Política fora do armário: Bancada Evangélica pressiona Temer por Estatuto da Família
Deputados conservadores apostam que com o novo governo, pautas outrora ignoradas avancem no congresso.
Por: Matheus Machado Vieira
Há tempos as camadas progressistas brasileiras veem alertando sobre o perigo do fundamentalismo religioso que assola o nosso país. O protestantismo evangélico de vertente Neopentecostal desde os anos 1980 vem ganhando muitos adeptos no Brasil. Segundo os dados do IBGE de 2012, em 10 anos o número de adeptos dessas religiões subiu 61% no Brasil, os católicos diminuíram 1,3% entre 2000 e 2010 segundo o último Censo. Compreender essa matriz religiosa nos dias atuais se faz mais que necessário para estarmos atentos aos excessos que muitas vezes por eles é praticado.
Uma tendência que temos presenciado principalmente no âmbito evangélico é a interferência no espaço público por meio da política. Atualmente o congresso nacional brasileiro conta com uma expressiva bancada evangélica, deputados e senadores com posturas conservadoras, neste sentido inúmeras discussões tem passado por seu crivo, todavia propostas que envolvem direitos de “minorias” e temas “polêmicos” tem sofrido uma forte pressão da bancada. Um exemplo são discussões acerca do aborto, do casamento homossexual e a criação de uma lei anti- homofobia.
Todas essas discussões tem sido alvo de pastores fundamentalistas, como Silas Malafaia da Igreja Assembléia de Deus, dentre outros. Os direitos homossexuais para os evangélicos conservadores caem como uma “mordaça”. Segundo Malafaia, uma lei anti-homofobia impediria pastores das denominações cristãs pregararem “o que a Bíblia condena”.
Hoje a crise política a qual estamos vivendo caiu como uma luva para bancadas reacionárias do congresso tal como a evangélica, imputarem uma agenda retrógrada para o país. Uma das primeiras medidas em um eventual governo Michel Temer, segundo os líderes evangélicos é aprovar o “Estatuto da Família”.
Esse Estatuto já foi aprovado em comissão especial mas, ainda precisa ser votado no plenário da Casa. O projeto causou polêmica ao definir o núcleo familiar como sendo composto por um homem e uma mulher, descartando os diversos outros modelos de família existentes na sociedade. Além disso, os parlamentares evangélicos pretendem aprovar o Estatuto do Nascituro, que dificulta ainda mais o acesso ao aborto legal, e uma Proposta de Emenda à Constituição que permite que associações religiosas proponham ações diretas de inconstitucionalidade para barrar leis que contrariem seus interesses.
O deputado Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ), uma das lideranças da bancada evangélica, afirmou que a conversa com Temer, realizada na semana que antecedeu a votação do impeachment na Câmara, foi produtiva. Foi feita, inclusive, uma roda de oração junto com o vice. “Nossa frente parlamentar foi totalmente ignorada pelo Governo Dilma, e não apenas ignorada, mas confrontada pelas ideologias de esquerda”, diz. De acordo com ele, o vice-presidente se comprometeu a ter uma “interlocução direta” com os evangélicos na Câmara — que têm na figura do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), um de seus representantes. “Ao menos seremos ouvidos pelo Governo, e, naquilo que for possível, teremos atendidas nossas reivindicações de políticas publicas voltadas para nossos eleitores”, afirmou Cavalcante. Segundo ele, dos 91 deputados federais evangélicos que integram a frente, apenas cinco votaram contrariamente ao impeachment de Dilma.
Outras lideranças evangélicas fora do congresso tal como Silas Malafaia, afirmou que Michel Temer ao escolher seus futuros ministros precisa estar atento a quem vai colocar no MEC, pois, o mais cotado para a pasta até então é o senador José Serra (PSDB-SP). Serra, segundo Malafaia possui ideias progressistas acerca de questões de gênero e sexualidade, o que seria péssimo para os evangélicos que há tempos levantam a bandeira da não discussão da então apelidada “Ideologia de Gênero”, ou seja, temas ligados aos direitos humanos e diversidade sexual nas escolas públicas.
Quando um pastor da conselhos a um chefe de estado sobre a escolha de ministros nos perguntamos: Onde encontra-se o Estado Laico? Presente na constituição desde a separação entre Igreja e Estado em 1890 com o advento da República?
Ora, podemos dizer que no Brasil esse Estado não é e nunca foi tão laico assim, ousaria dizer que somos um Estado “não confessional”, ou seja: não existe vinculo oficial com alguma igreja em específico, como foi o caso da Igreja Católica durante a Colônia (1500–1822) e Império (1822–1889). Todavia a religião sempre perpassou sua influencia no âmbito político, agora mais do que nunca com o crescimento abundante de evangélicos no país. Partes desses religiosos se recusaram a privatizar a sua religião, exigem que ela mantenha-se pública, conduza a moral e os costumes em uma sociedade cada vez mais secularizada, essa secularização assusta os “crentes”. A tática dos mesmos é utilizar a política para tentar restabelecer os ditos “valores morais perdidos com a Pós Modernidade.”
Acabar com “Sodoma e Gomorra” é a agenda evangélica atual na política brasileira, uma verdadeira caça as bruxas (Gays, Lésbicas, Feministas, Travestis e Transexuais). Parece até que a essência do cristianismo deixou de ter importância para esses grupos. Onde está a caridade, a ajuda aos mais necessitados, o fazer o bem sem olhar para quem? Hoje a única preocupação da bancada evangélica é desumanizar os homossexuais e impedir uma legislação pró- aborto.
Contudo não podemos achar que todos os evangélicos pensam e agem assim. Como bem disse uma grande amiga minha há um tempo atrás: “O problema não é ser crente, a questão é saber ser crente.” O que não é o caso da bancada fundamentalista do congresso.
Fonte: Jornal El País
Política fora do armário, por Matheus Vieira
Historiador pela Universidade Estadual de Ponta Grossa UEPG- (2004- 2008). Especialista em Docência no Ensino Superior pelo Centro Universitário de Maringá- CESUMAR (2010). Mestre em História pela Universidade Federal do Paraná (2014). Matheus Machado Vieira também é parte do Núcleo Paranaense de Pesquisas em Religião — Nupper- UFPR. Atualmente é doutorando em História pela UFPR, onde desenvolve pesquisas relacionadas a questões de gênero e religiões Neopentecostais no Brasil.