Quando finalmente entendi que ser ágil vai muito além de conhecer metodologias

Graciela Banegas
Mulheres de Produto
7 min readSep 25, 2018

A primeira vez que tive contato com os métodos ágeis, mais especificamente o SCRUM, foi em 2006, na primeira empresa em que trabalhei.

Ainda estávamos descobrindo como trabalhar com agilidade, mas dentro de uns meses, o desenvolvimento já estava estimando através de planning poker cards, as dailies faziam parte da rotina e foram instalados os kanbans pela empresa. Éramos ágeis! Bom, pelo menos a gente achava que era.

Doze anos depois, cá estou eu como Product Manager tentando mostrar aos times com os quais trabalho, que ser ágil vai muito além de conhecer e aplicar as metodologias e frameworks.

E não entendam errado, conhecer os métodos ágeis é indispensável. Mas eles são as nossas caixas de ferramentas, ponto final. No dia a dia das equipes de desenvolvimento é preciso ir além e saber adaptar, para entender onde e quando tais ferramentas podem ser utilizadas. E aí entra a questão da mudança de perspectiva — ou como está na moda, mindset :p.

Na maior parte do tempo, temos a necessidade fazer entregas “perfeitas” e das quais a gente se orgulhe. O problema é que isso acaba saindo caro demais, principalmente porque a vida é cheia de imprevistos e ela nos exige o tempo todo adaptabilidade.

Portanto, o que aprendi ao longo desses anos, é que um mindset ágil carrega 5 características fundamentais:

1- MAPEAR AS REAIS NECESSIDADES

Mapear as reais necessidades não é uma tarefa simples. Já cometi o erro de achar que estava trabalhando em cima de uma necessidade muito importante, mas na verdade o problema que precisava ser resolvido era outro. Quem nunca?

Nesse ponto, a palavra chave é problema. Pode parecer óbvio dizer isso, mas a primeira tarefa é entender o problema a fundo, procurar a causa raíz e identificar o principal ponto de dor do cliente/usuário — que muitas vezes nem ele mesmo sabe. Parece simples, mas acredite, a tendência é analisarmos a situação superficialmente e partir logo pra solução!

Não é atoa que “só” para esse fim contamos com uma série de frameworks e métodos, como as inceptions, value stream mapping, design thinking, jobs to be done, entre outros que nos auxiliam nesse processo de identificar as reais necessidades.

Outro ponto super importante é conhecer seu usuário de verdade. Você precisa entender para quem você está solucionando o problema. E nesse processo de identificar para quem estamos trabalhando, tem ferramentas como as personas, canvas de proposta de valor, mapa de empatia, jornada de usuário, entre outras.

Em resumo, entender a importância de identificar as necessidades reais, determinam o sucesso de uma iniciativa. E isso só é possível, conhecendo a fundo quem usa seu produto e identificando a causa raíz dos problemas. Se pra isso será usada uma inception, design thinking, etc. São detalhes, basta abrir a caixa de ferramentas e escolher o que vai usar. Mas antes de tudo, é indispensável entender por quê e para quê você precisa delas.

“You’ve gotta start with the customer experience and work backwards to the technology. You can’t start with the technology and try to figure out where you gonna try to sell it.” — Steve Jobs

2- TRABALHAR EM EQUIPE, CONHECER SEU TIME E ENTENDER A IMPORTÂNCIA DISSO

Trabalhar em equipe não é fazer parte de uma squad e esperar que o restante simplesmente se integre magicamente ao que você está fazendo, é você confiar que seus colegas estão junto com você engajados pelo mesmo objetivo e contribuindo para a mesma causa tanto quanto você.

A palavra chave aqui é confiança porque um dos principais pilares dos métodos ágeis é a comunicação. E promover discussões em cima de ideias entre pessoas que não confiam umas nas outras dificilmente serão ricas e produtivas.

Cada vez mais as empresas têm notado a importância de valorizar a diversidade. Mas trabalhar com pessoas muito diferentes, significa que haverá muitos pontos de vista para serem levados em conta e conciliados. Esse é um dos principais pontos que nos levam à co-criação, e a produtividade desse processo é maximizada em equipes que se comunicam de forma clara e que têm um ambiente seguro que propicia essa comunicação.

Como Product Manager, meu papel é garantir que a entrega de valor aconteça, portanto, acredito que faz parte do meu papel ser uma facilitadora ativa desse processo todo. Se a gente parar pra pensar em como a mente humana funciona, de forma muito resumida, a análise acaba sendo a seguinte:

Portanto todo o trabalho desse processo, se resume a ajudar o time a criar vínculo e facilitar para que todos se conheçam. Assim, ao fazer uso de brainstorming, plannings, reviews, restrospectivas, coding dojôs e por aí vai, todo o resto flui com maior facilidade e as chances de criar uma equipe de alta performance aumenta. Entender isso, pra mim foi uma virada de chave e já abordei esse assunto no Agile Trends Floripa em 2017.

