Fontes e interpretações da política externa brasileira pela obra de Roberto Simon
Rogério de Souza Farias
Resumo: O artigo apresenta uma avaliação da obra de Roberto Simon, O Brasil contra a democracia: a ditadura, o golpe no Chile e a Guerra Fria na América do Sul (São Paulo: Companhia das Letras. 2021).
Palavras-chaves: Salvador Allende; Chile; Política externa brasileira.
Keywords: Salvador Allende; Chile, Brazilian foreign policy.
O período que vai das eleições de Salvador Allende (em setembro de 1970) até a ascensão do general Augusto Pinochet, no Chile, é o pano de fundo de grande parte da obra de Roberto Simon, O Brasil contra a democracia: a ditadura, o golpe no Chile e a Guerra Fria na América do Sul (São Paulo: Companhia das Letras. 2021). Argumentarei, nessa resenha, que o livro é um marco no estudo sobre a dimensão internacional da ditadura brasileira, sendo bem-sucedido em demonstrar que o Brasil tinha sério interesse numa mudança de orientação doméstica e internacional no Chile, foi apoiador da junta militar desde o primeiro momento e teve agentes da repressão brasileira no mínimo presenciando sérias violações de direitos humanos em Santiago logo após o golpe. Mais importante, a diplomacia profissional esteve profundamente envolvida nessa dinâmica. Por outro lado, ainda carecemos de evidências para demonstrar que o Brasil se envolveu ativamente no processo de derrubada de Allende e que o país tenha capacitado chilenos em atividades de tortura.
O primeiro ponto a ser examinado é a tese do autor de que foi “montada uma impressionante máquina civil-militar de vigilância da diáspora no Chile” (p. 20). Ele data a origem desse esquema no Uruguai, após o golpe de 1964 (p. 337), e afirma que esse know-how foi “testado e aprimorado” em Santiago antes de ser exportado para outros postos na Europa (p. 336). Essa interpretação é, infelizmente, incorreta.
A vigilância de brasileiros “indesejados” sempre foi exercida, tendo se burocratizado nas décadas de 1920 e 1930, após a explosão de revoltas domésticas que geraram redes de exilados brasileiros no Cone Sul. A aliança de Getúlio Vargas com o presidente uruguaio Gabriel Terra e o diálogo informal entre as políticas da região, por exemplo, ensejaram mecanismos que se perpetuariam nas próximas quatro décadas. Temos, adicionalmente, o efeito das atividades da Intente Internacional Anticomunista. Odette de Carvalho, como assessora de missões multilaterais brasileira em Genebra, e o filho do barão do Rio Branco, Raul Paranhos, embaixador em Berna, tornaram-se membros brasileiros desse mecanismo, voltado para o monitoramento e a troca secreta de informações sobre comunistas. Carvalho, ao retornar ao Brasil, analisou o arquivo apreendido de Luiz Carlos Prestes para desbaratar colaboradores e estabelecer as ramificações internacionais do movimento comunista na América Latina. Nas duas décadas seguintes, já oficialmente no Itamaraty como cônsul e depois diplomata, conjuntamente com outros servidores, trabalhou para aperfeiçoar no órgão o sistema administrativo que levaria a trágicos resultados em Santiago.[1]
Essa perspectiva histórica reforça as conclusões de Simon a respeito do papel do Itamaraty na máquina da repressão do Estado brasileiro. Ela também aponta para algo mais complexo e preocupante, pois mesmo no período democrático de 1946 a 1964 essa atividade foi conduzida e até fortalecida, normalizando, no âmago da atividade diplomática, o monitoramento de nacionais no exterior, a denegação de apoio consular, a colaboração com militares e a divisão de brasileiros em classes, uma delas indesejada.
O elemento central da obra de Simon é a narrativa sobre o envolvimento brasileiro na crise que se abateu no Chile, da vitória de Allende, em setembro de 1970, até logo após o golpe de 11 de setembro de 1973. Já existe extensa literatura sobre o tema. Devemos destacar a obra de Tanya Harmer, na qual argumenta que os americanos ficaram na periferia dos eventos de setembro de 1973, tendo sido os chilenos que tomaram as rédeas do golpe, “with the help of sympathetic Brazilian friends”. Ainda em 1971, segundo a autora, a hostilidade brasileira se transformara em ação (Harmer 2011, 17 e 95). Mas o que seriam essas ações e qual era essa ajuda? Boatos de um general e alguns militares brasileiros oferecendo ajuda para um criar um movimento de resistência no Chile e o treinamento de exilados contra Allende; criação de uma sala de situação em dependências do exército no Rio para estudar a “ameaça” chilena; envio de militares brasileiros para estudar zonas que pudessem ser usadas como plataforma de guerrilha contra o governo chileno; a realização de exercícios militares no Brasil pensando o cenário chileno; a construção de um eixo Washington-Brasília para isolar o Chile em uma ofensiva diplomática na América do Sul; uma aproximação com os militares argentinos focando uma atuação conjunta sobre o Chile; intercâmbio de oficiais chilenos e brasileiros; a ação conspiratória de Câmara Canto, o embaixador brasileiro no Chile, estimulando oficiais chilenos a derrubarem Allende; e a apresentação de um modelo ou receita para que as forças armadas chilenas obtivessem sucesso no Golpe (Harmer 2011, 95–228). O livro de Simon apresenta esses mesmos argumentos. Vale notar que o autor deveria ter sido mais generoso nas notas de rodapé, indicando de forma objetiva o papel de Harmer na construção de seus argumentos.
