Política fora do armário: Da Era de Ouro, para a Era do Retrocesso
Como as medidas de austeridade do Governo Temer podem afetar a sua vida.
Por: Matheus Machado Vieira
Em 13 anos no poder, o Partido dos Trabalhadores patrocinou distribuição de renda histórica e desajuste recorde nas contas do país; a renda dos mais pobres aumentou 129% e dos mais ricos, 32%. Mas, só 7% da população aprovava a gestão petista até a semana passada, quando a presidente Dilma Rousseff foi afastada do cargo.
Na base da pirâmide, gastos sociais como Bolsa Família e Previdência tiveram forte influência. Mas, o trabalho foi determinante para a melhora da renda no período. O ex-presidente Lula quando assumiu a presidência em 2003 pegou o país com um desemprego que batia as portas dos 14% e uma inflação que estourava o teto da meta, chegando a 12,5% em dezembro de 2002.
A partir de 2003, Lula promoveu reformas, mas, na economia optou pelo continuísmo da política econômica inaugurada por FHC (1995–2002). O governo petista manteve a balança comercial com um superávit em fase de crescimento e intensas negociações com a Organização Mundial do Comércio (OMC).
Lula obteve êxito com a diminuição de 168 milhões de reais, da dívida externa, porém, não conseguiu frear o aumento da dívida interna que pulou de um patamar de 731 bilhões em 2002 para um trilhão de reais em fevereiro de 2006 - fechando 2015, no final do segundo governo Dilma em 88 bilhões. Mesmo com todo aumento dos gastos, o rombo no orçamento foi menor na era PT do que no final do governo tucano em 2002.
No âmbito social os governos petistas empregaram parte da fatia do orçamento para programas sociais como o Fome Zero. O assistencialismo nesses quase 14 anos abrange: O Bolsa Família, que atingiu seu objetivo de diminuir a pobreza no Brasil, Programa de Erradicação do Trabalho Infantil e o Luz Para Todos, criado no mês de novembro de 2003 com o objetivo de proporcionar energia elétrica a 10 milhões de brasileiros moradores das zonas rurais. Também os programas Brasil Alfabetizado e Educação de Jovens e Adultos.
Com apoio popular e uma base sólida no congresso durante o primeiro e o segundo governo, Luiz Inácio Lula da Silva (2003–2010) avançou em infraestrutura para o país com obras necessárias: O PAC- Plano de Aceleração do Crescimento foi um exemplo, também reduziu o déficit de moradias populares com o Minha Casa, Minha Vida. Lula e depois Dilma proporcionaram políticas de inclusão social para jovens em idade universitária com o Prouni, Fies, Pronatec, Ciência sem Fronteiras e o Reuni. Esse último reestruturou as universidades federais, proporcionando bolsas de estudo para a graduação e pós-graduação.
Ainda no espaço educacional, o governo implantou as cotas em universidades públicas para negros, indígenas e alunos da rede pública de ensino. Lula e Dilma universalizaram o Enem- Exame Nacional do Ensino Médio, como uma maneira eficiente e democrática para o ingresso de jovens de todo país no Ensino Superior.
No que concerne aos direitos humanos o país avançou absurdamente com a aprovação da Lei Maria da Penha em 2006, que pune como crime hediondo a violência contra a mulher. A criação da Secretaria de Direitos Humanos, Mulheres e Igualdade Racial foi um avanço na proteção de minorias que historicamente foram excluídas no país (negros, mulheres e LGBTs). O programa Brasil Sem Homofobia foi um dos exemplos mais amplos do que essa secretaria com status de ministério proporcionou às políticas de igualdade de gênero.
Claro que nem tudo foi flores durante a dinastia petista. O partido para manter-se tanto tempo no poder recorreu a alianças escusas e duvidosas. Aliou-se com tudo que há de pior na política, partidos como PMDB, PP, PSD, PTB, PR, PRN e muitos outros. Esses partidos souberam muito bem colher os louros quando o governo estava com alta popularidade (até junho de 2013 Dilma tinha 70% de aprovação) e foram os primeiros a abandonar o barco, assim como ratos, quando a crise econômica, os recorrentes escândalos de corrupção e a crise política abalaram a governabilidade.
Esses partidos que tinham uma vultuosa participação no orçamento, com pastas importantes na Esplanada dos Ministério, não pensaram duas vezes em trair a presidente Dilma, a começar pelo PMDB do até então vice decorativo Michel Temer.
O PMDB durante todos esses anos esteve lado a lado com o governo, além da vice-presidência, o partido desfrutou de um grande status nos governos do PT. Só no governo Dilma, o partido de Temer possuía 7 ministérios e nunca escondeu o seu apetite por cargos. Não sentindo-se contemplado o suficiente e pressionado com a crise econômico-política boa parte do partido de Temer não pensou duas vezes ao se aliar com a oposição (inconformada em perder 4 eleições consecutivas) para planejar o golpe.
Golpe sim! Golpe porque o processo jurídico do impeachment sempre possuiu uma fraca sustentação. Imputou-se a presidente crime de responsabilidade fiscal, vulgarmente apelidada de pedaladas. Ora, pedaladas todos sabem que sempre foram cometidas por todos os presidentes da república antes de Dilma, são cometidas por todos os governadores de estado e prefeitos de municípios em todo o Brasil. Nesses casos nunca foi crime, por que com Dilma foi?
