Saudade de não precisar mais me despedir

Daniel Muñoz
Nativo Estrangeiro
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3 min readJun 8, 2018

Todo dia acordando tão rápido, mantendo essa cruel saudade de dormir. E é horrível ter saudade, o querer evocar algo que não pode estar do seu lado. E quando a gente tem muito pouco de algo, a saudade bate antes da despedida até. Feito o sono que reclama do horário já cinco minutos antes de você acordar.

Feito a raiva de ter que pausar a série que você assiste tomando café da manhã, simplesmente porque olhar a mesma parede todo dia não faz mais sentido. A saudade dos chinelos de casa quentinhos, que bate alguns segundos antes de você pensar em tirar o sapato da sapateira.

Das camisas para vestir que não deu para sentir saudade ainda — você anda vestindo elas demais. Do trem tão odiado, não imagino que um dia consiga sentir falta. Dos primeiros raios de sol, com certeza, tão curta a parte do caminho em que posso vê-los.

Muitos verdes na longa caminhada, mas sem tempo de conhecer nenhum deles um pouco melhor. Abre porta, mala na cadeira, comida na geladeira, senta e segue sua vida. Aquela vida guiada pela maldita pressa.

E enquanto as mesmas cores e palavras dançam no cabaret mais sem graça da tela de um computador, eu espero pelas suas mensagens. Não me leve a mal, não que a vida realmente não tenha graça nenhuma, mas é uma comparação no mínimo desleal, comparar qualquer coisa que possa cruzar meus olhos naquela mesa com o brilho do seu sorriso enquanto ainda completamente adormecida me dá o seu tchau diário.

E falamos do chuchu, e da cereja. E eu penso nisso toda hora, todo dia. Eu conto os minutos por cada interação, amando cada mensagem ao mesmo tempo que esperava por uma interação direta. Lembrando que eu tenho você para quando eu chegar do fim do meu dia de vida, para assim finalmente viver de verdade.

Porque embora o mundo exista lá fora, a minha saudade sempre mora contigo. Afinal cada momento é uma lembrança do último e um desejo pelo próximo.

Talvez seja tudo parte do meu jeito obsessivo de fazer tudo nessa vida, até de amar. Porque o meu amor por você também vem com o turbilhão de adendos e apêndices, como os livros que ninguém além de nós ama ler.

Porque dentro do coração mais cético do mundo, que clama por um segundo de fé na luz da Lua, que eu só passei a ver como deveria depois que você me ensinou, o amor alimenta-se muito com a certeza da possibilidade de ver o mundo com olhos de tamanha grandeza como os seus.

Porque contigo a única certeza que eu preciso é que há vida após a vida. E que seu amor é tão real em cada suspiro de sono, como em cada mensagem de amor, mesmo em mensagens de repreensão e lembrança de compromisso de tarefa doméstica.

Em cada segundo que você perde cuidado da causa perdida que sou eu, eu desejo mais a vida que eu posso ter contigo, sempre tendo saudade, porque o mundo doente em que vivemos, não deixa que estejamos juntos mais do que o limite da vida nos permite.

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Daniel Muñoz
Nativo Estrangeiro

Um dia jornalista, hoje historiador. Escrevo só sobre o que quero e quando acho que tenho algo a dizer. Para mim é importante a diferença entre Ochs e Dylan