É desafiador analisar esses argumentos. Primeiro, devemos definir o que é desestabilização, compreendendo seus instrumentos e até que ponto tiveram relevância no desenrolar dos acontecimentos.[2] Na literatura sobre esses temas, os instrumentos mais importantes são: a) Assistência financeira, logística e militar a dissidentes; b) Propaganda; c) Desestabilização econômica; d) Ação preventiva direta (sabotagem, demolição e evacuação); e) Assassinato de líderes; f) Apoio ao processo propriamente dito de queda do regime. Segundo, é importante separar pelo menos três momentos distintos: a eleição e o governo Allende, o golpe de 11 de setembro e, por fim, o início do governo da junta liderada por Pinochet.
Como essa discussão conceitual aplica-se ao caso brasileiro no Chile? O primeiro elemento é a assistência financeira, logística e militar a dissidentes. Na obra de Simon, observamos pedidos de apoio por parte de dissidentes chilenos, como armas, mas não há evidência de que tenham sido acatados. Não foi confirmada, na obra de Simon, também, a acusação feita pela jornalista Marlise Simons, do Washington Post, de que o Brasil armava grupos paramilitares no Chile no governo Allende (p. 114–115). Outro elemento foi o fato de o Brasil ter abrigado personalidades do grupo Patria y Libertad.[3] Não foi demonstrado de forma convincente, no entanto, que a ação destes elementos a partir do Brasil tenha ajudado a desestabilizar o Chile e tampouco que tiveram papel relevante no golpe. A ação no Chile, portanto, não se assemelharia ao o que ocorreu na Bolívia, no processo que levou à ascensão de Hugo Banzer, onde há evidência mais sólida de que o Brasil forneceu avião e armas a este militar, além de apoio logístico em uma tentativa anterior de golpe.
O fato de militares brasileiros terem feito estudos de cenários, realizado atividade de inteligência (p. 100–1) e formulado “planos” para uma campanha de guerrilha contra Allende (p. 102) não teve efeito prático no desenrolar da crise em Santiago e tampouco há evidência de que tenham desestabilizado o país. Aqui vale a lição do historiador R. R. Palmer: “intenções não determinam o curso dos eventos” e “tampouco determinam responsabilidade” (Palmer 2005, 357–358).
O relato da conversa de Nixon com Médici na Casa Branca no final de 1971 é usado como evidência de que o intercâmbio de oficiais chilenos e brasileiros ajudou a desestabilizar o Chile, um argumento central à obra. Simon aponta que Médici “afirmou, sem reservas, que o Brasil estava envolvido numa campanha secreta para acabar com a democracia chilena” (p. 157). O primeiro elemento a ser avaliado é falta de base empírica para sustentar essa tese, pois não é isso o que o documento citado apresenta. Nele, o presidente brasileiro não falou em nenhum momento o termo “campanha secreta”. O mais próximo é o trecho Brazil was working towards this end, supostamente afirmado por Médici quando perguntado sobre se os militares chilenos seriam capazes de derrubar Allende.[4]
A análise e o contexto do registro do diálogo são importantes. Ele originou-se das notas do general Vernon Walters, convertidas em relato por Arnold Nachmanoff, o assessor de Kissinger que não esteve presente no encontro, sendo posteriormente assinado por Kissinger.[5] Mesmo supondo ser uma confissão de o Brasil já estar implementando uma campanha secreta contra a democracia no Chile treze meses após a posse de Allende, o que garantiria ser isso verdadeiro e não interpretação de Walters, que tomou notas; de Nachmanoff, que pegou a informação de segunda mão e redigiu o memorando; de um ardiloso e nem sempre confiável Kissinger, que o assinou; ou uma frase solta de um entusiasmado Médici, que buscava apresentar o Brasil na reunião com uma preocupação geopolítica mais ampla?
Até o momento, não temos confirmação de que o Brasil serviu de intermediário de Washington para triangular armas e recursos para a oposição chilena, como Nixon ofereceu a Médici. Tampouco o governo brasileiro ofertou armas diretamente para opositores chilenos, apesar de instado a tanto (p. 163). Qual seria, então, o indicativo, corroborando o diálogo, de que o país agia em uma campanha para acabar com a democracia chilena? Simon, com base no relato, indica que isso se daria pelo intercâmbio de oficiais militares (p. 158 e 160) e pela troca de informações (p. 163). Contudo, em nenhum dos casos é possível identificar como gerariam instabilidade no governo chileno para retirar Allende do poder.
O autor detecta grande fluxo de militares chilenos no Brasil antes e depois do 11 de setembro, deixando no ar a hipótese de que antes teriam atuado de alguma forma na desestabilização de Allende e, depois, no que podemos chamar de cooperação entre os porões das ditaduras. Aqui, novamente, a falta de evidência prejudica a análise. Temos informação adequada para as atividades dos militares brasileiros no Estádio Nacional, mas em outros casos temos somente informações sobre fluxo de militares e especulações sobre o que faziam. Não temos, assim, como afirmar ser esse um método secreto de intervenção em negócios internos no Chile para derrubar o governo Allende, pois carecemos de informações sobre o que eles efetivamente estavam fazendo. No caso do fluxo direcionado ao Brasil após o golpe, há o mesmo problema. Assim como seria difícil argumentar que a presença da marinha chilena no Rio de Janeiro, nas vésperas da queda da monarquia brasileira, teria ajudado na proclamação da República, o fato de militares chilenos terem passado pelo Brasil antes de engajarem-se em violações de direitos humanos não evidencia aprendizado operacional em atividades de tortura no Brasil — post hoc ergo propter hoc.
