Product Manager de Jogos: como é ser o Player 1

O que tenho aprendido depois que apertei o "start"

Roberta Alanna Oliveira
Mulheres de Produto
6 min readApr 4, 2019

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Embora o povo brasileiro seja conhecido por sua relação com o entretenimento, o mercado brasileiro de jogos não é exatamente vasto - mas está crescendo muito.

Segundo pesquisa da Newzoo, o Brasil tem o maior faturamento do setor na América Latina e o décimo terceiro do mundo. E, segundo pesquisa recente da Pesquisa Game Brasil 2018 (PGB), cerca de 75% dos brasileiros consomem jogos eletrônicos - dispositivos móveis lideram consistentemente como a plataforma mais utilizada.

Por isso, ser Product Manager numa empresa de jogos para celulares no Brasil torna tudo mais especial e desafiador. Frequentemente me perguntam "como é trabalhar com jogos?", então pretendo compartilhar as minhas impressões a seguir.

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COMEÇOU O JOGO: VOLTE TODAS AS CASAS

Quando comecei na Gazeus Games, tive que me desafiar pessoalmente logo de cara já que nunca tive intimidade com videogames. Logo pensei: como conseguiria "vestir o chapéu" do meu cliente assim? Sempre representei aquele estereótipo da garota que aperta todos os botões, perdida, na hora de jogar e isso estava longe do que eu imaginava ser o meu usuário final.

Com isso, cometi o erro mais básico de um Product Manager e tirei o meu cliente por mim... Falhei. Partindo desse princípio, imaginei que o público seria majoritariamente masculino e jovem. E aí veio a primeira grata surpresa:

Segundo a pesquisa da PGB 2018, mulheres representam 58,9% dos jogadores do Brasil, se afirmando como a maioria há três anos consecutivos - e elas preferem jogar no celular.

No mesmo "pacote das conclusões precipitadas", imaginei que jogos clássicos - especialidade da Gazeus -, não teriam um espaço significativo no mercado e que ficariam muito atrás de categorias como RPG, Estratégia e Casuais. E aí veio outra grata surpresa:

Ainda na mesma pesquisa, cerca de 35% dos jogadores declararam consumir jogos de cartas.

Então, sem muita demora, aprendi que precisaria me despedir de todos os meus achismos e começaria do zero no maravilhoso mundo dos jogos. Mas, assim como em outros setores, se você estiver disposto a se colocar no lugar dos seus clientes para ser um bom Product Owner, o resto você aprende conforme for passando de fase.

LUZ, CÂMERA… AÇÃO?!

Falando em Product Owner, quando fui contratada na Gazeus, eu tinha meu escopo de atuação muito claro na cabeça. No entanto, pouco tempo depois fui à GDC (Game Developers Conference), um evento gigante do mercado de jogos, e voltei com uma espécie de crise existencial. Lá, assisti a uma palestra interessante a respeito do papel do Producer versus o papel do Product Manager.

No final da palestra, percebi que ninguém citou o Product Owner e fiquei um bom tempo digerindo a “inexistência” do meu papel nesse mercado. Ok, Product Owner é uma função muito ligada à metodologia SCRUM mas até então nunca tinha sido jogada para escanteio. Demorei um pouco para digerir e identificar a lacuna. Explico em seguida.

Pode não parecer óbvio mas jogos e Cinema têm muita coisa em comum. Em geral, jogos são produções complexas que envolvem recursos muito conhecidos da sétima arte como: narrativa, personagens, música, efeitos sonoros e progressão (clímax e complicação). Não à toa, a ferramenta Unity é amplamente utilizada para produzir conteúdo em ambos setores.

Por isso, o mercado de jogos absorve muitos termos e funções do Cinema. Produtor(a), Artista, Diretor(a) de Arte… São profissões do Cinema e do mercado de jogos também. O Game Designer, na minha opinião, se assemelha muito ao Roteirista, que garante uma narrativa coesa, interessante, balanceada com uma progressão que seja atrativa e dinâmica.

