[Parte 3 — Contratação além do recrutamento]Empowered — Resumo em Português

Letícia Rezende
Mulheres de Produto
10 min readMar 20, 2022

O primeiro livro de Marty Cagan é um pré-requisito para qualquer pessoa ingressando na área de produtos. E, quando Inspired ainda não tinha tradução em português, na expectativa de democratizar o conteúdo no Brasil, fiz um resumo que você pode ler aqui.

Em 2020 os autores de Inspired lançaram Empowered. O novo livro foca no papel e competências da liderança de produto e é tão bom quanto o primeiro.

Já temos a Parte 1, a Parte 2.1 e a Parte 2.2 do resumo de Empowered e agora começamos a Parte 3, falando sobre Contratação, além do recrutamento.

Esse tema pode não parecer tão interessante ou importante à primeira vista, mas existem aspectos importantes em como as boas empresas de produto tratam esse tema, como:

  • Elas contratam pessoas normais, com competência e caráter, e depois as desenvolvem para que elas se tornem membros extraordinários de um time, dando espaço para que elas façam coisas incríveis.
  • Elas enxergam a contratação como algo que vai além do recrutamento.
  • Os gerentes sabem que a responsabilidade sobre a contratação é deles e não do RH.
  • As pessoas investem tempo e esforço continuamente no processo de contratação.

Competência e caráter

A maioria das empresas é obcecada em contratar as melhores pessoas, que estudaram em uma determinada universidade, que têm um vasto conhecimento e experiência, que são consideradas de alta performance. Por sua vez, as melhores empresas contratam pessoas normais que possuem algumas características que as fazem capazes de serem bem sucedidas no papel e as desenvolvem para serem membros incríveis de um time.

Competência

A pessoa deve ter as habilidades necessárias para performar no papel e é responsabilidade do gerente identificar isso durante o processo seletivo. Contudo, não existe nada errado em contratar baseado em potencial, desde que o gerente seja capaz e tenha interesse em desenvolver essa pessoa para atingir a competência.

Caráter

Depois de avaliar competência, as empresas passam a avaliar o “fit cultural”, mas muitas vezes esse conceito não é bem compreendido. Para grande parte das empresas isso significa contratar pessoas que se parecem e pensam como as outras pessoas da empresa, o que, no setor de tecnologia, significa contratar homens com diplomas em áreas técnicas, vindos das melhores universidades.

O que os autores defendem é que essa busca deve ser por pessoas de caráter e não por fit cultural. O ponto é que, pessoas sem caráter serão tóxicas para o time como um todo e contratar pessoas com fit cultural trará somente quem pensa igual, entretanto, para gerar inovação é preciso ter pessoas que pensam diferente. A busca deve ser por pessoas de caráter que tenham diferentes experiências de vida, de estudo e de trabalho.

Recrutamento

Na maioria das empresas o recrutamento começa quando o RH passa a fornecer currículos para o gerente analisar e, consequentemente, o gerente está frequentemente reclamando que não recebe bons perfis.

Por sua vez, os melhores gerentes fazem o contrário, eles identificam o que querem e saem em busca desses perfis eles mesmos, trabalhando em convencer talentos a se juntarem ao seu time.

Mas como encontrar essas pessoas? Construir uma rede de potenciais talentos é um trabalho contínuo que não se começa apenas quando existe uma vaga aberta. Você conhece pessoas em eventos, palestras, em competidores, em visitas a parceiros e clientes, através de indicações de pessoas que confia.

Você pode promover eventos com pessoas renomadas na área para atrair talentos para sua empresa e construir uma boa reputação. Criar um blog da empresa para demonstrar a dedicação dos times em construir bons produtos. Buscar talentos em outras áreas da empresa que estejam interessados em mudar de área.

O ponto chave é: você deve colocar o recrutamento como uma prioridade na sua agenda.

E sobre terceirizar os times de produto e tecnologia? Bom, seu produto é o coração da sua empresa e, portanto, as habilidades de Produto, Design, Tecnologia, Dados, Pesquisa e a liderança dessas pessoas são as competências chave no seu time. Terceirizar partes tão importantes muito provavelmente irá acabar com as suas chances de ter um time de missionários e irá criar times de mercenários. Não é um problema terceirizar para projetos pontuais, mas não torne isso algo contínuo.

Mas o que fazer? Você pode colocar mais investimento em buscar essas pessoas no mercado ou investir nas pessoas internamente dando treinamentos e coach, para que elas evoluam para os papéis necessários.

Entrevistando

Assim como no recrutamento, é responsabilidade do gerente garantir a efetividade do processo de entrevista e a experiência do candidato. É preciso escolher bem as pessoas que participarão do processo de entrevista e garantir que elas entendam quais habilidades e experiência elas terão que avaliar.

Ao final do processo nenhuma pergunta ou questionamento deve ficar em aberto e o gerente que está contratando receberá os feedbacks de outros entrevistadores para que possa tomar sua decisão.

