God of War

Um jogo que soube envelhecer

Bruno Deolindo
Na Moita
6 min readApr 23, 2018

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Envelhecer é algo um tanto estranho, pois ainda possuímos os traços de quem fomos no passado, aquele senso de humor deslocado, aqueles gostos peculiares e até um pouco daquele mojo incompreendido, mas mesmo assim parecemos ser seres completamente diferentes, com motivos e ambições diferentes. Eu sei é uma reflexão estranha, que para ser sincero acredito que pouco tenha haver com maturidade, sabedoria e os demais etc. que se atribui ao avanço da idade e sim ao fato de enxergarmos nosso passado, talvez pela primeira vez na vida temos um total entendimento sobre nós, ao analisarmos nossos atos e refletirmos sobre quem nós fomos, quem nós somos, pela consequência desses atos e quem nós seremos, graças ao que ainda nos é possível mudar.

God of War tem sido exatamente esse pequeno prólogo acima na minha jogatina, ainda estou em processo de terminar o jogo e saboreando cada pedaço dessa excelente jornada. Mas é visível como essa sensação de tempo é algo bem relevante ao jogo, sendo quase um parâmetro de nós mesmos. Kratos ainda é Kratos, talvez numa explicação mais simples ele ainda é um monstro, pronto para lidar com qualquer ameaça de forma pratica, mas hoje ele indaga mais sua natureza, não foge dela mas pondera sobre ela, algo que nos ao envelhecermos tendemos a fazer. Ainda somos o mesmo ser de antes, mas mais racionais frente a nossas emoções e ciente das mudanças necessárias, por mais impossíveis que elas sejam.

O jogo compreende isso, honra seu passado, mas apresenta as mudanças necessárias, mesmo possuindo muitos pontos clássicos, como aquela jogabilidade fluida, com um sistema de combate delicioso de jogar e o mesmo modus operante de sempre, com puzzles, exploração e cenários grandiosos é uma besta completamente diferente. Um pouco abaixo vou ir falando sobre o que venho sentindo do jogo até aqui, mas não se preocupem que como todos os textos, esse Preview será algo tão abstrato como o parágrafo acima para não fornecer spoilers para quem ainda está jogando e talvez quem sabe empolgar alguns a jogar mais um excelente exclusivo do Playstation.

Uma das coisas que devo dizer mais vem me agradando no jogo é a história, mesmo sendo bem simples, por um motivo um tanto quanto estranho, ela até aqui independe de Kratos, claro que tudo que o Fantasma de Esparta fez não foi apagado e é impossível fugir do seu passado, mas a forma como ela se desdobra de certa forma não é apoiada nele, ao ponto de que se fosse um jogo novo do zero, com outros personagens pela forma como ela é colocada seria um ótimo jogo, mas ao ter o Espartano claro que tudo sobe de nível.

O jogo narra a jornada de Kratos e seu filho Atreus atravessando a terra nórdica, para espalhar as cinzas de sua recém falecida esposa na montanha mais alta do reino. Claro que uma jornada por toda a mitologia nórdica não poderia passar em branco e o jogo se apoia nisso ao trazer o máximo possível de referências dessa rica cultura, lugares, história, inimigos e todo o resto, criando uma das mais belas e acuradas representações já vista num jogo.

Isso mostra todo o cuidado do jogo em não ser uma simples continuação se apoiando em um personagem carismático, mas sim um jogo com uma ótima jornada que calha de ter um dos personagens mais populares dos últimos anos.

Mas não se engane, apesar dessa minha percepção esse é um God of War e Kratos é o personagem ideal para dar todo o peso necessário a essa ótima história, não só Kratos como seu filho Atreus, que é uma ótima adição ao jogo, a relação deles é um dos pontos mais altos do jogo, seja em combate ou na história, é interessante ver o velho e nada bom Kratos sendo ponderado por toda a inocência e imperatividade de seu filho. Cada dialogo, cada momento, cada interação entre os dois é de um realismo enorme, você consegue se identificar com os dois personagens, seus dramas, suas motivações, suas ações são todas relevantes e um acaba completando o outro de uma forma muito mais natural do que se imaginava.