“A team is not a group of people that work together. A team is a group of people that trust each together.” — Simon Sinek

3- ENTENDER O CONTEXTO E SE ADAPTAR

Toda iniciativa começa com um planejamento lindo e a gente tende a se iludir que tudo sairá conforme o script. O grande detalhe é que quase nunca isso acontece. Quando iniciei minha carreira na gestão de produtos, aprendi o significado real de jogo de cintura e adaptabilidade.

Ao longo do ciclo de desenvolvimento, sempre tem aquele probleminha que a gente descobre e que se desmembra em mais 20 outros. Sempre vai ter aquele momento em que a direção da empresa descobre que as metas precisam mudar ou que entrou algo urgente no caminho, enfim, não adianta. Imprevistos acontecem e sempre irão acontecer.

O melhor é entender que faz parte do jogo e que a gente pode gastar energia se irritando, reclamando ou ficando frustrado porque as coisas não saíram como planejado, ou podemos direcionar as energias tentando encontrar soluções e caminhos possíveis que funcionem para todos. Não adianta, é entender o contexto, negociar, aprender com tudo aquilo que deu errado, se adaptar e replanejar.

“In fact, in an Agile project, technical excellence is measured by both capacity to deliver customer value today and create an adaptable product for tomorrow.” — Jim Highsmith

4- REALIZAR ENTREGA DE VALOR CONTÍNUA

Acho que esse é um dos pontos onde mais demorei em acertar. E ao meu ver é o ponto crucial para você ser ágil ou não. Quebrar as entregas e ir iterando, parece óbvio, parece fácil, mas por algum motivo a gente falha. Na minha trajetória, um dos principais pontos de falha foi confundir Integração Continua (CI) com Entrega Contínua (CD).

Um produto não gera receita enquanto não estiver sendo usado. Ele só pode ser considerado entregue, depois de estar nas mãos dos usuários. E como estamos carecas de saber, o ideal é que a entrega de software seja um processo confiável, previsível, altamente automatizado e visível, estes princípios vem da integração contínua, mas ela é apenas um pedaço do que é a entrega contínua.

A entrega contínua, exige comunicação rápida aos usuários, gerenciamento de versões, reversão rápida se algo falhar e estratégias para minimizar os impactos na experiência do cliente. É de fato entregar, medir, acompanhar e garantir que aquela entrega agregou valor e resolveu um problema real ao usuário.

5- BUSCAR SIMPLICIDADE

Um ponto importante que está totalmente associado ao tópico anterior é a busca pela simplicidade nas soluções que apostamos. E isso não se limita apenas às interfaces. Vai muito além, na verdade é um modo de pensar.

Muitas vezes acabamos escolhendo um “canhão” para matar uma mosca. Desenvolvemos soluções complexas, para solucionar algo que poderia ter uma abordagem extremamente simples. Porque fazemos isso? Eu justificava muita vezes pela falta de tempo, porque buscar soluções simples, acredite, dá trabalho.

Buscar soluções simples, exige muito trabalho em equipe, afinal o problema acaba sendo analisado por vários pontos de vista. Exige conhecer o usuário, exige uma equipe engajada a ponto de questionar e apontar melhorias nas soluções propostas, exige profundidade em todos os sentidos. E muitas vezes, somos superficiais demais do inicio ao fim: na análise que vê apenas a ponta do iceberg, na proposta de solução que muitas vezes é paliativa, na execução que desencadeia retrabalhos e impedem as entregas continuas.

Simples não é o mesmo que fácil. Pensar simples exige estudo, análise, discussões, revisões, como eu disse, dá trabalho.

“When you first start off trying to solve a problem, the first solutions you come up with are very complex, and most people stop there. But if you keep going, and live with the problem and peel more layers of the onion off, you can often times arrive at some very elegant and simple solutions.” — Steve Jobs

Para encerrar...

Se pararmos para analisar com calma os tópicos acima, eles falam basicamente da essência do que está no manifesto ágil. Mas numa rotina de pressão, a gente tende a se apegar ao que é mais concreto e palpável, que são as metodologias e frameworks. O problema é que ao fazer isso, estamos longe de sermos ágeis. Significa apenas que somos bons executores de métodos e eles só serão eficazes, quando entendermos o contexto, quando a gente souber quando usá-los e muitas vezes, quando soubermos adaptá-los de acordo com cada situação.

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Graciela Banegas
Mulheres de Produto

Group Product Manager | Facilitator| Love People &Technology