COVID-19 em Portugal — uma primavera diferente

Patricia Balderrama
Mudamento
Published in
4 min readApr 20, 2020

Era a primeira semana de março/2020 quando o país começava a ter um olhar diferente para o COVID 19… as pessoas viam as notícias que chegavam da Itália e pareciam não acreditar que a "gripinha" podia ser algo, de fato, mais grave. Em 13 de março as escolas anunciavam que não haveria mais aulas presenciais, vários estabelecimentos fechavam suas portas, sem previsão certa de retorno. Os professores tentaram ainda que de uma forma improvisada passar trabalhos, conteúdos, torcendo para que as férias da Páscoa chegassem e pudessem se estruturar melhor — eles, nós e o país.

Já não haviam máscaras de proteção, tampouco álcool gel disponíveis nas farmácias — itens de higiene que mostraram ser a grande arma contra o tal vírus. Nos supermercados já faltavam alguns produtos, iniciou-se uma série de medidas de segurança (controle de entrada, distanciamento com segurança, luvas, máscaras, horários limitados…) Não parecia verdade as cenas que víamos na TV dos hospitais no norte da Itália, e outros vários países entrando em curvas crescentes de casos. Espanha perdendo o controle da situação, EUA, e assim por diante. A OMS, apesar de ter tido conhecimento desde janeiro dos casos crescentes em continentes diferentes da Ásia, e de ter acesso às informações (ainda que veladas) do que ocorreu na China, só decretou o COVID 19 como pandemia em 11 de março/2020.

O que vivemos nos dias de hoje são fatos que nunca imaginei viver em um mundo com a revolução tecnológica, poder intelectual, biológico, químico nunca antes atingidos: aparece um vírus altamente contagioso em um mercado na China e o mundo não estava preparado para vencê-lo. As pessoas não estavam preparadas para ficar longe do convívio social. Os médicos não estavam preparados para escolher quais pacientes deveriam receber o equipamento necessário para sua respiração em detrimento a outros. A logística e cadeia de suprimentos não estava preparada para suprir o mundo frente a um ataque único, ao mesmo tempo.

Semana passada, 14 de abril de 2020, as aulas retornaram em Portugal, iniciando o terceiro e último período do ano letivo, de forma virtual. Os professores usaram e-mails e aplicativos de teleconferência para não deixar que a educação interrompa seu ciclo; o governo disponibilizou um canal com aulas diárias para todos os anos da escola, incluindo a pré-escola, para dar suporte e complemento ao estudos dirigidos por cada escola do país, iniciando-se hoje, 20 de Abril. O desafio é que ninguém fique sem estudo, apesar de aproximadamente 25% das pessoas não terem computador em casa no país (levantamento realizado com base nos números em Lisboa!).

Os supermercados não deixaram faltar os itens essenciais, tendo uma ou outra marca em falta de algum produto específico, eventualmente. As empresas de serviços adotaram home office, lay- off (a empresa compromete-se a manter o posto de trabalho e o governo paga 70% do salário), sistema de rodízio, e as fábricas e indústrias não pararam. O governo começou a desenhar várias medidas econômicas e de apoio financeiro a pequenas e médias empresas (embora muitas empresas ainda reclamem que estes apoios estão demorando a chegar na efetividade), trabalhadores independentes, assalariados, facilidades em créditos e postergação de parcelas de financiamentos, mas existem várias ainda em discussão. Qual será o impacto e o tamanho da recessão e da crise econômica no país, ninguém sabe dizer. Mas não será pequeno dado que é um país que ainda se recuperava da crise financeira de 2008, que tem 14% do seu PIB oriundo do turismo. O FMI estima que o desemprego, que até início do ano era de 6%, chegue a14% em Portugal (não pior que Espanha com estimativa para 20%) e o PIB tenha um queda de 8%. Mas tudo é ainda uma grande incógnita. Ninguém sabe ao certo qual será o real impacto na economia mundial.

A curva de casos e contágios começa a descer aqui no país, as estimativas são positivas, o país e as pessoas foram muito disciplinadas, unidas e todos estão realmente fazendo a sua parte. Mas nada adianta se o mundo não se curar também. Nenhum país vive mais isolado, a realidade é outra. Apesar do incentivo à economia e produção local, não existe mágica, os efeitos serão sentidos por todos.

Rua de Santa Catarina no Porto, rua de comércio que geralmente vive cheia de turistas e artistas de rua, no dia 17 de Abril de 2020.

É muito estranho e assustador ver as ruas vazias, as pessoas fisicamente distantes, com máscaras, luvas, medo. De tudo isso que vivemos, para mim, o mas positivo é ter o carinho e o amor da família e amigos, as atitudes, oportunidades e solidariedade que surgem, a valorização do que realmente é importante. Sem dúvida vivemos uma transformação, uma das maiores dos últimos tempos, mas nada irá adiantar se interiormente cada um não se transformar também diante de tudo o que tem acontecido. Que venham tempos melhores e que o ser humano faça o melhor pela humanidade diante deste cenário. E quando meus netos ou filhos dos meus sobrinhos ou filhos dos filhos dos meus amigos estiverem lendo este post, que valorizem cada novo conhecimento, avanço e aprendizado vivido ou criado a partir destes tempos.

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