História de um casamento: entre excessos e sutilezas
Certo professor que tive dizia não assistir a filmes porque, quase sempre, revoltava-se com o fato de as histórias serem contadas de forma a nunca permitir que o espectador pudesse ter uma postura mais ativa. Para ele, tudo é sempre mostrado de forma óbvia demais, como se quem assiste ao filme precisasse ser o tempo inteiro conduzido na trama. Radicalismos à parte, o cinema vez ou outra — ou na maior parte do tempo -, comete esse deslize. E isso tira um pouco do fascínio de uma narrativa.
De certa forma, isso aconteceu comigo ao assistir a História de um casamento, filme da Netflix dirigido por Noah Baumbauch, que lidera o número de indicações ao Globo de Ouro (seis no total), premiação que ocorre neste domingo (5). A minha opinião pode ser meio polêmica, visto que tenho me deparado com comentários sempre muito elogiosos à produção, que considero sim ter grandes méritos. Basicamente, o roteiro mostra a separação de um casal e como esse divórcio evolui de forma tão negativa, chegando ao ponto de se tornar uma briga suja de advogados oportunistas.
A simplicidade da história é, para mim, um ponto alto, em tempos de grandes plots twists e uso demasiado da computação gráfica (nada contra). Não convém, inclusive, ter receio de spoilers, já que, desde o início da trama, sabemos que Nicole (Scarlett Johansson) e Charlie (Adam Driver) estão se separando. Portanto, este é um filme sobre o desenrolar deste divórcio e nada mais. E, como falei antes, a simplicidade da história é um mérito, inclusive por explorar ao máximo o desempenho dos atores. Contraditoriamente, é exatamente o ponto em que percebo a maior fragilidade do filme.
Adam Driver entrega uma atuação na medida: o diretor de cinema organizado, um pai esforçado, um marido aparentemente correto, mas que, no fundo, acaba apagando a esposa. Charlie é, assim, na maior parte do tempo um sujeito controlado, mas que acaba tendo seus momentos de explosão sentimental, inclusive ao cantar suas dores diante dos amigos do teatro (cena brilhante).
Por outro lado, a Nicole interpretada por Scarlet Johansson parece estar um pouco mais fora do tom. E é exatamente aqui que percebo o maior problema de História de um Casamento. Como a protagonista da história é uma atriz, em vários momentos do filme as cenas parecem servir para enaltecer o desempenho da intérprete de Nicole — talvez isso explique a indicação de Johansson ao Globo de Ouro. Isso não quer dizer que ela não tenha bons momentos, até por já ter demonstrado ser uma atriz fora da curva, mas o fato de a personagem também atuar deixou-me com a pulga atrás da orelha sobre a factibilidade de cenas como o monólogo de Nicole diante de sua advogada ou o momento em que canta e dança com a mãe e a irmã.
Por mais que se possa contra argumentar com o fato de ela ser atriz e, talvez por isso, mais afeita ao drama, particularmente, creio que isso acaba contaminando a visão que poderíamos ter sobre a interpretação de Johansson. E se Nicole fosse professora ou médica? Será que se comportaria do mesmo jeito? Nunca saberemos, pois, nessa história, ela é uma atriz! Não quero dizer com isso que Scarlet Johansson não merece sua estatueta do Globo de Ouro, só não sei ao certo se deveria ganhar por esse papel. Se fosse para apostar, seria no Adam Driver (também indicado a Melhor Ator de Drama).
Especulações à parte, História de um casamento é um filme sensível, principalmente quando deixa um pouco de lado a dramaticidade exacerbada e aposta na sutileza, como na cena final, esta sim digna de muitas lágrimas mal disfarçadas.
P.S: Laura Dern, indicada ao Globo de Ouro de Melhor Atriz Coadjuvante, está maravilhosa no papel da advogada Nora Fanshaw, com destaque especial quando fala da cruel visão que a sociedade tem sobre a maternidade.
