Vender notícia é o grande negócio do jornalismo

Poliana Ribeiro
NARRATIVA
Published in
4 min readFeb 14, 2019

Mesmo diante da aparente concorrência da informação livre e gratuita da internet, a força e o valor do jornal está no comércio da notícia

Sites de notícias de jornais e revistas começaram a restringir desinibidamente o acesso ao seu conteúdo. A expectativa é garantir o engajamento de assinaturas. Folha de S. Paulo, Estadão, Superinteressante, Cult e outras marcas seguem esta linha. Parece-nos que isto se manifesta por uma confluência de razões. Como a ideia é apenas iniciar o diálogo, destaco cinco:

1. Estabilidade no domínio das mídias:

Após anos e anos de rivalidade com a internet e sobressaltos quanto às suas possibilidades rentáveis, os meios eletrônicos tradicionais já se adaptaram perfeitamente ao ambiente virtual e investiram nas estratégias de controle das mídias digitais. O processo assustou muita gente e tomou, por anos, os campos de ansiedade destrutiva nos corações dos jornalistas.

2. A limitação dos pequenos empreendimentos:

Fazer um blog? É fácil. Atualizá-lo frequentemente? Exige trabalho e dedicação. Garantir sua rentabilidade? É sonho de todo bloger / vloger. Competir com grandes capitais? Silêncio. Nas últimas décadas, as pequenas iniciativas digitais mais interessantes passaram a ser incorporadas — ou copiadas — por grandes sites de notícias.

A questão é que estes, com sua grande estrutura e representatividade — o que não quer dizer legitimidade, parecem ter descoberto novos modos de negócios — além da propaganda visual — para se manter economicamente e para investir em seu aprimoramento, em vez de ficar chorando miséria.

A máxima financeira se confirma mais uma vez: Dinheiro faz dinheiro. Diante disso, o blogueiro está ali, ilhado, indo atrás dalgum fuxico, tentando fazer uma crítica, refém das grandes estruturas no mundo da internet e sem saber como ganhar dinheiro.

3. A redescoberta de si no jornalismo:

Os sites de notícia lembraram — nalgum momento — que exclusividade e qualidade sempre foi o fator de venda no jornalismo. O que se expressa na máxima de Jonh Locke: Conhecimento é poder. Na verdade, não haviam esquecido, mas deixaram de lado.

Com o domínio de novas mídias e a versatilidade dos modelos de negócios, os grandes empreendimentos estão agora no caminho de consolidar a sua maior arma: o conteúdo jornalístico profissional, produzido segundo um modus operandi que deixa qualquer pequena iniciativa desanimada.

Os jornais e jornalistas dominam as técnicas narrativas há dois séculos. Produzir conteúdo de qualidade e principalmente exclusivo, exige não apenas disposição, mas além de um manual técnico, disposição, tempo e calos que apenas a experiência pode lhe fornecer. Se meu conteúdo é bom, se meu site é confiável, o anunciante vê com bons olhos.

Este nível de profissionalidade é algo que se espera de um jornal ou de um site de internet, o que garante a sua legitimidade e algo que o grande iceberg virtual da Internet não tem. Por isso, o maior desastre no jornalismo é o erro de informação. Errar no jornalismo é a rachadura no vaso colocado à venda na vitrine. Ou seja, é descrédito. Pior, é mentira. E ao falarmos de mentira, chegamos à quarta e penúltima razão.

4. Num mundo das fake news, quem surfa na crista da verdade é rei:

A consolidação do discurso contra as fake news reconfigura a situação dos grandes meios, que têm a tradição ao seu favor. É porque trabalham com informação há séculos que os jornais podem se vender como produtos de qualidade e exclusividade. E quando vivemos em terras linguísticas de desinformação e boatos? Nosso produto se supervaloriza.

O uso político das fake news parece ter sido a cereja no bolo para garantir o fortalecimento da grande mídia. O público já está mais maduro, e é claro que todos ainda temos aqueles tios que acreditam em qualquer notícia repassada pelo WhatApp. Há ainda quem clica no link de vírus, e isto porque a educação para a mídia é um caminho oportuno e que tenho começado a trilhar nos últimos anos — aguardem novidades.

(Por fim — enfim, o texto ficou longo demais — peço desculpas, amigos -)

5. A reconfiguração do modelo de assinaturas e da publicidade:

A possibilidade de se cobrar pequenos valores por assinatura de um pacote de serviço mensal, técnica que começou a ser testada nos aplicativos e softwares, foi a solução para o gargalho de crescimento de público dos sites de grandes veículos de comunicação. Sim, crescimento de público, não apenas de rentabilidade.

Dificilmente um meio de comunicação tem lucro com seu conjunto de assinaturas. E por que cobram? Ora, pela exclusividade, como já foi dito. A maior conquista capitalista no jornalismo é a conquista de público, de audiência. Se você tem um público organizado, direcionado, interessado em seu conjunto de serviços, você tem influência sobre um grande conjunto de pessoas. E é isto que o jornalismo profissional sempre vendeu e o que sempre possibilitou sua fórmula de negócio.

O que ele vende é a sua influência sobre o público e ganha espaço de negociação para a venda de propaganda comercial — e, principalmente, para a propaganda ideológica.

Adotar a política monetária da assinatura módica é um caminho rentável, porque você inverte a lógica dos comerciantes apressados — ganhar muito com pouco. A expectativa dos grandes sites parece ser garantir um grande público pelo baixo custo mensal e manter receita que tende a crescer em um ambiente em crescimento, cheio de potenciais consumidores — ganhar menos com mais.

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Poliana Ribeiro
NARRATIVA

Jornalista e professora, mestra em Cultura e Sociedade (PGCult — UFMA). Especialista em Jornalismo Cultural (UFMA). Graduada em Jornalismo (UFMA).