Contratando

Uma vez que você tenha encontrado um bom candidato é hora de fazer a proposta e efetivar a contratação. Muito desse processo será determinado pelo RH, mas existem alguns pontos de responsabilidade do gerente, são eles:

  • Se você encontrar um bom candidato, se mova rapidamente e faça a proposta em até 48 horas ou você poderá perder o candidato e deixar a impressão de que a empresa tem dificuldade em tomar decisões.
  • Valide as referências do candidato você mesmo. O principal aqui é tentar descobrir se a pessoa tem algum comportamento tóxico. Busque ligar para as referências e perguntar se essa pessoa contrataria o candidato novamente. Além disso, procure pelo candidato nas redes sociais e veja como essa pessoa interage com outras. Elas são respeitosas? São rudes? O comportamento dela nas redes provavelmente será um espelho de como ela agirá no trabalho.
  • Feita a proposta, ligue pessoalmente para a pessoa e diga explicitamente que caso ela se junte ao time, você se compromete pessoalmente com o coach e desenvolvimento dela. Se o candidato é realmente muito bom, uma ligação do CEO ou outra liderança sênior também passa uma mensagem interessante.

Apesar da proposta vir da empresa, a contratação é algo pessoal. Para a maioria dos candidatos ter alguém que esteja comprometida em ajudar a pessoa a evoluir é mais importante do que qualquer outro fator.

Quantidade de liderados

É importante que a empresa avalie alguns fatores para determinar a quantidade máxima de pessoas a serem lideradas por um gerente. Nessa avaliação é importante analisar os seguintes aspectos:

  • Responsabilidade operacional — Se o papel do gerente vem também com carga de trabalho operacional como estratégia de produto, de design, de arquitetura, isso irá consumir tempo e deve ser considerado.
  • Experiência dos liderados — Dado o cenário competitivo do mercado por pessoas qualificadas, muitas empresas acabam contratando pessoas com pouca ou nenhuma experiência, investindo em potencial. Isso exige mais experiência e tempo de dedicação do gerente no trabalho de coach, o que resulta na necessidade de um menor número de liderados por gerente.
  • Experiência do gerente — Assim como com qualquer outra habilidade, a de ser coach deve ser desenvolvida e isso deve ser considerado ao determinar a quantidade de liderados.
  • Complexidade organizacional — Dependendo do tamanho e complexidade da empresa, o trabalho de um gerente cresce substancialmente.

Times remotos

O real desafio de um time de produto remoto é como trabalhar e evoluir no processo de Discovery. As técnicas se mantêm as mesmas, mas existe uma mudança na dinâmica entre Product Manager, Product Designer e Tech Lead. Existem três principais pontos que prejudicam essa dinâmica.

Artefatos

No trabalho remoto existe uma tendência que a colaboração deixe de acontecer simultaneamente e as pessoas passem a produzir arquivos e materiais umas para as outras. Toda a discussão se move para entregar tarefas (outputs) e deixa de ser focada em resultados (outcomes). É preciso lutar contra esse padrão e continuar buscando maneiras de discutir em cima de problemas em conjunto através das vídeo chamadas.

Confiança

Inovação depende de segurança psicológica, o que significa que os membros do time se sentem respeitados e que suas contribuições são valorizadas. A importância de não ter pessoas “babacas” no time é não quebrar essa segurança. Infelizmente, em situações digitais algumas pessoas mudam seu comportamento e passam a agir de maneira mais insensível. Felizmente, um bom coach pode ajudar as pessoas a melhorarem nesse aspecto.

Tempo

No trabalho remoto algumas pessoas trabalham de um ambiente sem interrupções, no qual conseguem ser mais produtivas que nunca, enquanto outras têm a casa cheia e gostariam da tranquilidade de ir trabalhar no escritório para conseguir se concentrar. A resposta aqui é ser flexível e buscar acomodar a agenda da melhor forma para possibilitar que as pessoas que não tem tanto tempo de qualidade remotamente consigam estar no seu melhor.

Onboarding

Se chegou até aqui no processo, parabéns por conseguir contratar uma pessoa competente que está pronta para começar a gerar valor como membro do time. Mas vale destacar que seu trabalho como gerente está apenas começando.

Os primeiros três meses de um novo membro do time são críticos e irão determinar o sucesso dessa pessoa na empresa. Alguns checkpoints que ajudam durante esse processo, são:

  • Ao final do primeiro dia — A pessoa fez pelo menos um potencial futuro amigo no time? Ela sabe o que é esperado dela?
  • Ao final da primeira semana — Como foi a semana? Ela conseguiu conhecer, individualmente, cada membro do seu time?
  • Depois de receber o primeiro pagamento — É normal que o colaborador avalie a escolha de ter integrado a empresa nesse momento.
  • Depois do primeiro mês — Nesse ponto a pessoa tem um bom conhecimento da empresa e do seu potencial nela.
  • Após 60 dias — Ela teve alguma vitória que ajudou a estabelecer o valor dela para a empresa?

Não importa o quanto a pessoa seja competente, ela precisará de um tempo para entender sobre os clientes, o negócio, a dinâmica da empresa, criar relacionamentos e se adaptar.