Dadas as semelhanças, consegui entender melhor tudo que foi falado sobre o Producer na tal palestra. Assim como no Cinema, o papel dessa pessoa é garantir que tudo saia como planejado, nos mínimos detalhes, com o menor custo possível e, claro, dentro do prazo acordado.

Você pode ter pensado que isso se parece muito com Product Owner, certo? Bom, mais ou menos. Por definição, o Product Owner é o dono de tudo que envolve o negócio - métricas, faturamento, futuro do produto, demanda dos clientes e afins - mas também é responsável pela parte mais prática, como gerenciar backlog, roadmap, entregáveis, etc. Então, no mercado de jogos, essa função se divide em duas: Producer e Product Manager. Segundo a palestra, tudo que tem a ver com o negócio é responsabilidade do Product Manager exclusivamente. Ou seja, o Product Manager é uma figura mais próxima do que seria o Produtor(a) Executivo no Cinema.

No entanto, atualmente, as funções se misturam muito no meu cotidiano já que cuido de um jogo clássico, que não conta com diversos recursos de Cinema que citei acima.

Então, diariamente preciso me adaptar às necessidades do jogo e do mercado e, assim, reinventar os limites das funções pra entregar o Buraco Jogatina que meus jogadores merecem.

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O DETALHE FAZ A FORÇA

A oferta de jogos para celulares é quase infinita. Sério. Todos os dias tem um jogo novo nas lojas, nos canais dos digital influencers… no seu celular. Então, o que fazer para inovar sendo um jogo clássico de cartas? Ganhe seu cliente no detalhe - ou pelo menos não o perca pela mesma razão.

A rotina de todo mundo está cada vez mais agitada, então conseguir que uma pessoa invista seu tempo livre para se divertir com o seu produto é uma honra. Ao contrário de diversos produtos digitais, jogos estão no dispositivo do seu cliente para entretê-lo. O jogo não faz transferências bancárias, não envia mensagens, não faz ligações, não exibe fotos dos seus amigos… O jogo está ali para divertir e nada mais. Se não cumprir essa missão de forma muito fluida, bye-bye.

Substituir um jogo por outro é muito fácil e, por não ser um serviço de extrema necessidade para o seu cliente, gerenciar um jogo digital é viver na corda-bamba. A menos que o jogo tenha uma comunidade de fãs e jogadores muito sólida e leal, qualquer falha pode representar um escorregão considerável para suas métricas.

Música, efeitos sonoros, animações, paleta de cores, formato dos botões… Tudo isso parece dispensável e muitas vezes sequer faz parte de produtos digitais como aplicativos de bancos ou redes sociais, certo? Pois é. Assim como num filme, o jogo deve ser capaz de despertar sensações que nem o usuário consegue identificar. Por isso a relevância tão grande do detalhe. O ponto alto da experiência do seu jogador pode estar no tom da música naquele momento complicado do jogo ou naquela recompensa que ele ganhou depois de muito esforço.

Num jogo, é o detalhe que faz toda diferença na experiência do seu cliente e na vontade que ele vai ter de voltar no dia seguinte. Se não for divertido, não faz sentido e geralmente você só tem uma chance.

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EM RESUMO…

Entender o que é o mercado de jogos, suas peculiaridades e semelhanças com áreas correlatas, me fez absorver melhor diversos passos no processo de criação de um jogo - bem como papéis e escopos necessários para fazer um produto de qualidade. Além disso, posso afirmar que venho desapegando de rótulos como Product Owner ou Product Manager e estou cada vez mais focada na função e responsabilidade do papel, em como posso ajudar mais e melhor meu time e meus clientes independente do nome da função.

Essa jornada me trouxe um olhar mais refinado tanto para o meu produto, quanto para o meu cliente. Não refinado de sofisticado, mas de observador, detalhista, meticuloso. Também me fez absorver, de uma vez por todas, que nós sempre temos algo novo a aprender e que é justamente essa novidade constante que torna a vida de Product Owner/Producer/Product Manager tão instigante!

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Roberta Alanna Oliveira
Mulheres de Produto

Product Manager apaixonada por investigar e solucionar problemas conhecidos ou invisíveis! :)