O desafio aqui é também interpretativo. Desde pelo menos a década de 1930, há intenso fluxo de oficiais militares na região, algo que se tornou parte do processo de formação desses profissionais. Algumas são visitas protocolares e, em outros casos, há participação em atividades de capacitação. No caso da presença de militares chilenos no Brasil, isso decorria até de razões geográficas — o Rio de Janeiro estava nas rotas marítimas e aéreas do Chile para a Europa. Simon teria de compreender a natureza histórica dessas interações e argumentar que as ocorridas entre 1970 e 1974 foram distintas, apresentando evidência persuasiva de que, antes do golpe, serviram para desestabilizar o regime de Allende, e, depois, para efetivamente treinar chilenos nas horrendas atividades de tortura. Há toda uma classe documental no acervo do Itamaraty sobre intercâmbio de militares que o poderia ter ajudado, mas ele não a citou. Mesmo sabendo da lacuna e indicando existir somente indícios, deu saltos interpretativos excessivos.[6]
Voltando para os elementos que justificariam a tese de desestabilização, o segundo elemento a ser examinado é a propaganda. Aqui lidamos não com a promoção autoritária, quando há ativas ações para erodir a democracia em outro país, mas sim com o processo de difusão e inspiração, no qual atores externos são influenciados pelo exemplo. Na obra, isso é observado na tese de que o golpe de 1964 no Brasil serviu de “modelo” para os atores envolvidos na crise chilena. Simon, novamente seguindo a literatura, indica que brasileiros, inclusive do setor privado (p. 114 e 116), teriam ativamente feito essa difusão. Isso, contudo, não teve impacto desestabilizador. Ter um modelo não era um pré-requisito para desestabilizar e dar um golpe de Estado e, se a experiência brasileira era referência e um filtro cognitivo usado pelos atores no caso chileno, isso não precisou de influência de Brasília. Ainda que o caso brasileiro fosse importante, estava disponível no debate público — não havia nenhum roteiro secreto que os militares brasileiros podiam enviar aos chilenos e, mesmo se isso foi feito, não foi apresentada sua influência nas ações que precederam a crise que levou ao golpe em 1973.
Roberto Simon foi parcimonioso no seu exame das relações bilaterais entre o Brasil e o Chile, de forma que não examinou, nessa questão do modelo, a atuação do ministro das Relações Exteriores Vasco Leitão da Cunha após o golpe de 1964. Ele esteve na posse de Eduardo Frei, em Santiago naquele ano, e, ao retornar ao Rio de Janeiro, segundo relatos da imprensa, teria afirmado que a mudança ocorrida no Brasil em abril influenciou o eleitorado chileno pela via moderada. No ano seguinte, teria comparado o presidente Frei e o ex-presidente brasileiro João Goulart, abrindo breve crise entre os dois países. Assim como no período de 1970 a 1973, é exagerado considerar esse tipo de ação como desestabilizadora ou como exercendo influência.
Além da questão da propaganda do modelo brasileiro que levou ao golpe de 1964, não há evidência de intervenção brasileira em mecanismos mais ortodoxos de desestabilização, como desembolso de recursos para influenciar meios de comunicação, ou influência direta sobre formadores de opinião e grupos sociais organizados.
O que temos no momento de evidência do período que precede o golpe são preponderantemente conversas de bastidores, análises e comentários, geralmente demonstrando a ojeriza brasileira ao que ocorria no Chile e a preocupação e a atuação com o tema dos exilados brasileiros — e não influência sobre atores chilenos relevantes. Na documentação diplomática brasileira, o material mais abundante é da autoria do embaixador brasileiro em Santiago, Antônio Câmara Canto. Simon é peremptório ao afirmar que ele gozava de grande influência entre os militares chilenos e “contribuíra” (p. 206) para o golpe. De fato, o embaixador gostava de passar para Brasília e para a comunidade diplomática em Santiago a imagem de insider e de que exercia influência. Harmer, contudo, já havia alertado em 2011 que havia muito exagero nos relatos que enviava a Brasília, baseados muitas vezes em notícias de jornal (Harmer 2011, 93). O que o diplomata efetivamente fez, de qualquer forma, não se encaixa no conceito de desestabilização, e não há evidência no livro e na literatura de que tinha proeminência significativa em Santiago a ponto de ter influenciado o curso dos acontecimentos que levou ao golpe de 11 de setembro, como o realizado pelos americanos e domesticamente por atores como o jornal El Mercurio.[7]
A afirmação de que o brasileiro foi conhecido como o “quinto membro” da junta militar que ocupou o país, por fim, é um grande exagero e está longe de sinalizar a intervenção brasileira. Apesar de a alcunha ser repetida na imprensa e em trabalhos acadêmicos principalmente após a década de 1990, não há, até o momento, na documentação da época, indício de que tenha sido reconhecido assim de forma recorrente e por várias pessoas. O termo, pelo contexto do livro de Simon e de outros trabalhos, teria sido proferido no dia do golpe para indicar a aproximação ideológica pessoal do embaixador brasileiro com a junta, e a felicidade de seus membros de receber a visita de Câmara Canto logo após o sucesso do movimento. Não significa, assim, participação no processo de desestabilização e influência efetiva nos rumos do golpe de 11 de setembro. A escolha de Simon pelos termos “seria chamado” e “lhe renderia a alcunha” não é, portanto, adequada diante da evidência. É um exagero que poderia ter sido evitado pelo termo “foi chamado”, mais convergente com o que sabemos no momento.
