Quando é muito cedo para amar alguém?
Quando é muito cedo para amar alguém? Existe alguma hora em que é mais razoável? Eu precisava saber, antes de me declarar. Porque suponho que amo, e não sei se é preciso, para amar, algo além da suposição.
Não acho que é preciso qualquer prova. A pista do amor já é indício suficiente, afinal, provas não provam realmente, porque às vezes são só elas que sobram, quando nem se tem mais amor. Sobra a carta, o registro da ligação, a joia, o filho. Amor mesmo fica livre para se desligar da prova e se desliga, como bem sabemos.
Eu quero saber se tem hora não porque pretendo esperar o momento perfeito, mas porque não posso falar no momento errado. Esse sentimento que cresce, que acho que é amor, não pode ser confundido com outra conversa. Não dá para falar dele como quem falasse sobre o que vai pedir para o jantar. Não dá para deixar esse assunto se diluir com qualquer coisa. É necessário encontrar o momento de dizer.
Eu não “acho que é amor”. Eu sei. Por isso mesmo sinto amar. Não fosse certeza, não seria intenso e profundo e agarrado nessa profundeza. É um mergulho. Um corpo pesado que cai macio, sem impacto, cavando na água seu lugar. É amor, sim. É grande.
A questão é: será que não é ainda muito recente? Será já a hora de amar? Não pode ser um gostar com paixão, um cuidar com paixão, um respeitar mesmo na raiva (e, porque com raiva, com paixão)? É possível que seja só isso, por enquanto. Mas isso é já amor em criação. E, meu Deus, quando que essa criação vinga a ponto de eu poder dizer que amo?
Eu já pensei que estivesse com medo de falar e não ouvir o mesmo, mas não é isso. Eu já não ligo de não ouvir. Me consome é essa vontade de falar sem saber quando é a hora.
Falar que ama pela primeira vez é muito importante, assim como qualquer primeira vez, porque não há maneira de refazer. A inauguração é uma só.
Fica revelada a vulnerabilidade, o peito aberto sem nenhum escudo, pronto para transbordar e esvaziar. Fica a dúvida. Fica a questão permanente: será que eu poderia esperar um pouco mais? Nunca ninguém vai saber.
*Autora do texto: © Valéria Cunha dos Santos (2020).