5 pilares de liderança: uma lista sincera

Suene Souza
Mulheres de Produto
13 min readJun 16, 2020

Há quase 10 anos eu lidero times e, a cada time, me junto a novas pessoas e, portanto, um novo mundo cheio de descobertas se apresenta. Acredito que esse fenômeno se potencialize por ter trabalho em empresas com culturas abertas — o que faz com que as pessoas não sejam robotizadas, não precisem se encaixar em um padrão esperado. Estar na área de Produto e Tecnologia também ajuda nesse fenômeno, acredito eu.

(eu não achei quem é o autor dessa arte maravilhosa! se alguém souber, me mandem para eu dar os créditos merecidos!)
(eu não achei quem é o autor dessa arte maravilhosa! se alguém souber, me mandem para eu dar os créditos merecidos, por favor!)

Mas descobri ao longo do tempo que alguns pilares de liderança não mudam, ainda que o cenário inteiro seja diferente do anterior. Hoje as reflexões são na tentativa de ajudar líderes — mas que, creio, podem ajudar todo mundo. Bora lá!

Gestão de si mesmo

Esse é o primeiro porque, pra mim, é o mais importante. Para líderes, liderados, empreendedores, autônomos e pros meus pais aposentados. E a verdade é que a gente lê e escuta falar muito disso, faz curso, debate sobre no trabalho e com os amigos, mas poucos conseguem realmente absorver — e há uma dificuldade em especial quando se faz gestão de times. Por quê? Porque você é tomado por mil prioridades todas-urgentes-ao-mesmo-tempo-agora. Os contextos passam de dois ou três, quando você é especialista, para facilmente dez ou mais por dia (às vezes, por hora). E cada um desses contextos passam a ser cada vez mais complexos, conforme você avança na carreira. Quando você chega em um lugar novo ou começa em uma cadeira de gestão, não importa se você herdou mil problemas — todos os olhos passam a estar em você e “não importa em quantos problemas seu dia foi dividido, o mundo não pára até que você conserte todos” (perdão, pelo trocadilho infame, William ¯\(ツ)/¯).

Outro ponto importante a ser considerado é que, por muitas e muitas vezes, você vai trabalhar em cenários não ideais. Quando se pensa em liderança, há uma ideia romântica que há um chefe que manda e as coisas magicamente são resolvidas, não se faz nada de chato, pensa-se em estratégias empolgantes o dia inteiro de um futuro bem futurístico e há uma assistente que responde toda sua caixa de e-mail que não para de acumular com pedidos e dificuldades.

A verdade é bem diferente e, claro, depende do momento e lugar onde você está. Já resolvi problemas estruturais nos meus dois primeiros meses de empresa, assim como já fiquei um ano tentando resolver problemas que eu considerava menos complexos do que eu já havia feito nos dois meses citados anteriormente. A lição é valiosa por trás disso: pessoas, empresas e situações são diferentes. Não existe fórmula de bolo mágica. E ou você está consciente disso e tem resiliência para lidar ou sofrerá muito.

Se você não tiver uma base forte construída de autogestão, será muito fácil se perder nesse turbilhão emocional, absorver a prioridade dos outros como sua, não ir a lugar nenhum e tropeçar em suas próprias emoções — e aí é só ladeira abaixo. Para lidar com isso, eu uso duas frentes: ação e internalização.

Ação

O segredo aqui é se organizar. Ninguém consegue ter gestão de si mesmo sem organização, com mais quinze coisas somando por dia pra você dar atenção. Organização requer visibilidade e priorização de TUDO o que acontece na sua vida (serve inclusive para aplicar fora do trabalho). Para chegar nela, eu primeiro faço o que chamo de Diagnóstico — um exercício para identificar as frentes que preciso olhar e disfunções da área, com o olhar nos 3Ps — Pessoas, Produto e Processo (já vamos falar sobre). Eu coloco tudo no papel — mas é tudo mesmo. Fazer esse exercício ajuda a diminuir a ansiedade, a parar de ocupar seu HD mental desnecessariamente.

Para montá-lo, olhando para cada um desses temas, me pergunto:

  • O que precisa acontecer para que P [complete com Pessoas | Produto | Processo] funcione?
  • O acontece hoje que faz com que P [complete com Pessoas | Produto | Processo] não funcione ou funcione com menos eficiência? Como posso resolver?

E gero um mapa mental com as respostas —qualquer dia desses vou detalhar como faço e mostrar um para ilustrar o exercício (me sigam no https://medium.com/@suene para ver).

