem graça. Depois se lembra, limpa, cuida, brinca de novo, vira enfeite em cima da cama.

A gente dá um abraço tão forte quando ganha o presente que quase parece que todo o sentimento ficou preso ali, naquele momento. Eu lembro que foi tão rápido, exagerado, meio descuidado, bagunçado e, mesmo que divertido, nem foi tão especial.

Parece que só era segredo porque todos temem que os outros descubram que o copo de brinde da sacolinha surpresa costuma vir vazio. Dá um trabalho encher com algo vitamínico, então a gente fica só no refrigerante. É tudo criança freudiana em busca de açúcar.

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