Mulheres que não escrevem

Lorena Pimentel
Mulheres que Escrevem
4 min readAug 19, 2016
Ilustração: gg (ohgigue)

Em um mundo ideal, sou uma escritora. Sento todos os dias no meu computador (ou, se estivesse me sentindo adepta da imagem mental de escritores, pego meu Moleskine) e escrevo palavras geniais, uma ficção bem criativa que vai me deixar confiante a respeito das minhas habilidades. Nesse mundo fantástico, quando tenho bloqueios criativos, eu tenho um momento de epifania ao conhecer alguém novo, me apaixonar, ter uma tragédia pessoal, seja o que for, e aí só acabo escrevendo coisas mais geniais ainda.

Mas isso, amigas, é o fantástico universo da nossa imaginação (e alguns filmes um pouco fora da realidade). A verdade é que eu, honestamente, mais não escrevo do que escrevo. Existem várias razões pra isso e é sobre a minha não-escrita que quero falar hoje.

Tem o clichê da falta de tempo. Que é um clichê justamente por ser a grande realidade de todas as pessoas. Eu conversei com uma amiga escritora (a Helena) sobre essa ideia estranha que temos do que é ser escritor. Ainda imagino uma pessoa que não estuda, não tem outro trabalho e pode passar o dia se dedicando a melhorar a escrita. Mas na realidade não é assim. Eu, nesse momento, estou focada no meu TCC (porque a vida universitária e seus prazos não permitem muita energia criativa sobrando). Há quem trabalhe oito ou mais horas por dia, as pessoas têm família, amigos, contas pra pagar. A figura do escritor que se dedica a escrever o que quer o tempo todo é um mito (até porque só uma pessoa muuuuito privilegiada vai ter essa chance).

Mas o que tem me deixado mais longe da escrita ultimamente é a insegurança. Eu analisei um período da minha vida um grande bloqueio criativo e percebi que tenho dois tipos de insegurança em relação ao que escrevo: a narcisista e a autocrítica comparativa exagerada.

Explico: quando falo de uma insegurança narcisista, quero dizer quando passo muito tempo pensando no que eu mesma estou trabalhando. Aquela coisa de estar focada em um projeto, não conseguir pensar em mais nada e aí começar a olhar tanto para aquilo que encontra muitos defeitos, sabe?

E eu acho isso narcisista porque, apesar de obviamente significar ter uma visão negativa de mim mesma, também significa que estou levemente obcecada comigo mesma (ou com o meu trabalho, que seja). É quando eu tento escrever uma história, mas não consigo tirar ela da cabeça o dia todo (e achar plot holes); é quando estou entregando um texto jornalístico e reviro os olhos para as perguntas que eu mesma fiz a um entrevistado. É atrasar um texto e decepcionar alguém que precisava disso e eu prometi porque fiquei tão obcecada e perfeccionista que simplesmente não consegui fazer fluir.

E a autocrítica comparativa exagerada é meu apelido chique pra algo meio feio de dizer: inveja. Mas juro que não é algo tão feio assim: não digo inveja do mal, que desejo ruim pra pessoa. Muito pelo contrário, em geral minha inveja é de pessoas que gosto e admiro. Como eu disse aí em cima, tenho mania de ficar obcecada com o texto que estou escrevendo. Aí, quando abro os olhos para as coisas ao meu redor, começo a me sentir incapaz.

Eu leio blogs de amigas, acompanho escritoras que gosto nas redes sociais, leio um monte de livros e reportagens e tudo que tiro disso é: nunca vou conseguir fazer algo tão bom. É aquilo que a Amanda Palmer me apresentou como síndrome de impostor: uma hora vão descobrir que sou uma fraude e todos vão notar. E, quando você se sente assim, é bem difícil querer mostrar algo que escreveu.

Em uma pequena enquete informal feita no grupo da equipe da Pólen, eu percebi que não é incomum se sentir assim. Muito pelo contrário, alguns dos meus sentimentos foram ecoados quase ipsis litteris por amigas (bastante irônico, considerando que a escrita delas é o que me desperta esses sentimentos ruins). O que eu não sei é como resolver. Ou se tem resolução, na verdade. Como lidar com essas barreiras que nós mesmas ajudamos a erguer?

Ainda não sei. Mas acho que precisamos falar mais sobre isso, porque talvez a chave seja ajudarmos umas as outras. Por isso fiz esse texto, aliás: vocês também se sentem assim?

Lorena Pimentel

Paulistana que preferia ter mar, entusiasta do entusiasmo, Grifinória com medo de altura, defensora de orelhas pra marcar livros, não gosta de açúcar e uma eterna vontade de ter nascido Rory Gilmore. Editora da Revista Pólen: http://revistapolen.com/"

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Lorena Pimentel
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