Durante esse período o gerente também irá entender o quão aberta ao coach a pessoa realmente é. Além disso, o líder deverá focar em estabelecer relações de confiança com o liderado, primeiro com ele mesmo, depois com o time, depois com os executivos e stakeholders. Para Product Managers, o onboarding também deve incluir falar com clientes e levantar insights, bem como entender as estratégias de marketing, vendas e os KPI’s da empresa.

Bootcamp para novos colaboradores

Algumas empresas investem em programas como esse com o objetivo de resolver o gap entre a capacidade da pessoa e o que é necessário para que ela tenha sucesso na empresa. O bootcamp consiste em programa de 5 dias intensos na primeira semana da pessoa na empresa.

Todos os dias a programação começa com exercícios focados em crescimento pessoal, como, por exemplo, comunicação, testes de personalidade, teste de habilidades e em construir um plano de crescimento de carreira. Esse foco mostra o quanto a empresa está comprometida com o seu crescimento pessoal.

Em um segundo momento, se entra nos tópicos sobre contexto estratégico. No primeiro dia é falado sobre entender o cliente e como a história da empresa se relaciona com eles. Nesse dia a pessoa entenderá sobre a visão, modelo de negócios e alguns processos de discovery que já aconteceram.

No restante da semana será falado sobre validação, desenvolvimento e priorização, aprendizado, metrificação e go-to-market. Esses assuntos são muito específicos de cada empresa, mas o que é importante é dividir os objetivos e o jeito de trabalhar da empresa.

Depois de passado o contexto, algumas pessoas da empresa são convidadas para contar sobre sua experiência pessoal na companhia. O objetivo aqui é começar a estabelecer relacionamentos e confiança com outras pessoas da estrutura.

Todos os dias após o almoço é feito um workshop no qual os participantes podem aplicar o que aprenderam no período da manhã. Os outros membros do time se juntam e eles tem um espaço seguro para praticar com a supervisão da liderança.

A curva de aprendizado sobre como trabalhar em conjunto é encurtada, economizando tempo. Além disso, o bootcamp reforça a cultura de aprendizado e crescimento, colocando a pessoa pronta para começar a jogar o jogo.

Avaliações de performance

Na maioria das empresas existem avaliações anuais de performance com o objetivo de manter o compliance e fazer a administração de remuneração. Porém, é importante que o gerente entenda que essa nunca deve ser a fonte principal de feedback para o liderado. Às 1:1 ‘s semanais são o ponto principal para feedbacks construtivos, sendo assim, o que aparecer na avaliação anual não deve ser uma surpresa para nenhum dos lados.

Demissão

Essa é a parte mais chata de ser gerente, mas você deve considerar o impacto de manter uma pessoa que não está performando e se desenvolvendo no time. Existem duas situações principais no que tange a demissão de pessoas do time.

A primeira(e mais comum) é quando o funcionário simplesmente não performa no nível de competência necessário, nesse cenário é recomendado investir de 3 a 6 meses de coach intenso com a pessoa. Durante esse tempo é preciso trazer transparência, clareza e urgência sobre a ausência de progresso durante as 1:1’s semanais. Para esse caso, existe uma responsabilidade do gerente e é interessante que a pessoa seja ajudada a buscar uma posição que faça mais sentido para suas habilidades e características, seja na empresa ou não.

A segunda situação é quando o funcionário demonstra ser uma pessoa tóxica, com problemas sérios de comportamento, que fere a empresa e as pessoas ao seu redor. O difícil sobre esse cenário é que a pessoa pode ter tido um dia ruim ou estar passando por algum problema pessoal que impacta no seu humor, então é preciso avaliar se essa é uma situação temporária ou um problema real. Ainda sim, de três a seis meses com esse problema é o suficiente para tomar a decisão de corrigir o curso e proteger os outros membros do time, independente do quão boa as outras habilidades daquela pessoa são.

Promoção

Essa é a melhor parte e a maior evidência do sucesso de um gerente, afinal é o resultado de uma boa avaliação e um plano de coach bem executado, por ambas as partes. Uma vez que a pessoa tem uma direção de quais aspectos precisam ser evoluídos e consegue atingir seus objetivos, é a vez do gerente de não medir esforços para conseguir a promoção que a pessoa deseja.

Mas atenção, para que esse momento seja satisfatório é preciso saber as aspirações de carreira de cada pessoa para saber se ela gostaria de continuar sendo um contribuidor individual ou mover para uma posição de liderança.

Aqui fechamos a parte 3 do livro, com algumas dicas de como tratar cada parte do trabalho de recrutamento e gestão de time. Se você ainda não leu a Parte 1, Parte 2.1 e a Parte 2.2, aproveite para se inteirar antes da próxima parte sair, ein?!

Fico feliz que você tenha chegado até aqui e te espero na próxima parte, na qual vamos falar sobre como criar, compartilhar e validar a visão de produto, bem como os princípios que vão orientar os times de produto durante a execução do trabalho.

Obrigada e até breve.

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Letícia Rezende
Mulheres de Produto

Não me lembro de um momento qualquer que um caderno e uma caneta não me acompanhassem pelas loucuras da vida.