Criatividade é compromisso: como os princípios ágeis tiraram meu projeto paralelo do papel

Amanda Scarpin
Mulheres de Produto
6 min readJan 26, 2023

Sobre criatividade, agilidade & projetos paralelos.

Criatividade

Preciso. tirar. essa. ideia. da. cabeça.

Preciso.

Esses tempos li por aí que pra exercitar a criatividade é preciso liberar espaço na cabeça, colocar as ideias pra fora pra que as novas possam vir. Olha, fez muito sentido. Como que uma ideia engavetada no hipocampo cerebral há anos vai ajudar alguém, ou vai me ajudar?

É hoje que arranco esse devaneio da minha cabeça. Vou anotar tudo o que eu lembro da última viagem que fiz, reunir e editar todas as fotos, escrever crônicas de viagem emocionantes e engraçadas que vão fazer as pessoas se sentirem felizes e energizadas e no final elas talvez até pensem: é hoje que arranco esse devaneio da minha cabeça, vou conhecer aquele lugar que eu tanto quero!

Isso aconteceu há uns oito anos. Eu escrevi dois textos e parei. O terceiro texto não parecia nenhum pouco interessante, ou engraçado, ou emocionante, o quarto não consegui passar do segundo parágrafo e o quinto nunca existiu.

Agilidade

Oito anos depois, embarco numa viagem a trabalho.

Após muito estudo, uma graduação em engenharia mecânica, tentativa e erro, tentativa e acerto, processos seletivos, mais estudo, mais trocas e longas e profundas conversas com outros profissionais, eu me encontrei na área de produto.

Produto tem de tudo um pouco do que eu gosto e me sinto bem pra fazer no trabalho: as possibilidades diárias de aprender sobre tecnologia, ferramentas, negócio, mercado, sobre as necessidades de quem usa a tua solução e como construir algo que faça total sentido para elas, ter um olhar atento pra minha forma de comunicar e como ela pode ser melhor, mais clara, mais empática.

Produto tem uma infinidade de técnicas, ferramentas, frameworks, boas práticas nas quais eu sigo aprendiz navegando e às vezes me afogando nesse mar de referências. Foi o caos, digo, o dinamismo da área me atraiu e as possibilidades de aprendizado e impacto me mantiveram por aqui.

No meu primeiro projeto tive contato com os conceitos de princípios ágeis e do mínimo viável. Entregar algo simples que evolui a cada entrega. Fazer entregas frequentes que mantenham a simplicidade e melhorem a cada iteração. Colocar no mundo o mínimo porém suficiente pra testar, aprender, validar uma idea: ela resolve o problema? como ela pode ser melhor? Um processo iterativo que refina uma solução com base na vida real, na prática.

Projeto paralelo

Oito anos depois, embarco numa viagem a trabalho.

Não lembro se foi sentada num café hipster bacanudo do leste europeu, ou num local menos glamuroso como no sofá da minha casa assistindo TV, que decidi tratar criatividade como compromisso. Eu já sei que funciona, que criar rende frutos, já peguei referências de uma área e apliquei em outra, é super útil pra minha profissão, deve fazer bem pro coração, já me diverti muito com arte — escrevendo, pintando, fotografando. Agora criatividade é compromisso!

Que ideia massa!

Criatividade como compromisso, muito legal mesmo.

E agora?

Eu após ter uma ideia incrível nos confins da minha cabeça

Vou encaixar criatividade e arte na minha rotina. Eu amo café, vou me matricular num workshop de cerâmica e fazer minhas próprias canecas e aí vou criar uma marca de canecas com uma identidade visual belíssima! Simplicidade, simplicidade… Vou aprender a tricotar. Mas não consigo começar hoje. O que consigo começar pequeno hoje?

Consulto na gaveta do hipocampo cerebral aquela vontade antiga de escrever. Quando eu parei antes do terceiro texto há oito anos, eu travei na falta de uma ideia brilhante, no medo de não agradar ou de passar vergonha. Tanto tempo depois, ficou até fácil refletir sobre o que me travou na época.