Após ter essa visibilidade, eu priorizo, usando o princípio de Pareto — os 20% que posso fazer que me trarão 80% de resultado. E aqui não tem magia: escolher duas ou três temas mais importantes por vez. No fim das contas, você vai conseguir trabalhar na resolução deles em pouco tempo da sua semana, não adianta se comprometer com muito mais — olha a autogestão aí de saber sobre seu tempo e se respeitar! E, acredite, resolver um problema por vez, que costumam ser espinhosos, gera um GRANDE avanço. Ao final de um trimestre, por exemplo, você terá um time e negócio em outro estágio — e as melhorias nesses casos são como juros compostos, vão se somando por si só (quando 1+1 é igual a 3). Com a priorização, eu quebro a solução em acionáveis e os coloco na agenda. Orientação para realização é parte fundamental da autogestão.

Eu sempre faço o meu e também convido o time a fazer um em conjunto (faço um também só com o time de liderança — neste caso, para líderes de líderes). Assim posso cruzar as informações e que me ajudam a priorizar o que é importante também pro time.

Internalização

Falando assim sobre o Diagnóstico parece fácil, mas a realidade é que o mundo está pegando fogo enquanto você está trabalhando no dia a dia ao mesmo tempo em que trata disfunções do negócio e do time. Você terá que tomar decisões difíceis, que consomem muita energia vital. E isso, muitas vezes, em cenários caóticos. Pra somar, o trabalho de um líder é muitas vezes mais solitário que outras posições — você tem ciência de um cenário que as pessoas muitas vezes não tem e, apesar de prezar muito pela transparência, há momentos em que simplesmente você não pode dar todo contexto (por exemplo, em situações em que pessoas poderiam ser expostas). Ademais, quando o trabalho “dá certo” (seja lá o que isso queira dizer), muitas vezes existiu sua atuação silenciosa, mas ninguém vê isso — o contrário é o oposto: ao dar errado a responsabilidade é toda sua. A soma de tudo isso é uma carga emocional considerável e trabalho que se multiplica infinitamente — e um passo para que você perca a cabeça, se você não estiver fortalecido. Eu já perdi a minha em uma ou duas ocasiões e não foi nada legal — o que eu posso dizer é que esses momentos foram cruciais para que eu me fortalecesse ainda mais e entendesse que ser líder é acreditar em um caminho e persegui-lo, é saber enxergar o panorama geral e entender que você não será o salvador da pátria em um único dia, que é uma construção. E, com esse entendimento, seguir com tranquilidade, fazendo seu melhor todos os dias. A luz no fim do túnel começa a aparecer, seja qual for o problema que você estiver lidando, e começamos a ver a soma de todo o esforço surgir, cada vez mais exponencial. E quando isso acontece, as pessoas passam a acreditar e se juntam a você — está assim formado um p*ta ciclo virtuoso. E ver isso acontecer é uma alegria que não tem preço.

Ter um papel de liderança realmente não é fácil (a propósito, sabia que líderes morrem mais cedo? O tal do stress fazendo efeito). Loucura, né? E aí você me pergunta: mas por que então escolher estar na gestão? E eu respondo que, no meu caso, é porque eu amo. Como em tudo na vida, existem as dores e as delícias — e existem muitas delícias. Fazer diferença realmente na vida das pessoas fala diretamente com o meu coração. E pra fazer isso acontecer, eu preciso ser uma pessoa melhor a cada dia. Quando eu olho pra trás, vejo o quanto dou saltos exponenciais no meu próprio desenvolvimento — a pessoa que eu era, que seja, 3 meses atrás, já não existe mais (especialmente nesses últimos 3 meses, que meses…), imagina quando eu olho para um ano atrás ou cinco. E o mais gostoso? O time costuma te acompanhar nessa evolução.

Pra ser capaz disso, a gestão das emoções, adaptabilidade, confiança em si e otimismo — outros aspectos da autogestão — são fundamentais. Somado com a organização e priorização do que está acontecendo, revisitando semanalmente seu Diagnóstico, tenho pra mim uma boa fórmula para navegar no papel de líder.

Gestão dos 3Ps

Costumo dividir meu olhar para esses 3Ps: Pessoas, Processo e Produto (uma curiosidade: na minha cabeça, eu tinha ~criado esse frame há alguns anos e me achava muito esperta de ter condensado a gestão nesses 3Ps — e aí um dia eu descobri que quem fala isso é o Marcus Lemonis, o empresário que apresenta o The Profit. C-E-R-T-E-Z-A que ele me copiou, certeza!😬). Pra fazer seu dia a dia funcionar em uma posição de liderança, você precisa sempre de um olho no peixe e outro no gato, equilibrando da melhor forma os pratinhos (por isso, escolha os principais). Você vai precisar dividir sua semana e conseguir olhar para essas 3 frentes. Em cada uma delas, o que eu costumo olhar:

Pessoas

  • As pessoas estão bem pessoalmente? Elas estão bem com o que estão realizando no trabalho?
  • Elas sabem seu papel e o que é esperado dele?
  • Elas tem as hard e soft skills para esse papel? Posso desenvolvê-las nessas skills? Como?
  • Elas estão no lugar certo?
  • Elas estão felizes?