Natural também acaba sendo todo o sistema de combate do jogo, um dos mais deliciosos que já joguei, ele consegue ao mesmo tempo ser fácil e completamente difícil de dominar, algumas ações e combos são relativamente fáceis de serem aplicados, enquanto outras ações requerem reflexos divinos.

Em comparação aos jogos anteriores toda a movimentação de combate é mais lenta que os jogos passados o que dá a falsa impressão de ser um gameplay mais pesado, mas não é, na verdade ele de certa forma passa o controle de toda a ação ao player, sendo você a definir o ritmo dos combates, pela mudança da câmera fixa anterior, para a câmera travada nos ombros de Kratos nesse, os combates se tornam muito mais pautados pela sua ação, você inicia os combates como quiser e na distância que quiser.

Tudo isso pautado pelo novo leque de truques do Espartano, dessa vez munido de um martelo, que pode ser atirado nos inimigos para congela-los ou derruba-los e recuperado a qualquer momento, abrindo um mundo de possibilidades de estratégias de combate. Porém não pense que ao jogar o martelo Kratos fica vulnerável, ele sabe muito bem resolver as coisas com seus próprios punhos ou caso necessário recorrer a ajuda de seu filho e suas flechas, que diga se de passagem como já falei é uma das boas adições do jogo, Atreus é vital em facilitar muitos combates, podendo distrair inimigos, enfraquece-los, paralisa-los, estonteá-los, serio o menino tem muitas opções de ajuda e prova a cada passo da jornada ser o herdeiro do Deus da Guerra.

Porém o mais divertido de todo esse sistema de combate é que é possível jogar como você quiser, seja sendo extremamente agressivo, dependendo exaustivamente do sistema de Parry (defesa e contra-ataque) do jogo ou jogando mais estrategicamente, pautando ataques, criando espaços e mantendo distância. Mesmo o jogo possuindo um grande número de inimigos e estratégias diferentes para lidar com eles o controle nunca sai de suas mãos.

A exploração do jogo também ficou de certa forma diferente, ela ainda contém os mesmos Puzzle de antes, na verdade até muito mais Puzzle do que antes, já que para abrir qualquer misero baú requer um certo gasto de massa cinzenta, mas até nesse quesito é engraçado depois de alguns baús abertos você já começa a pensar como os desenvolvedores do jogo e prever exatamente como passar pelos Puzzles, provando que o jogo possui um ótimo level design.

Mas a maior diferença mesmo na exploração se deve ao fato do jogo não ser mais linear, a saga passou a ser de mundo aberto, é possível explorar e descobrir pontos do mapa que nem são requisitos para a missão principal do jogo, mas que devem ser visitados pois apresentam suas próprias histórias, beleza e variedade de cenários, acrescentando muito a todo Lore do jogo, além claro de loots e materiais importantes, para confeccionar itens e armaduras, pois a evolução dos personagens é pautada por eles oferecendo uma espécie de sistema de RPG ao jogo. De certa forma você realmente se sente um explorador, atrás de recursos e materiais para melhorar seu Deus da Guerra tanto pai quanto júnior, para transformar a jornada a frente mais fácil.

God of War até aqui é um jogo que soube envelhecer, oferece até aqui uma jornada inegável e instigante pela mitologia nórdica, personagens com uma ótima química entre eles, um sistema de combate abrangente e uma exploração gigantesca. Sendo um jogo que entendeu tudo que no seu passado o definiu como um dos grandes sucessos da geração passada, porém não se manteve preso a esse sucesso e soube pautar o ímpeto de entregar mais do mesmo e se adequa dentro dessa nova geração de jogos, atualizando dinâmica, personagem e história, galgando passo a passo seu nome junto ao Panteão dos grandes jogos também dessa geração atual.

Gostou do texto? Então da uma moral e deixa umas palmas ai pra mais gente ler e também curtir.

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Bruno Deolindo
Na Moita

Um cara foda e humilde aos fins de semana andando por aí na rua da vida, enquanto escreve um pouco sobre o que o coração das cartas mandar.