Se vou mexer nessa poeira, preciso tirar o “brilhante” da frente e ficar só com a parte da ideias. Mesmo que fique uma grande porcaria, pelo menos eu sei que na prática essa ideia é uma grande porcaria e libero espaço pra outras ideias menos porcarias. É tão cômodo manter as coisas guardadas nas gavetas pra não se frustar e ficar no “e se?”, né?

Meu projeto paralelo nasceu com a nobre intenção de despressurizar da rotina, sem pressão de resultado, mas de registrar uns pedaços legais de vida juntando meus dois afetos de longa data: escrita e viagem. Criei o desdiario de viagem, um laboratório de criatividade, um jardim digital pra exercitar um pouco de escrita, um pouco de fotografia, trocar expêriencias, experimentar umas criatividades.

Comecei em Setembro de 2022 e já aprendi um pouco com o processo. Algumas coisas muito simples do pensamento de produto me fizeram ter disposição suficiente pra criar esse espaço e aos poucos vencer o medo de errar ou passar vergonha (gente, vamos aceitar que isso faz parte da vida? acabei de usar um meme de Procurando Nemo num texto pro Mulheres de Produto).

O mínimo viável

Eu já deixei de divulgar algo que fiz por ter certeza que poderia ser melhor e perdi o registro. De fato poderia ser melhor, mas ficaria pronto, sei lá, quando o meu Athletico Paranaense for campeão do mundo? — ou seja algo que com certeza vai acontecer, mas pode demorar.

Mesmo que ainda não esteja no formato que idealiza, muito provavelmente a ideia engavetada já tem o mínimo que precisa pra ganhar vida. Então, coloque na rua. Meu mínimo foi um texto que me senti bem durante o processo de escrita e curti o resultado. Por conceito ou falta de habilidade, montei um site preto e branco e publiquei o texto.

Os recursos atuais podem ser limitados, mas ainda são bons recursos. Uma idea genial guardada na cabeça é só um devaneio. Como essa ideia vai parecer na vida real?

Experimente & Incremente

Crie o site, publique o texto, compartilhe as ilustrações, troque a plataforma, mude a cor da fonte, perceba que a plataforma inicial era melhor mesmo se arrependa e volte pra ela. Decida divulgar, ou prefira manter só pra ti, mas cultiva teu processo criativo. Pode ser que no meio do experimento surja uma ideia nova, um caminho que mereça ser explorado. Lembra que ideia velha ocupa muito espaço, então abre espaço pras novas.

Desabafo pra você que chegou aqui: ainda passo mais tempo do que gostaria lapidando o que eu faço, mas tenho trabalhado pra encontrar um ponto que o resultado me agrade sem que eu desista dele ou precise voltar 253 vezes. Tento focar na experimentação.

No meu primeiro texto no desdiario eu falei sobre Praga e coloquei vídeos e imagens, no segundo tentei explorar mais descrições sobre a bonitinha Český Krumlov. Do terceiro não gostei muito, só das cervejas que tomei em Pilsen mesmo, mas queria vencer a barreira que parei da última vez. Venci! Publiquei o quarto na sequencia, que é curtinho e amoroso. Hoje migrei os textos pro Substack pra testar um produto diferente que parece legal. Ainda não gosto dos meus títulos, mas eles vão melhorar, o que não vai acontecer tão cedo porque semana que vem viajo de férias. Quem sabe lá pinta o quinto desregistro?

Oito anos depois, embarco numa viagem a trabalho. E ela me serviu de inspiração pra começar. Esse texto mesmo estava engavetado há algumas semanas, mas hoje foi o dia de tirar a poeira. Tocando o processo com leveza a gente vai é muito, muito longe. O que tá guardado na tua gaveta?

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Amanda Scarpin
Mulheres de Produto

product manager, engineer, traveler. love learning how people and products work :)