Processo

  • Temos um processo que nos permite falhar e aprender rápido e, portanto, entregar mais resultados?
  • Quais os maiores gargalos do processo? O que podemos melhorar?
  • Estou dando direcionamento claro para o time?

Produto

  • A visão de produto faz sentido?
  • Temos mudado de rota quando necessário para atingir a visão? A estratégia tem conversado com a visão, permitindo chegar mais próximo dela?
  • O que meus dados quantitativos e qualitativos dizem sobre o negócio e produtos hoje? Qual tendência estamos observando?
  • O que posso fazer para potencializar resultados positivos e reverter resultados negativos?
  • Agregamos valor com nosso produto?

Veja que esse exercício está diretamente ligado ao Diagnóstico que faço — o Diagnóstico é um exercício feito em cima dos 3Ps para identificar atividades essenciais para uma gestão eficiente no dia a dia + as prioridades das disfunções para trabalhar naquele momento.

Eu criei o frame dos 3Ps, Marcos Lemonis, dá licença.

Mão na massa

Essa eu relembrei pra mim mesma o quanto é importante recentemente. Estava cobrindo a licença maternidade da nossa Tribe Lead de Marketplace. Tomada por outras atividades, tive pouco tempo disponível para construir junto ao time. E aqui não falo de atividades macro, mas de dia a dia, como o embasamento de novas apostas, por exemplo. Assim que sai dessas outras atividades, comecei a colocar tempo na agenda para essa construção em conjunto e percebi o quanto isso ajudava o time e a mim mesma — e, no fim, são momentos super gostosos.

Acredito que não perder o “mão na massa” é crucial e te torna diferente de muitos gestores — isso é verdadeiro mesmo quando você é líder de líder e começa a ficar longe da operação (neste caso, crie momentos para poder contribuir com o time — mas saiba que você também tem minha solidariedade em relação ao tempo dependendo do momento em que você se encontra. Eu sei o quanto é difícil arrumar esse tempo). Quando você se coloca disponível, pode tornar o debate mais rico. E veja, é MUITO diferente de microgerenciamento — um fala sobre supervisão, o outro sobre contribuição.

Enfim, arregace as mangas e não tenha medo de sujar as mãos.

Comunicação

Comunique, comunique, comunique. Quando achar que está muito, comunique mais 10 vezes. Eu aprendi isso com o Fred Trajano, CEO do Magazine Luiza, e me foi um ensinamento muito rico.

A verdade é que as coisas estão na sua cabeça. Você vai lá e fala uma vez e, porque elas permanecem na sua cabeça, você acha que a mensagem está assim intacta na cabeça de todos. Acontece também de se falar por códigos, nas entrelinhas. Todo mundo faz isso — eu, você e o melhor líder do mundo. Somos humanos e quando a mensagem não está clara em nossa própria cabeça, ou quando não nos preparamos suficientemente, isso acontece. Mas tento pelo menos colocar muita atenção nisso, fazendo o melhor que posso e entendendo que comunicação é o meio mais acionável que me permite ser uma melhor líder.

Quais os meios então que uso para fornecer uma boa comunicação?

Ciclo de comunicação
Eu costumo pensar assim: sou transparente na mensagem/problema/situação → passo a falar em cima de dados, quando eu possuo (não tê-los precisa ser exceção, não regra) → crio uma narrativa em cima dessas informações que eu mesma acredito e que me empolgue → o time abraça a mensagem/problema/situação e passamos a construir juntos → está criado o ciclo virtuoso da comunicação.

Vou falar brevemente sobre “crio uma narrativa em cima dessas informações que eu mesma acredito e que me empolgue”, porque os outros são autoexplicativos. Acho chato trabalhar em cima de um problema “seco” enumerado por dados (eles merecem atenção tanto quanto os outros, mas é um meio de colocar vida nas coisas). Então o que eu faço é criar narrativas em cima desses problemas: por exemplo, quando comecei a ver os números da pandemia e as consequências para o mercado, tudo que eu queria era gritar um VAZA CORONAVÍRUS!!! Quando fui explicar pro time o panorama, transformei isso no “xôCorona” e pegou mais que chiclete.

Com a criação de narrativas que dão vida aos problemas e oportunidades, criamos mais engajamento e envolvimento — para nós mesmos, inclusive.

Seja você!

Coloque quem você é em sua gestão. Seja você!

Parece o conselho mais de auto ajuda do mundo, mas o que eu vejo é como o primeiro ponto da gestão de si mesmo: ouvimos falar muito, mas no fim há pouco entendimento efetivo.