O próximo elemento a ser examinado é a desestabilização econômica. Isso é geralmente conduzido por uso de instrumentos como sanções, bloqueio de portos e restrições comerciais, assim como atividades mais sutis e mais difíceis de serem detectadas, como o fomento de greves e lockout. Não há vestígio no livro e na literatura de que o Brasil tenha exercido tais atividades. Isso exigira recursos, mobilização logística e capilaridade na sociedade chilena. Essa ausência de evidência também ocorre no caso de ações preventivas diretas e assassinato de líderes.
Os estudos publicados até o momento demonstram, portanto, que uma mudança no Chile era desejada por amplo arco de atores governamentais e não-governamentais no Brasil. Mas, até o momento, não temos evidência sobre uma ação brasileira no processo de desestabilização com impacto efetivo.
Mas o que dizer sobre o apoio ao processo propriamente dito de queda do regime, em 11 de setembro? Um elemento apresentado por Simon para justificar que o Brasil teria coordenado “ações com militares que aprontavam o golpe” (p. 16) é a chamada conexão peruana (“Operação Mensagem García”) — algo já apresentado por Tanya Harmer (Harmer 2011, 220 e 273).
No caso, o almirante Merino, uma personalidade efetivamente ligada ao golpe, estaria preocupado com a possibilidade de, em caso de ocorrer uma guerra civil no Chile, o Peru aproveitar-se para tentar reconquistar o território perdido na Guerra do Pacífico. Ele teria enviado um emissário a Brasília para que militares brasileiros intermediassem um canal secreto com uma autoridade peruana e, assim, conseguir garantias de que o Chile não seria invadido — algo efetivamente viabilizado pelas autoridades brasileiras. Uma das principais fontes dessa percepção é uma entrevista dada pelo emissário trinta anos depois. Simon conclui: “Os conspiradores chilenos teriam obtido do Brasil a garantia que buscavam” (p. 194, tese repetida em p. 261 e 290–294).
Ainda que o envio do emissário possa demonstrar preocupação, não há evidência de que a avaliação e o tema refletiam os interesses dos conspiradores além de Merino e seu emissário. Câmara Canto, reputado por Simon como grande confidente dos militares chilenos, nos mais de 2000 telegramas que enviou de 1972 até 11 de setembro de 1973, não apresenta a questão como relevante, indicando, na verdade, como maior preocupação externa dos militares chilenos a possível atuação de guerrilheiros do país na Bolívia, cujas relações diplomáticas estavam rompidas com o Chile.[8] Isso não quer dizer que o potencial confronto com o Peru não se tornou a “questão geopolítica mais premente para a ditadura Pinochet” (p. 284) e que uma guerra entre os dois países poderia estourar (p. 291), como argumenta Simon. Mas aqui temos de lidar com a cronologia de forma mais detida.
A tensão entre Peru e Chile ocorreu, primeiro, com a compra de tanques soviéticos pelo governo peruano, algo decidido pelo presidente peruano em meados de 1973, mas só conhecido depois do golpe no Chile — algo que realmente gerou ampla repercussão entre militares chilenos. O segundo elemento estrutural a abalar o relacionamento bilateral foi o próprio golpe de 11 de setembro, seguido da aproximação do Chile com a Bolívia após o encontro Banzer-Pinochet em Brasília, em 1974, quando o Peru se vê isolado na região. Com o golpe, por sua vez, o Chile passa a observar seu vizinho como um incubador de guerrilheiros, o que naturalmente fragilizou ainda mais as relações bilaterais.[9]
Se há dificuldades na identificação de participação brasileira no golpe, elas abundam no processo de legitimação internacional e de reconhecimento e apoio ao governo chileno após o 11 de setembro, como já demonstrado por Harmer e apresentado por Simon de forma convincente. Mesmo aqui, no entanto, é importante fazer alguns questionamentos. O envio de remédios e víveres para Santiago logo após ao golpe não pode ser considerado por si uma sinalização de apoio atípico do Brasil se considerarmos que outros países, como a Argentina, também o fizeram. O mesmo deve ser afirmado sobre o empréstimo concedido pelo Banco Central brasileiro, pois Simon deveria demonstrar que essa concessão não era uma consequência natural das negociações de milhões de dólares que vinham desde 1972, e cuja tratativas autoridades chilenas e brasileiras, inclusive Câmara Canto, batalhavam para efetivar no primeiro semestre de 1973.[10]
Por fim, a despeito de apresentar outras evidências de apoio expressivo que justificam corretamente a tese de que Brasília apoiara a junta que assumiu o poder com o golpe (p. 213), o fato de ter sido o primeiro país a reconhecê-la, em setembro de 1973, não é atípico. Nos anos seguinte, não custa lembrar, o Brasil reconheceu rapidamente o novo governo socialista português e foi o mais rápido e o primeiro país a reconhecer o regime comunista de Angola liderado pelo MPLA, sem que isso tenha significado apoio a esses regimes.