Por pedaladas fiscais podemos compreender: A implementação de cartas de crédito suplementar por parte do executivo (empréstimos de bancos públicos) para pagar despesas do governo, tais como Seguro Desemprego, Bolsa Família e aposentadorias. Todavia, essas cartas suplementares de crédito não ferem a Lei de Diretrizes Orçamentárias prevista na constituição. Dessa forma, Dilma foi condenada sem cometer crime. Assim, esse processo não pode ser compreendido como impeachment (que está previsto na constituição), mas golpe, pois, não há crime.
Por outro lado, esse golpe veio a contemplar os anseios de uma elite com mentalidade colonial, uma classe média fascista que ainda hoje não descobriu que é pobre e pobres trabalhadores insatisfeitos com os efeitos da crise econômica- muitos manipulados por uma mídia elitista e golpista (Leia-se Rede Globo, Editora Abril e Grupo Folha).
O grande problema de tudo são os efeitos do golpe, que já estão sendo sentidos na primeira semana do governo Temer. O governo do presidente interino vai retomar a utopia neoliberal. O primeiro passo é equilibrar as contas públicas, para isso não vai poupar a população de políticas de austeridade (leia-se cortes).
Os cortes já começaram por ministérios importantes como o da Cultura, que se fundiu com o da Educação - tendo como responsável o recém nomeado ministro Mendonça Filho do DEM (Democratas). O ministro quando em seu cargo de deputado foi um grande crítico ao Prouni e Fies, sendo que nunca escondeu suas posições conservadoras e meritocráticas para a educação. Outro ministério de extrema importância cortado pelo novo governo foi a Controladoria Geral da União, que visava transparecer o gasto público para a população e denunciar casos de desvio de dinheiro.
Mais cortes veem por aí. O novo ministro da saúde Ricardo Barros (PP-PR) já adiantou em entrevista coletiva, que para conter gastos em sua pasta: programas como o Farmácia Popular (que proporciona um valor reduzido de medicamentos para a população carente) e o SAMU acabam no mês de Agosto.
Em relação aos direitos humanos, esse foi ignorado e esquecido pela nova gestão. A pasta de Direitos Humanos, Mulheres e Igualdade Racial foi extinta, ou seja, mulheres, negros e minorias que já eram execrados, agora não mais terão a quem recorrer. Muitas coisas me fazem pensar sobre esse nebuloso momento, mas, o que me chama mais atenção são os resultados a curto prazo que toda a população pode sofrer.
A classe média batedora de panela por exemplo, que reclamava da carga abusiva de impostos- agora vai poder se deliciar com a nova política econômica do Ministro da Fazenda Henrique Meirelles, que já sinalizou aumento de tributos e possível retorno da CPMF para equilibrar as contas públicas. Talvez agora essa mesma classe média descubra que é pobre.
Aqueles que ficavam horrorizados pelos escândalos de corrupção da era petista (como se o PT tivesse inventado a corrupção no país), agora podem aplaudir o governo corrupto de Temer, que nomeou 7 ministros investigados pela Operação Lava Jato. O próprio STF arquivou denúncias graves contra o tucano Aécio Neves, a exemplo. E o juiz Sérgio Moro? O que aconteceu com ele? Acho que cumpriu sua missão e acabou com a corrupção no país, principalmente a dos petistas, mas, esqueceu a de seus amiguinhos tucanos. Afinal Moro é filiado ao PSDB e muita gente não sabe disso.
Aos LGBTs, Mulheres e Negros que apoiaram o golpe dou-lhes os meus parabéns, pois, estamos sem políticas para os direitos humanos. Talvez muitas mulheres que apoiaram esse processo acreditem que seja interessante ser apenas “bela, recatada e do lar” assim como a primeira dama Marcela Temer. Tanto é forte esse posicionamento, que o novo governo não nomeou nenhuma mulher aos cargos ministeriais.
Aos gays que apoiaram o golpe só digo uma coisa pintosas: Quando vocês apanharem na rua e não tiverem a quem recorrer não reclamem. Vocês plantaram isso, mais cedo ou mais tarde irão colher o resultado. O grande problema é que todos nós iremos sofrer as consequências da irresponsabilidade de vocês.
A pior tristeza de ser brasileiro no atual momento é presenciar a cegueira de sua população, uma população acrítica, imediatista, em parte egoísta e lamentavelmente dominada pelo discurso manipulador da grande mídia.
Política Fora do Armário, por Matheus Vieira
Historiador pela Universidade Estadual de Ponta Grossa UEPG- (2004- 2008). Especialista em Docência no Ensino Superior pelo Centro Universitário de Maringá- CESUMAR (2010). Mestre em História pela Universidade Federal do Paraná (2014). Matheus Machado Vieira também é parte do Núcleo Paranaense de Pesquisas em Religião — Nupper- UFPR. Atualmente é doutorando em História pela UFPR, onde desenvolve pesquisas relacionadas a questões de gênero e religiões Neopentecostais no Brasil.