Vou dar mais um exemplo real meu. Eu sou uma pessoa extrovertida, que valorizo muito o humor — e ele tende a uma certa dose de sarcasmo. Em algum momento percebi que por várias cascas criadas ao longo do tempo, fui me distanciando dessa personalidade e, no fim, na ~vida pessoal eu era uma pessoa e no trabalho tentava manter outro tipo de postura (ah, as cascas da vida!). E o que acontece à partir disso? Você se trai, se corrompe, passa a não ver verdade no que é e faz. Qual o preço? Um gosto amargo na vida e que você não consegue identificar de onde vem. Novamente, falando parece simples, mas a gente faz esse tipo de coisa e não percebe. Vai se corrompendo aos poucos — essas tais cascas não aparecem de um dia pro outro, elas também são uma construção.

Bom, eu identifiquei isso e o que fiz? Sou eu aonde quer que eu vá. Isso me fez TÃO mais coerente comigo mesma e, portanto, tão mais feliz que tudo o que eu desejo para você, gestor, é que possa fazer o mesmo. Desconstrua suas cascas e seja quem você é. E, uma vez desconstruídas, fique atento para que elas não comecem a se formar novamente por medo de julgamento ou como proteção.

Goste do que você faz. Goste de estar com o seu time. Crie confiança para trabalharem e, ao mesmo tempo, ser um momento gostoso para estarem juntos. Crie uma cultura que você deseja e que você visualiza as pessoas felizes nela. E lembre-se que isso também não acontece do dia pra noite, é uma construção (sim, esse é um dos pontos que mais bato o martelo em liderança. Se você achar que soluções que envolvem mudança de comportamento são rápidas e você não tem paciência pra construir aos poucos, liderança não é pra você). Uma das coisas que mais me enchem o coração na vida é trabalhar em algo que faça sentido e com pessoas que você quer que te acompanhem nessa jornada de evolução: do produto e negócio, da própria evolução delas e sua, e de brinde, poder curtir cada momento juntos, porque no fim, a vida é esse conjunto de momentos. Não é bom demais poder viver a vida com esse olhar?

(e lembrando que o papel de liderança tá longe de ser o unicórnio colorido que vomita arco-íris — ele vomita fedido e você tem que limpar a casa todo dia. Só que você limpa a casa todo dia pela recompensa de formar times cada vez mais fortes — e isso não tem preço).

Os princípios de liderança são simples, ainda que o dia a dia não seja. E o meu conselho é: aprenda a se organizar no caos. Gire seus pratinhos mais importantes de cada vez. Não tenha medo de sujar as mãos (é uma delícia!). Comunique até achar que você está repetitivo. Seja você, goste e acredite no que faz. E faça repetidamente até que confie em si mesmo.

Bônus para o MDP

Se você é uma mulher e é uma gestora, ou gostaria de ser, saiba que quando vejo mensagens sobre vocês acharem que é impossível ter um papel de liderança ou continuar crescendo, meu coração dói de arder. Eu tenho algo a dizer pra vocês, mas antes gostaria de reconhecer meus privilégios: sou branca, heterossexual e tive estrutura. Há pessoas, obviamente, que encontrarão muito mais dificuldades que eu encontrei.

Dito isso, o que eu tenho pra compartilhar é: eu já passei por situações realmente absurdas nesses anos de trabalho (tão absurdas quanto vocês possam imaginar) e já fui exposta enquanto homens que eram pares meus não foram, pela mesma situação, no mesmo espaço-tempo. Doeu e, às vezes, doeu muito.

O que eu fiz foi continuar. Às vezes eu tive força para usar algumas dessas situações absurdas pra alimentar minha vontade. E a cada insegurança minha, eu estudava 2x mais. A cada questionamento, eu repetia 2x mais, até saber fazer de trás pra frente. É desgastante e é injusto ter que se provar muito mais. É verdade, é muito mesmo. Mas é o principal caminho de mudança ativa que eu enxergo: evoluir, conquistar espaço e ser mais uma voz para ajudar a mudar esse cenário.

E eu vejo mudanças! Eu me acostumei a ser a única mulher na liderança por muitos anos — mas agora por exemplo, no Grupo ZAP, somos a maioria em Produto! Sei que estou em uma bolha, mas também sei que esse movimento começa a acontecer aqui e ali e vamos aos poucos tomando voz e obtendo mais espaço. Então, desejo a vocês só isso: que continuem!

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Suene Souza
Mulheres de Produto

Eu sou uma pessoa apaixonada — pela vida, pessoas, animais, plantas, pores do sol, café, viagens, tecnologia e fazer produtos que resolvam problemas do mundo