* * *
Como apontamos na introdução, o objeto de estudo de Roberto Simon é extremamente desafiador. Não só carecemos de fontes cruciais, como as disponíveis são eivadas de problemas. É muito tentador, ao tentar perscrutar mais detidamente a névoa densa do passado, observar silhuetas e atribuir significados. Simon é habilidoso em identificar muitas armadilhas, geralmente decorrentes da “mente fantasiosa da repressão brasileira” (p. 183). Infelizmente, esse exame mais crítico não foi conduzido quando ele se fixou em alvos específicos, o que levou a saltos interpretativos controversos. Há, sob a excepcional prosa do autor, repetidas afirmações considerando conjecturas como inevitáveis.
Na obra, esses saltos interpretativos ocorrem repetidamente — (“É difícil imaginar…”, p. 175) ou (“é altamente provável…”, p. 184). São suposições com pouco fundamento empírico, sem justificativa de plausibilidade de fontes alternativas e, como veremos abaixo, altamente questionáveis diante de informações oferecidas no próprio livro e sobre o que sabemos sobre o período.
Isso ele faz, por exemplo, quando afirma que, em abril de 1972, no encontro entre Banzer e Médici: “é altamente improvável que (…) a agitação nos subterrâneos dos quartéis do Chile tenham ficado de fora do convescote no Mato Grosso do Sul[11] [SIC]” (p. 172, meu negrito). Com base em que se poderia fazer tal suposição? A preparação e a visita foi documentada e as discussões, mesmo as mais sensíveis, tiveram providências posteriores. Analisando o fluxo dessas comunicações secretas e confidenciais, o único interesse dos canais reservados com o governo Banzer remotamente ligado ao caso chileno apontam para envio de informações sobre “grupos subversivos bolivianos sediados no Chile” por parte do Brasil, nos termos de um documento da época.[12] Não há nada no padrão de preparação de encontros presidenciais da época e nas circunstâncias do encontro que determine esse alto grau de improbabilidade.
A ação de Câmara Canto para encontrar-se com a junta logo após o golpe foi outra ocasião em que tal estrutura argumentativa é usada. Defendendo que o diplomata não era “incompetente ou indisciplinado”, afirma: “É difícil imaginar que um reputado cumpridor de ordens e um dos mais experientes diplomatas do Itamaraty tenha tomado uma decisão tão importante [ir ao encontro da junta que deu o golpe] sozinho, sem o acordo de Brasília” (p. 207, meu grifo). A plausibilidade dessa assertiva dependeria de um exame do diplomata, da diplomacia brasileira em casos semelhantes e das circunstâncias. No primeiro ponto, não seria necessário ser incompetente ou indisciplinado para a ousada atitude. Câmara Canto era intempestivo e impulsivo. No próprio livro, o autor apresenta este diplomata explorando iniciativas sem estar previamente autorizado pelo Itamaraty. Como sabemos hoje, em sua ação na comissão de expurgo do Itamaraty em 1969, ele tomou várias providências contrárias à prática administrativa do órgão. Considerando o Chile de 1973, até o conselheiro Luiz Loureiro Dias Costa, abaixo na hierarquia da carreira, com muito mais a perder que seu colega, e, portanto, com menos incentivos para desviar-se da linha de Brasília, tomou decisões sem estar devidamente autorizado. Com relação ao histórico em casos de rupturas institucionais, também não seria uma exceção a atitude no Chile. Pertinente recordar o caso do experiente embaixador Sylvino Gurgel do Amaral, que passou a impressão equivocada de ter reconhecido a junta que deu um golpe de Estado no Chile, em 11 de setembro de 1924, um reconhecimento por engano.[13]
Por fim, há as circunstâncias do próprio caso chileno da época. Apesar de as comunicações diretas da embaixada com o Brasil estarem rompidas em 11 de setembro de 1973, em crise anterior, em junho do mesmo ano, quando se achava que um golpe de Estado estava em curso e as comunicações com o Brasil estavam funcionando, Câmara Canto não solicitou e tampouco registrou instrução pela série telegráfica sobre o que fazer caso assumisse um governo após um possível golpe.
No livro, o espírito crítico de Roberto Simon também o traiu na análise da credibilidade das fontes. Um caso claro é a tese de que os brasileiros teriam manipulado a eleição no Uruguai em 1971. Ainda que sofra menos dos problemas apontados acima no caso chileno (a evidência sobre interferência direta na eleição é escassa, mas a movimentação de tropas na fronteira poderia hipoteticamente ter afetado uma eleição concorrida no país vizinho), Simon cita, para dar suporte ao seu argumento, conversa do presidente americano Richard Nixon com o primeiro-ministro britânico, Edward Heath, indicando terem os brasileiros interferido no vizinho platino. Simon conclui: “É difícil imaginar que Nixon soltaria algo sobre brasileiros no Uruguai ao primeiro-ministro da principal potência aliada dos Estados Unidos [Inglaterra] sem saber do que falava” (p. 139, meu grifo).
