Gabriela Dornelas

UMA MULHER SONHADORA QUE VEIO PARA A CIDADE GRANDE DISPOSTA A CONQUISTAR SEUS SONHOS E SUA LIBERDADE.

Ana Carolina Rodrigues
Mulheres de Belo Horizonte

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Gabriela Dornelas nasceu no leste do estado, em 26 de dezembro de 1985 e relata ser uma péssima data para nascer! Perto demais do Natal para não ter uma infância com traumas festivos.

Mãe alcoólatra, pai extremamente rígido, pouca grana, muita regra. Para grana dar, vai trabalhar com 11. Para grana dar, vai morar na roça, a mais de uma hora da escola. Faz isso às 7h, aquilo ao 12h, tudo pronto até 18h, nada de rua — nunca, após às 22h. É coisa de vagabunda e “filha minha, não”. Não se expõe, não me envergonha, não responde, não pode, não é. Nota alta na escola não é mais que obrigação, mas depois de certa idade, não precisa mais. Já sabe ler e escrever, já sabe até demais.

Opa, espera. Aí não. Briga, busca bolsa, trabalha mais. Ensino médio, faculdade. Primeira da família. E o pai começa a entender que a vida não é só o que ensinaram para ele. A frase que ele sempre falou: “não é porque você é pobre, não é porque cê tem família negra, não é porque você é mulher. Ninguém vai te dar nada, o que você quiser você tem que correr atrás” — surtiu mais efeito do que ele imaginou. Quem mais cobrava dela era o mesmo que dizia que ela podia ser o que quisesse, a ensinou a ser dela só. E depois da faculdade? A cidade pequena não tinha mais opção.

Para quem conheceu internet em 2004, se formou na faculdade de jornalismo, especialista na área de comunicação social. E queria mais. Para quem mal tinha saído da cidade pequena, queria ir para capital. Para quem disseram que era para parar de estudar, queria todo conhecimento que podia ter. Coloca então as coisas numa mala e vem. Como tudo em Belo Horizonte era grande! Prédios, trânsito, quanta gente, quanta coisa! Paga a pós de uma vez. Volta para a cidadezinha porque a mãe tá doente. Tenta de novo. Volta para a cidadezinha porque o pai tá doente. Tenta de novo. Volta para a cidadezinha porque os pais precisam dela por perto. Mas chega, tem hora que tem que ir com tudo.

E experiência de cidade pequena não vale muita coisa em cidade grande. Caça emprego, pega freela, serve mesa, aprende outra língua em casa para ter mais o que apresentar.

Dez anos depois, deu certo. Porque a cidade grande mostrou mais que desafios, mostrou possibilidades. Para quem achavam que a vida seria linha reta, ela aprendeu a dar voltas. Arrumou um bom emprego, casou, descasou e conheceu gente.

Conheceu também coragem de se expor, se envergonhar, responder, poder e ser. Os pais evoluíram, porque ela evoluiu. Exige coragem e o medo é constante. Mas é que para ser mulher precisa ter tudo isso nesses tempos nossos, e não é porque se quer. Quanto mais inserida numa realidade que já fazem planos por você, maior é o esforço para sequer reconhecer quais são seus anseios pessoais. Ainda mais para sair do esperado e ir atrás do sonhado, do desejado. Por si e para que toda essa luta não seja necessária, para que nem tudo seja doído para a nova geração de meninas das capitais, das cidades pequenas, das zonas rurais.

A capital ofereceu para ela a diferença. Todo dia de mulher, todo tipo de luta, todo tipo de sonho. E na diferença ela encontrou união, pelo direito de exercer a diferença. Porque ela nasceu numa data ruim do final de dezembro, numa cidade pequena no leste do estado. Mas já até gosta disso, agora, com 32, sabe que pode viver todo dia, em todo lugar.

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