Porque gosto de Haruki Murakami

Felipe Massahiro
Nerd / Articles
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4 min readOct 19, 2015

Seu estilo é peculiar, suas histórias são bizarras e gravitam no limite do realismo fantástico. Haruki Murakami é um dos escritores japoneses pop mais famosos internacionalmente.

Sento um apreciador da literatura japonesa (também estudo um pouco a estrutura narrativa na literatura do Japão), não tinha como não cruzar com o nome de Murakami.

Quando eu li pela primeira vez uma obra dele “The Wind-Up Bird Chronicle,” foi um deleite de sentimentos que beiravam o bizarro com o fantástico. Murakami não tem medo de mostrar o extraordinário, o estranho e o impossível. Após ler “Hard Boiled Wonderland and the End of the World,” “A Wild Sheep Chase,” “Dance, Dance, Dance,” “Kafka on the Shore” e os contos maravilhosos organizados em “Blind Willow, Sleeping Woman” nota-se claramente o estilo peculiar do autor no realismo fantástico.

As histórias de Murakami sempre são regradas de sensualidade, mistério e sobrenaturalidade. Há, pelo menos nas obras que li, uma procura incessante e um estudo em relação ao amor e ao relacionamento entre as pessoas. Em sua maioria é uma busca do ego do personagem central refletido nas relações que faz ao longo das narrativas.

Poderia ser um thriller psicológico tradicional, mas não há uma coisa sequer peculiar nas obras do Murakami. Seus personagens são psicologicamente degenerados, ou simplesmente alheios à vida real; em outras palavras, são personagens inusitados de perfil único. Seja uma garota chamada May que está ligada a morte ou um alter ego preso no fim do mundo, ou até mesmo um homem vestido de ovelha, as características peculiares dos personagens do universo de Murakami dão ar único às suas histórias.

Outro fator comum entre as obras do autor é o clima. Muitas vezes é possível imaginar um cenário melancólico, um tanto cinzento. O personagem central normalmente é um homem comum que tem certo apreço pela solidão.

Além disso… música. O autor usa e abusa de referências musicais, o que não é surpresa, já que seu gosto o fez abrir, junto à sua esposa Yoko, o bar de Jazz Peter Cat, homenagem ao gato do casal.

O estilo sem pudor e sem qualquer preconceito, faz com que suas histórias, ainda que tenham teor sobrenaturais, mais críveis e em certos aspectos, uma identidade única.

Há muito sexo, sensualidade e mistérios com o pé mais no impossível do que no mundo real.

Apesar de seu sucesso, Murakami ainda é um excluído da academia literária do Japão. Talvez seja justamente por seu estilo sem reservas ao imaginário e a temas como sexo e sexo com parentesco — em “Kafka on the other shore”, por exemplo, o personagem é “condenado” a dormir com a mãe.

Norwegian Wood

Recentemente li “Norwegian Wood” e, assim como a crítica, é um livro que difere muito do estilo tradicional do autor.

Nomeado como a música dos Beatles, “Norwegian Wood” é tido como, em partes, uma obra autobiográfica do autor.

Murakami nega, dizendo que se inspirou em sua época de faculdade para contar sobre a rotina do protagonista. O autor ainda complementa dizendo que a obra foi um desafio para ele, já que nunca havia escrito uma história simples e direta.

De fato em “Norwegian Wood” não há a complexidade e mistério envolventes de suas outras obras, mas sim uma história de amor entre um casal de amigos que têm a morte como um elemento que desencadeia uma série de acontecimentos em suas vidas. Enquanto Toru segue sua vida tentando se aproximar de Naoko, esta afundada em uma personalidade introspectiva, tenta expressar seus sentimentos sem sucesso.

Poderia ser apenas mais uma história de amor, mas nas mãos de Murakami, a história ganha um ar sombrio e melancólico. Ainda que não exista o sobrenatural, a ambientação beira o realismo fantástico.

O livro fez tanto sucesso que surpreendeu o próprio autor, chegando inclusive a ter uma versão para o cinema.

Mesmo com tudo isso, Murakami, sempre nomeado ao Nobel de literatura, nunca recebeu o prêmio. Talvez as análises estejam certas e a falta de crítica política em suas obras não o deixem conquistar a premiação. Mas algumas de suas histórias, como o próprio romance “The Wind-Up Bird Chronicle,” relatam em detalhes os cenários da segunda guerra.

Contudo, a premiação é uma mera formalidade. Sendo um dos escritores atuais mais lidos no mundo, Haruki Murakami é um autor de estilo único, que pode agradar veementemente ou proporcionar uma intensa repulsa nos leitores. Ainda assim, o autor é um exímio storyteller do realismo fantástico, no cenário pop e que mistura a sensualidade e a música, sem qualquer medo ou preconceitos.

As obras de Murakami refletem um lado sombrio e introspectivo que cada um de nós possui. O desejo de isolamento, a procura incessante por algo que se mostra uma realidade completamente oposta e, acima de tudo, ele mostra como as relações que temos uns com os outros pode desencadear uma aventura surreal, por mais ordinárias que sejam nossas vidas.

Haruki Murakami no Brasil

No Brasil uma série de livros do autor podem ser encontrados para vender em praticamente todas as livrarias.

As obras são traduzidas pela editora Alfaguara. Não sei como está a qualidade dessas traduções — eu li todas as obras em inglês, já que em muitas delas o próprio autor chega a dar uma olhada em como ficou o produto final.

Mesmo assim, é uma excelente oportunidade, especialmente atualmente em que a literatura japonesa vêm ganhado mais força em nosso mercado. Haruki Murakami, dos escritores contemporâneos e de que tenho conhecimento que ganhou tradução nacional, para amantes do estilo de realismo fantástico, é uma excelente dica.

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Felipe Massahiro
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Jogador compulsivo, escritor obcecado, amante perturbado da literatura e jornalista de vez em quando.