O primeiro elemento a ser examinado é o fato de existirem duas versões do mesmo documento, e a depositada na Nixon Library, de seis páginas, não ter esse trecho. Simon utilizou a versão do National Security Council, depositada no National Archives, de sete páginas.[14] Há, portanto, um problema de versão de documentos. Isso pode significar nada, mas temos de levar em consideração que Nixon era exagerado e mentiroso compulsivo e contumaz, muitas vezes acreditando como verdadeira sua versão distorcida da realidade, como extensa literatura demonstra. Sua administração é eivada de problemas no fluxo e na credibilidade de informações. Hannah Arendt, não à toa, a descreveu como the commitment to nontrughfulness in politics.[15] Não há quem acredite nas palavras de Nixon sem acompanhar e checar a cadeia de transmissão de informações até ele ou analisar suas motivações.
O segundo elemento a ser examinado é estudar o contexto da conversa para tentar compreender qual a motivação de Nixon em examinar assunto tão periférico. O diálogo com Heath ocorreu em uma situação em que os Estados Unidos buscavam reparar a aliança especial com os ingleses. Estes acreditavam que não eram mais consultados por Washington nos grandes temas e, naquele momento, estavam profundamente desconfiados com a política de Détente perseguida por Washington com a União Soviética. Nixon, por sua vez, estava interessado em dividir o fardo da manutenção do mundo ocidental entre aliados e usou o encontro para incentivar os britânicos a terem mais responsabilidades na Europa (Comunidade Econômica Europeia), no Caribe e na Ásia.[16]
O diálogo, portanto, faz sentido dentro das usuais expressões exageradas de Nixon de que seu quintal estava em ordem, que não era necessário os britânicos se preocuparem, e que parte dessa situação decorria do esforço do presidente americano de dividir o fardo do combate ao comunismo com outros países, como o Brasil — algo que desejava também dos ingleses.[17] Não há, portanto, motivos para usar tal diálogo para embasar a tese de intervenção brasileira no Uruguai se não temos evidências mais sólidas do uso de instrumentos para tal fim e a forma como o presidente americano tomou conhecimento deles.
Muitas vezes, o livro apresenta interpretações questionáveis do ponto de vista das fontes, como a afirmação que os militares brasileiros “já tinham contribuído com armas, munição e medicamentos na caçada a Che” (p. 125, meu negrito). O documento citado por Simon afirma, na verdade, que, na cooperação entre as Forças Armadas entre o Brasil e a Bolívia, foram fornecidos armamento, munições e medicamentos “à época do combate às guerrilhas de Che Guevara”[18] (meu negrito). Ainda que seja plausível, o documento não estabelece que uma contribuição realizada na época tenha sido necessariamente vinculada à caçada a Che, sem contar, é claro, que é bem estabelecido na literatura que as unidades que combateram a guerrilha na Bolívia foram especificamente supridas pelo governo americano desde o início de 1967 e que, na época, os bolivianos achacaram seus vizinhos para se rearmarem de forma geral e não só para combater o maltrapilho grupo de Guevara.[19]
Já no caso da suposta ameaça peruana, Simon afirma: “Segundo inteligência americana, entre os assuntos que o general chileno [Pinochet] queria abordar em Brasília [em sua visita], o apoio brasileiro contra Lima era o mais importante de todos” (p. 284, meu grifo). O documento citado para dar suporte à tese, contudo, não fala em nenhum momento que o tema “era o mais importante”, nem permite ter certeza em tal inferência — o tema da Bolívia é tratado de forma pelo menos equivalente.[20] Sem contar, é claro, que tal documento não seria o apropriado para sustentar tal argumento de relevância — teríamos de ter tal indicação em fontes chilenas e brasileiras que subsidiaram a visita de Pinochet a Brasília. Esse repetitivo estilo interpretativo não se limita a argumentos periféricos, como observamos acima na análise da conversa de Nixon com Médici.
A ausência de uma compreensão do contexto institucional também prejudica o livro em vários trechos importantes, em especial ao, indiretamente, passar a impressão de serem atípicos aspectos ordinários da atividade diplomática. Esse é o caso, por exemplo, do acompanhamento de eleições em países estrangeiros, assim como a avaliação sobre como a vitória de potenciais candidatos podem impactar o relacionamento bilateral — indicando quais seriam melhores do ponto de vista brasileiro. Não causa nenhuma surpresa a tese, mesmo para o caso de Câmara Canto, que a função de qualquer diplomata seria construir uma “ampla e eficiente rede de contatos” (p. 92) e atuar para “que a política chilena evoluísse em consonância com os interesses da ditadura militar brasileira” (p. 40).
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As fontes muitas vezes são insuficientes para lidarmos com as importantes perguntas que fazemos ao passado. Nessas situações, não é raro extrapolarmos com bases em indícios. O livro de Roberto Simon demonstra os limites dessa estratégia. As dificuldades do autor decorrem, em larga medida, das graves lacunas na historiografia da política externa brasileira do período. Carecemos de estudos densos sobre temas como: as relações bilaterais entre Brasil e Chile no século XX, a colaboração transnacional de militares no Cone Sul, o comércio de armas, a diplomacia consular e o funcionamento do Itamaraty na ditadura militar. Neste último tópico, por exemplo, Simon apresenta em sua narrativa órgãos como o CIEX e o DSI, mas sem se preocupar em explicar ao leitor o que eram e como operavam.
