Sobre o shoegaze

e a cena que celebra a si mesma

Smhir Garcia
2 min readOct 18, 2013

Tem uma coisa que pra mim não fecha no desenvolvimento do shoegaze de 1992 pra cá. Reverb, paredes de distorção, guitarra altíssima, melodias bonitinhas, vocal sussurado, beleza, mas é só isso que o shoegaze tem a oferecer? Partindo dos releases (“a banda mescla distorção e melodia…” etc), passando às capas dos discos (borrão de luz e lomografia) e a própria apresentação das bandas o que me parece é que tudo o que o My Bloody Valentine fez tem sido replicado à exaustão e só.

Evidentemente, é natural que se seja influenciado, ainda mais quando se fala de um disco que goza do raro privilégio de ter criado um gênero. Mas enquanto o grande mérito do Loveless é essa ruptura absurda com as coisas que estavam acontecendo na época. As réplicas contribuem muito pouco para o desenvolvimento do gênero e acabam por torná-lo um antro de complacência e repetição, ao invés de promover a renovação, a criatividade e a inventividade.

Uma coisa certa é que só existe exatamente um Kevin Shields no mundo, na mesmíssima proporção em que só existe um eu, um você e assim por diante. Nesse sentido não é particularmente racional crer que eu ou qualquer outra pessoa lance um disco que seja o Loveless, aparentemente nem o próprio Kevin Shields tá muito a fim de fazer isso (mesmo porque não dá). O risco que se corre é que a cena que celebra a si mesma não seja nada além disso.

Um exemplo de banda influenciada pelo shoegaze mas que tem uma sonoridade mais distante dessa tradição é o Lupe de Lupe. Tá tudo lá, o barulho, a melodia, o som na cara, mas, além disso e o que faz uma diferença enorme é a a personalidade da banda impressa em cada letra cantada numa métrica impossível, em cada disco, em cada riff. Na minha cabeça é assim que eu acho que o shoegaze deve ser.

No fim das contas acho que isso de querer ter uma banda shoegaze, ou uma banda garage, ou uma banda do que quer que seja acaba mais limitando do que ajudando. Mas sei lá, sou eu só pensando isso, no fim das contas o que eu acredito que quem você é se traduz na sua música por menos que você queira, é meio que outra discussão, mas pra mim não rola fingir ser, não rola tenta adaptar: você toca o que você ouve, você é o que você toca. Daí dá pra tirar que tão importante quanto fazer você mesmo é ser você mesmo, e ser honesto consigo mesmo.

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