Daniel Borges
na calçada
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3 min readDec 3, 2022

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Dois de Dezembro

Tentei terminar três vezes esse texto hoje. E não vou conseguir, vai sem mesmo. Porque não é possível falar do que pretendo, numa tentativa de “resumir” (falta de respeito), rotular (audácia) ou decretar (jamais) o que ele é. Tudo bem que passou das 22h, é sexta (!). E o cansaço bateu - junto de umas cervejas.

Peço licença pra falar do Samba, neste Dia Nacional. Tema que não vivencio, mas admiro, escuto, leio e respeito demais, há mais da metade da minha existência. Sou um antes do samba e outro depois. Poetas e poetisas que muito me ensinaram ou me fizeram confirmar a realidade. A minha, dos outros e do país.

Ouça aqui: Vida Boêmia — João Nogueira (1978)

“Alguém sempre te socorre, antes do suspiro derradeiro”. Esse trecho é o meu favorito do refrão de ‘Agoniza, mas não morre’, do eterno Nelson Sargento. Uma definição, imagino — só imagino — do que seja a batalha secular pela existência das pessoas que o criaram, sua grande maioria preta e periférica. Que deixaram tudo seu ali: sangue, suor, lágrimas; A euforia, a idealização, a realização, o gozo: O samba.

De tantos bambas. Penso neles quase que diariamente quando boto pra tocar. Falo dos desconhecidos, dos que “não viraram”, dos que não chegaram no rádio. Dos que nós não soubemos nem existência, em tempos idos. Que comeram poeira na terra batida e pavimentaram com amor e persistência, pro amor à primeira vista com o carnaval e por fazer valer sua origem.

“[…]Se tu fores na Portela, gente humilde, gente pobre / que traz o samba na veia, um samba de gente nobre”, deu voz Monarco, de Madureira, da Portela (essa é papo pra outro momento, 100 anos completados), a essa pérola de autoria de Candeia, Manacéa e Alcides Lopes — “Eu Vivia Isolado do Mundo”.

Este disco é essencial. Clássico que retrata bem as desigualdades sociais. E sim tem política no meio, como tudo nessa vida, camaradas. Conheça aqui

“Ah, meu samba…Tudo se transformou. Nem as cordas do meu pinho, podem mais amenizar, a dor”, de Tudo se Transformou, de Paulinho da Viola, samba sangrado por desamor.

“Ai que vontade que eu tinha, de ter um carango joinha/ e morar na Vieira Souto ou em Copacabana. Aí que vontade que eu tinha, de ver minha linda pretinha, no porte, de uma verdadeira dama”, desabafou Jovelina Pérola Negra, um lamento em tom esperançoso de “Sonho Juvenil” — composição de Guará.

João Nogueira e Paulo Cesar Pinheiro. Posso falar sem medo que ajudaram a me forjar do jeito que tô — se deu bom, não sei.

Clara Nunes. Difícil, mas escolhi a minha canção favorita, talvez meu samba favorito. Ouça aqui.

E Moacyr Luz, meu professor mais recente, da disciplina em “Reconexão com a Música no Pós-pandemia”. Fiquei sem ouvir música praticamente todo 2020 e 21, nada me fazia, se desse o play a tristeza vinha pelo aprisionamento. É um gênio do riscado que precisa e merece mais e mais reconhecimento nacional.

Aos mestres e mestras, com carinho. E a benção. Impossível citar todos, o que vale é que os carrego em mim. É dia de todos vocês também, só agradecer.

Viva Aldir Blanc! Uma porrada incurável que a pandemia acertou em cheio. Aqui vai uma dele, cantada por ele.

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