The Last of Us — Parte II

Bruno Deolindo
Na Moita
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5 min readJun 23, 2020

Uma das coisas mais complexas de explicar para qualquer pessoa que não seja um aficionado por jogos é que jogos são uma expressão de arte, não como algo abstrato e intelectual só para as mentes mais elevadas, mas sim como um material rico a ser contemplado e absorvido, que possui uma estética de narrativa tão rica quanto a encontrado em coisas mais populares e bem mais aceitas como filmes, séries e livros.

Infelizmente muitas pessoas ainda se apegam a noção de jogos como entretenimento infantis, desprovidos de uma certa seriedade e relevância, afinal a maioria se lembra ou de correr com uma bola azul que diziam ser um porco espinho, ou pular na cabeça de inimigos com um personagem vermelho que entrava em diversos canos para salvar uma princesa. Mesmo aqueles que depois de muito convencimento jogam algo mais atual, movem seus dedos na tela de um celular para combinar doces ou se perguntam qual a razão de tantas danças nos jogos hoje em dia e acabam mantendo a mesma impressão de que jogos são um material infantil, banal e de menos valia.

Não que esses jogos não possuam seus valores ou até possam ser considerados “arte”, mas eles certamente não ajudam a melhorar o preconceito que muitas pessoas carregam de jogos não serem considerado um conteúdo maduro, já que muitos não veem que jogos possuem temáticas e públicos diferentes, como qualquer produto de entretenimento no planeta.

Felizmente sempre existem exemplos de jogos com uma temática mais realista, de narrativa forte, personagens envolventes e reflexões realmente profundas, o primeiro jogo de The Last of Us sempre salta a mente como um desses belos exemplos a ser citados, a envolvente narrativa da jornada de Joel e Ellie, por um EUA devastado após 20 anos do surto de um vírus misterioso e mortal é um dos jogos mais aclamados dos últimos tempos e muitos se perguntavam se um dia iríamos ver uma sequência a essa história e em qual formato ela chegaria e qual seria o impacto que ela poderia ter.

Felizmente, novamente, enfim tivemos a continuação dessa jornada e realmente ela vale a pena, todos os sentimentos adquiridos jogando o primeiro jogo continuam aqui e muitos mais são acrescentados, não omito são raros os jogos que conseguem colocar uma carga emocional tão grande quanto essa sequência consegue fazer, ela realmente faz você se questionar sobre inúmeras coisas ao decorrer dela, são inúmeras sutilezas que você vai percebendo ao decorrer do jogo e conforme a trama vai avançando é inevitável não absorver o impacto delas, infelizmente falar muito da história do jogo é um pecado pois talvez o mais divertido e apreciável do jogo, fora gameplay e etc. seja realmente passar pela jornada que ele lhe oferece e irei parar aqui esse assunto justamente para não estragar nada a ninguém, mas aqui temos com certeza mais um belo exemplo a saltar a mente.

No entanto jogos não são construído apenas pela sua história, jogos são jogos pela sua jogabilidade e se no primeiro jogo tínhamos um combate brutal e visceral, com uma IA realmente inteligente, momentos bem tensos e um jogo extremamente pé no chão, a sequência melhora absolutamente tudo.

Um dos aspectos que as pessoas desgostam de jogos é quão artificial é atirar inúmeras vezes na cabeça de um inimigo para matar ele, ou quedas absurdas e tantas outras irrealidades que novamente não irei negar existem em jogos, porem aqui a sequencia mantém a formula do anterior e os combates estão ainda muito mais brutais, realistas e fluidos e por mais que possa até incomodar algumas pessoas toda a brutalidade aqui tem propósito.

O Level design do jogo é um primor, todos os cenários são construídos com inúmeras formas humanas de se posicionar, contemplando aqui todas as formas de gameplay, seja um jogo mais contido e silencioso para executar todos os inimigos ou evitá-los completamente, ou seja, para um jogo mais agressivo, com táticas mais ofensivas não poupando uma simples alma enquanto seus recursos lhe permitirem.

Falar em recursos, Ellie, a personagem principal dessa sequencia, tem ao seu dispor um arsenal bem variado para aproveitar todo o terreno e uma movimentação muito intuitiva e realista, o novo sistema de esquiva dá uma opção a mais para combates, no entanto também coloca a personagem no tudo ou nada e em situações mais complexas, já que no calor do combate prestar atenção a apenas um inimigo pode ser fatal. Quando Ellie tem ao seu dispor todos seus recursos para combate ela é sem sombra de dúvidas o Apex Predator do jogo, uma força imparável.

Porem ênfase no quando “ela tem todos seus recursos” o jogo realmente não alivia lhe dando inúmeros recursos para usar, nem deixa você carregar o mundo em uma mochila. A exploração do mapa é algo extremamente vital e agradável de fazer, vital pois muitos itens precisam ser construido com os restos desse mundo decaído, ou melhorado com peças espalhadas e agradável pois todo o mundo do jogo é belamente criado possuindo um dos gráficos mais bonitos que já vi num PlayStation 4, fora que o jogo possui uma atenção absurda a inúmeros pequenos detalhes seja das pegadas na neve, a rastro em pântanos ou a movimentação pelo cenário. Não explorar todo o mapa do jogo é um pecado, são inúmeros puzzles de exploração para fazer, segredos para revelar que contribuem na criação narrativa do jogo e itens a coletar que podem ser perdidos com uma exploração mais leviana do cenário.

Sinceramente possuir os recursos ajuda muito a suavizar alguns dos inúmeros encontros do jogo, os inimigos possuem uma Inteligência Artificial bem bacana e a reação deles a suas ações são tão humanas quanto o possível, os tipos variados de inimigos em alguns encontros também acabam afetando a forma como você lida com eles dando uma dinâmica diferente a cada um desses encontros, que as vezes acontecem numa sequência frenética te deixando completamente extasiado ao fim, muito pela atmosfera do jogo, ela realmente consegue criar momentos bem tensos, praticamente te absorvendo e tirando um pouco da sua paz em alguns momentos conforme esses suados recursos vão sendo obrigados a serem usados.

The Last of Us — Parte II realmente é um belo jogo com uma narrativa rica, seja por seus diálogos, referencias e acontecimentos, com um gameplay afiado, sempre com o pé no chão e brutalmente realista, que culmina em uma atmosfera brilhante e um produto super refinado, talvez a maior prova possível de quão bons jogos são como entretenimento, recheado de situações tangíveis e elementos poderosos no decorrer de sua jornada.

Um jogo que apresentando todos os possíveis requisitos solicitados para convencer qualquer um que jogos são artes e um conteúdo relevante e mesmo que não os convença, pois pessoas gostam de discordar, no fim esse é um belo de um jogo e uma ótima jornada para ser apreciada por qualquer um e talvez seja uma pena que outros não cheguem a essa conclusão.

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Bruno Deolindo
Na Moita

Um cara foda e humilde aos fins de semana andando por aí na rua da vida, enquanto escreve um pouco sobre o que o coração das cartas mandar.