Mas não são só lacunas historiográficas que dificultaram o trabalho. Enfrentamos carência de fontes primárias para responder satisfatoriamente muitas questões apresentadas no livro. Se nosso objetivo é observar, por exemplo, o impacto e a influência da ação brasileira no Chile, a lacuna mais importante a ser sanada está exatamente em Santiago, buscando mais fontes para analisar de forma mais detida os atores chaves do processo de desestabilização e de conspiração para o golpe de 11 de setembro, em especial se e como eram influenciados pelo Brasil. Também é importante desencavar no país mais material sobre a natureza da interação entre militares brasileiros e chilenos.
Neste último tópico, do lado brasileiro, a Comissão da Verdade enfrentou inúmeras dificuldades para tentar acessar arquivos militares. Mas muito material sobre a ação militar brasileira no exterior está depositado no Itamaraty. Roberto Simon, no livro, afirmou que mergulhou neste acervo (p. 360), mas as referências citadas indicam não ter consultado séries documentais essenciais. Os maços temáticos citados na obra são somente os da subsérie 600 (negócios internos de Estados estrangeiros). Isso significa que deixou de usar, para ficar nos mais óbvios, os referentes a disciplina dos diplomatas, relatórios consulares e relações dos diplomatas com outros órgãos do governo (300); campanhas eleitorais, atividades comunistas, serviço de informações do Brasil no exterior, reconhecimento de governo, revoltas, conspirações, banimento, refugiados, agentes no estrangeiro, segurança pública, missões militares, oficiais do exército em comissão e atividades de militares brasileiros no exterior e comércio de armas (500); repatriação e socorros a desvalidos (700); e a gigantesca classe relações políticas entre os Estados (900). Tampouco foi utilizada a subsérie específica de memoranda e a de ofícios com os órgãos militares do governo. Todo este material já está liberado para consulta, mesmo os de caráter confidencial e secreto. Essa deficiência não é de toda responsabilidade do autor e poderia ter sido dirimida com as atividades da Comissão da Verdade, que teve interesse e um mandato para lidar com o tema. A despeito de contar com personalidades importantes e de levantar dezenas de milhões de documentos, contudo, ela não acionou a comunidade de historiadores da política externa brasileira para auxiliar seus trabalhos no Itamaraty.[21] Foi mínima a quantidade de documentos recolhida ao Arquivo Nacional e efetivamente consultada. Uma oportunidade perdida, e que só agora observamos as consequências.
Referências
Alvear, Francisco Javier, and Jairo Lugo-Ocando. “When Geopolitics becomes Moral Panic: El Mercurio and the use of International News as propaganda against Salvador Allende’s Chile (1970–1973).” Media History 24, no. 3–4 (2018): 528–546.
Downes, Alexander B., and Mary Lauren Lilley. “Overt Peace, Covert War? Covert Intervention and the Democratic Peace.” Security Studies 19, no. 2 (2010): 266–306.
Harmer, Tanya. Allende’s Chile and the Inter-American Cold War, The new Cold War history. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 2011.
Nepomuceno, Margarida. “A criação de uma Diplomacia Anticomunista no governo Vargas, em 1937.” Tempo de História 33, no. (2018): 176–189.
Nichter, Luke. Richard Nixon and Europe: the reshaping of the postwar Atlantic World. New York, NY: Cambridge University Press, 2015.
Palmer, R. R. Twelve who ruled: the year of the Terror in the French Revolution. 1st Princeton Classic ed, A Princeton classic edition. New Jersey: Princeton University Press, 2005.
Rossbach, Niklas H. Heath, Nixon and the rebirth of the special relationship: Britain, the US and the EC, 1969–74, Global conflict and security since 1945. New York: Palgrave Macmillan, 2009.
Ryan, Henry Butterfield. The fall of Che Guevara: a story of soldiers, spies and diplomats. Oxford: Oxford University Press, 1998.
Scott, Andrew. Allies apart: Heath, Nixon and the Anglo-American relationship. New York: Palgrave Macmillan, 2011.
Setemy, Adrianna. “Do Serviço de Estudos e Informações (SEI) ao Centro de Informações do Exterior (CIEX): a institucionalização das políticas de informação e repressão ao comunismo no Itamaraty.” Locus-Revista de História 24, no. 1 (2018): 149–171.
Spektor, Matias. Kissinger e o Brasil. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2009.
Notas
[1] Ver o relatório Le movement communiste et anti-communiste en Amérique Latine durant les années 1932/1933, de autoria de Carvalho n˚ Of. 8 de 12/10/1933 da DelBrasarm. A Comissão da Verdade, apesar de saber da existência dessas atividades e de se interessar pelo fichário criado por Odette, que foi aproveitado por seus sucessores, não contou com pessoal treinado para localizar e usar esse rico acervo. Um resumo inicial da estruturação da área está disponível em Setemy 2018 e Nepomuceno 2018.
[2] No próprio trecho do Foreign Relations of United States (FRUS) dedicado ao golpe no Chile há um detalhamento conceitual desses tipos de ações. O trabalho de Downes and Lilley 2010 também apresenta tal preocupação.
[3] Convém notar que outros países da região também deram abrigo a membros deste grupo, notadamente após a crise de junho de 1973.
