Escrevendo juntas, uma carta de Natasha Ísis e Taís Bravo.

Taís Bravo
Mulheres que Escrevem
3 min readApr 23, 2016

Eu e Natasha nos conhecemos em 2005, tínhamos 14 e 13 anos respectivamente. Ela diz que só fomos nos tornar amigas mais tarde, em uma viagem do colégio, mas eu conto desde o início. Sei que aos 15 anos nós duas estávamos determinadas a nos tornar escritoras. Eu larguei a Meg Cabot, comecei a me aventurar pela Literatura de Verdade ou seja, Saramago, García Marquez, Orwell, entre outros autores- e escolhi Natasha como minha revisora oficial. Então ela olhava meus caderninhos e dizia “isso é muito clichê”. Foi aí que começou nossa parceria. Muita coisa aconteceu nesses dez anos, mas nosso desejo e amizade persistiram. Agora ela escreve para o El País e eu sou uma das autoras do livro da Capitolina. Ainda assim, não ousamos nos identificar com o que queremos ser: Escritoras. Parece um abuso ou uma fraude dizer que somos escritoras, ainda que o ofício da escrita seja o que norteia nossa vida há tanto tempo. Conversamos sobre esse receio ao longo dos anos, em bares e ônibus, atualmente via áudios no Whatsapp e emails desesperados. Poderia ser apenas uma confissão entre amigas, mas o problema parece coletivo.

Publico em meu Medium um desabafo sobre minhas dúvidas em relação ao meio editorial/literário. Má me manda uma inbox, porque compartilhamos os incômodos. Milena também me diz que sofre com as mesmas crises e que, por isso, há anos tem dificuldade para escrever. Posso contar mais umas cinco amigas -de diferentes áreas- que sofrem com dúvidas, complexo de fraude e insegurança. Um sofrimento que muitas vezes nos paralisa ou, no mínimo, poda nossa produção. Natasha, por exemplo, não assume que jornalista também é, sim, escritora. E eu acho que escrever para três publicações construídas por mulheres faz com que minha profissão seja ser feminista e não escritora — e é claro que há gente estúpida o suficiente para concordar com minha autodepreciação.

Essa Newsletter não pode nos salvar de nossas próprias angústias, mas é um movimento para que elas se tornem públicas. Principalmente, é um modo de continuar escrevendo e de transformar essa escrita em um trabalho coletivo.

Quando eu e Taís nos conhecemos naquele colégio de cores frias dez anos atrás, o que nos aproximou foi o desejo de escrever. Gilmore Girls também, claro, mas tudo faz parte do mesmo contexto. Acontece que já naquela época não tínhamos muita certeza sobre o que significava isso de querer viver da escrita ou pelo menos viver escrevendo.

Os anos passaram e as incertezas só fizeram aumentar. Por sorte, assim como as dúvidas, nossos questionamentos cresceram e chegamos à conclusão de que há todo um ambiente que faz com que nós, mulheres, duvidemos mais de nossas capacidades quando se trata de um ofício que pede um certo exercício do ego.

A quantidade de escritores homens reconhecidos pelos seus trabalhos é imensuravelmente superior a de mulheres. Nas redações, quando uma mulher chega a um cargo de chefe de seção é porque ela é “durona”, um desses adjetivos que são usados para suavizar a ideia de que para chegar a um posição de diretora uma mulher tem que ter qualidades masculinas.

É impossível não se revoltar com todo esse meio. No entanto, é mais díficil ainda não se deixar influenciar por ele. Tenho uma grande certeza de que a Taís poderia ser a escritora da nossa geração. Ela fala sempre que eu tenho sucesso na minha área. A gente duvida é de nós mesmas. Todas essas inseguranças que a gente mencionou chegam sem avisar, no meio da noite ou pouco antes de entregar um texto. Perdi a conta das vezes em que meu coração disparou quando entreguei uma reportagem para um editor, apesar de saber que tinha feito bem o meu trabalho até poucos minutos antes.

A parte boa de tudo isso é encontrar em outras mulheres um alívio pela identificação. Compartilhar as dificuldades, as angústias e, principalmente, as conquistas, é o caminho para continuar nesse projeto coletivo de viver escrevendo, coisa que eu e Taís começamos lá naquele colégio de cores frias. E agora com essa newsletter podemos envolver mais gente no processo e, quem sabe, ganhar um pouco mais de espaço para outras mulheres que escrevem.

Nosso desejo é que esse espaço seja uma troca de cartas entre mulheres que escrevem. Queremos expor nossas dúvidas e inseguranças, acreditando na confissão como um meio de se libertar. Mas também gostamos da ideia de compartilhar nossos processos criativos, ensaios, contos, relatos inventados ou reais. Principalmente, pedimos que vocês escrevam junto com a gente. Vamos?

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