Amor em fuga

Mulheres que Escrevem
Mulheres que Escrevem
3 min readOct 18, 2018
Capa de “sobre as linhas extintas”, publicado pela Editora Urutau

Elena Ferrante escreveu que “os indivíduos e as cidades sem amor são um perigo para si mesmos e para os outros”. Sobre as linhas extintas é um livro em movimento que traça muitas linhas para além dos itinerários nunca fixos do coração: lacunas, desvios, interrupções, desencontros, cruzamentos. Nestes poemas, somos conduzidos por uma massa de percepções (visuais, sonoras, verbais, afetivas) que nos atravessa enquanto lemos este livro atravessado pela experiência do amor e da cidade.

Gilles Deleuze e Felix Guattari usaram o conceito de rizoma — um sistema acentrado que muda de natureza a cada nova conexão — para evidenciar que o livro é uma estrutura de interpretações e leituras infinitas, em constante movimento. Sobre as linhas extintas é um livro em movimento que traça muitas linhas para além dos itinerários confusos e nunca fixos da frota de ônibus da cidade do Rio de Janeiro. Na leitura que faço desse romance breve, um poema-narrativo feito de várias peças de encaixe, observo como Taís Bravo captura os resíduos da experiência amorosa tendo como paisagem uma cidade sempre em fuga, em mutação.

Os poemas de Taís disparam em mim uma afinidade imediata, uma espécie de espelhamento das coisas que vivi quando tinha 20 anos. Gosto, sobretudo, do jeito como experiência, percepção e desejo se articulam em torno de objetos saturados/densos, mas ao mesmo tempo simples em sua enunciação. Ao ler esses poemas, tenho a impressão de que escrever e pensar, escrever e falar, escrever e sentir são operações simultâneas. Mas como também escrevo poemas, sei que essa sensação é apenas um efeito de simultaneidade: viver, sentir, pensar e escrever quase em tempo real é possível? E é justamente esse efeito construído conscientemente que revela a singularidade e a potência desse livro: sua energia, sua força, seu sopro, aquilo que chega até mim enquanto leitora — rápido/passageiro/uma brisa — e me emociona, me comove, me desloca no tempo e no espaço porque todo leitor é “também um sistema acentrado que muda de natureza a cada nova conexão”, a cada poema-verso-página.

Ao longo do livro, Taís constrói as pistas do próprio método, revela com delicadeza, ironia e sutileza a artesania que compõe seus versos, seu campo de interesse: o amor sempre em fuga, como as linhas de ônibus, como essa cidade monumento-catástrofe, como nós mesmas escavando com as mãos o deserto que nos habita.

O lançamento do livro “sobre as linhas extintas” será nessa sexta-feira, dia 19, a partir das 19h, na pizzaria La Carmelita. Para saber mais sobre o evento, horário, endereço, acesse o link do Facebook e confirme sua presença!

(foto: Bianca de Sá)

Flávia Péret é escritora e professora de literatura. É mestre em Estudos Literários pela UFMG e estudou Literatura Latino-americana na Universidade de Buenos Aires (UBA). Participou do programa Rumos de Literatura, na categoria Crítica Literária (2010/2011), promovido pelo Itaú Cultural e foi vencedora do Prêmio Folha Memória — Programa de Orientação de Pesquisa em História do Jornalismo Brasileiro, organizado pelo jornal Folha de São Paulo (2010). Publicou os livros História da Imprensa Gay no Brasil (Publifolha, 2011), 10 Poemas de Amor e de Susto(Edição independente, 2013) e A outra noite (Edição independente, 2015). Desde 2009, atua como arte-educadora no campo da palavra e suas interseções com a imagem.

Esse texto foi publicado na iniciativa Mulheres que Escrevem. Somos um projeto voltado para a escrita das mulheres, que visa não só debater questões da escrita, como dar visibilidade, abrir novos diálogos entre nós e criar um espaço seguro de conversa sobre os dilemas de sermos escritoras. Quer saber mais sobre a Mulheres que escrevem? Acesse esse link, conheça nossa iniciativa e descubra!

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