[4] https://nsarchive2.gwu.edu/NSAEBB/NSAEBB282/Document%20143%2012.9.71.pdf.
[5] https://nsarchive2.gwu.edu/NSAEBB/NSAEBB71/doc12.pdf.
[6] Como suporte para o argumento de ter existido “extensa colaboração” e uma demonstração inequívoca de “apoio [brasileiro] à construção de uma agência de repressão no Chile” (p. 321) ele usou a mesma estratégia de compensar a falta de evidência com conjecturas, algo que discutiremos abaixo: “dificilmente (…) seria feito sem, no mínimo, o aval da repressão verde amarela” e “no mínimo, o SNI (…) teve pleno conhecimento (…) (p. 327–328).
[7] Ver, neste caso, Alvear and Lugo-Ocando 2018.
[8] Câmara Canto relatou muito mais problemas com a Argentina, em especial o tema do canal de Beagle, fonte de tensão com entre os dois países, e a questão de “terroristas” argentinos que se exilaram no Chile, que levaram os argentinos anularam convites de recepções e visitas chilenas. Ver, como exemplo, tels 195 de 17/04/1972, 211 de 21/03/1972 e 789 de 30/08/1972 de Santiago.
[9] https://static.history.state.gov/frus/frus1969-76ve11p2/pdf/frus1969-76ve11p2.pdf.
[10] Ver tel 572 de Santiago de 22/06/1972, 746 de 21/08/1972, 275 de 05/04/1973.
[11] O estado do Mato Grosso do Sul foi criado em 11 de outubro de 1977, alguns anos após o encontro.
[12] IPR 21. 27 de março de 1972. Secreto.
[13] O caso é apresentado por Maurício Nabuco em seu diário, atualmente depositado no CPDOC/FGV.
[14] Também citada em documento transcrito no volume do Foreign Relations of United States https://history.state.gov/historicaldocuments/frus1969-76ve10/d145.
[15] Hannah Arendt. Washington’s ‘Problem-solvers’ — Where they went wrong. The New York Times. April 5, 1972.
[16] Sobre o relacionamento entre Nixon e Heath e os problemas europeus, ver Nichter 2015, Scott 2011, 68–69, Rossbach 2009, 130.
[17] Sobre Nixon e o Brasil, ver Spektor 2009. Como afirmou Vernon Walters em 1970, “We must be prepared to let Brazil or Argentina sometimes to carry the ball instead of doing it ourselves”. Memorandum From Vernon A. Walters to the President’s Assistant for National Security Affairs (Kissinger). Washington, November 3, 1970. In: FRUS. Ver também Harmer 2011, 69.
[18] Fonte de Roberto Simon em p. 388. Importante notar que tal documento foi utilizado anteriormente pela pesquisadora Alessandra Castilho.
[19] Para o caso americano, ver, por exemplo, Ryan 1998, 91–95 e 107.
[20] https://www.cia.gov/readingroom/docs/CIA-RDP79T00975A026200200001-8.pdf.
[21] Convém notar que foi extremamente superficial a atividade da Comissão no Itamaraty. Do lado do Arquivo Nacional, pelo o que pude identificar, apontou-se que o MRE teria atitude distante e dado pouca atenção às demandas. Para pessoa deste órgão ligada à questão, a versão é que a carência estrutural de recursos da área do arquivo, pedidos difusos e a ausência de conhecimento do acervo do MRE por parte dos contatos da Comissão e do Arquivo Nacional prejudicaram uma melhor colaboração. Tendo analisado os registros dessa colaboração, opto pela segunda versão. A Comissão da Verdade carecia de recursos (tempo e pessoal), ofereceu demandas pontuais e não tinha noção do que existia no acervo, por não ter colaboradores com experiência em consultas ao acervo. Não há evidência de má vontade por parte do Itamaraty. O Fundo DSI/MRE, por exemplo, foi doado pelo órgão ao Arquivo Nacional entre 2006 e 2009, antes da instauração da Comissão, o que demonstra ativismo em oferecer acesso ao público material sensível, antes mesmo de instado a fazê-lo.
Sobre o autor
Rogério de Souza Farias: Doutor em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (2012). Ganhou o Concurso de Teses e Dissertações em Relações Internacionais da Associação Brasileira de Relações Internacionais em 2013. Ganhou Menção Honrosa no Prêmio CAPES de Teses na área de Ciência Política e Internacional em 2013, tendo sido a melhor da subárea de relações internacionais. Foi visiting scholar do Lemann Institute for Brazilian Studies da Universidade de Illinois em Urbana-Champaign (2013–2017) e associate do Center for Latin American Studies da Universidade de Chicago (2014–2017). Trabalhou na Câmara de Comércio Exterior (CAMEX) em 2005. Como Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG) e do Ministério da Economia (ME) atuou no MDIC, no MPOG e na Escola Nacional de Administração Pública (ENAP). Esteve lotado no Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais da Fundação Alexandre de Gusmão (IPRI/FUNAG) entre 2017 e 2021. Publicou artigos e resenhas em Dados, The Hague Journal of Diplomacy, Latin American Policy, Political Studies Review, Journal of World Trade, World Trade Review, The International History Review, Millennium, Diplomacy & Statecraft, Revista Brasileira de Política Internacional, Contexto Internacional, Política Externa e Revista do Instituto Geográfico e Histórico Brasileiro.