Review — Sense8

Felipe Massahiro
Nerd / Articles
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6 min readJun 7, 2015

A nova série dos irmãos Wachowskis (The Matrix) e J. Michael Straczynski (Babylon 5) inaugurou com sua primeira temporada no Netflix. Fiquei intrigado com o trailer e, após assistir aos 12 episódios de aproximadamente 55 minutos cada, gostei bastante do que a série ofereceu e do que ainda pode oferecer.

O que me chamou a atenção foram os criadores da série. Com nomes de peso no cinema e no mundo dos seriados sci-fi, já imaginei coisa boa, mas não é exatamente como acontece.

Sense8 conta a história de 8 pessoas que podem se comunicar, interagir e compartilhar memórias entre eles. Espalhados pelo mundo, cada personagem possui seus próprios conflitos, enquanto uma trama de perseguição aparentemente deve unir a todos.

Esse estilo lembra bastante Heroes e a forma como a história é destrinchada, lembra o inicio de Lost. E talvez seja esse o problema com a série. Apesar dos cenários maravilhosos de diversas partes do mundo, a história se desenvolve de uma forma muito lenta e, nos primeiros episódios, bastante confusa.

É compreensível esse desenvolvimento lento, já que são 8 personagens principais que estão separados não apenas geograficamente, mas também por culturas diversificadas. Contudo, esse também é um dos problemas com a série. Quando lidamos com muitos personagens centrais, fica difícil criar profundidade entre eles, especialmente quando apresentados simultaneamente na história. Alguns personagens acabam se destacando, outros nem tanto e, pior ainda, há aqueles que simplesmente ficam perdidos. Isso gera uma superficialidade, não compreendemos os motivos de cada um deles e como lidam com seus poderes. Por exemplo, a indiana Kala e o alemão Wolfgang, uma é química farmaceutica e o outro um hábil ladrão. Quando ambos descobrem seus poderes de sense, lidam com tamanha naturalidade e velocidade que perto do policial Will, parece artificial de mais.

Outro grande problema é a maneira como a trama central, de que estão sendo caçados por uma corporação, fica em torno de apenas 3 personagens, enquanto o resto deve lidar com problemas pessoais em cada local em que vivem. Enquanto o queniano Capheus luta para ajudar a mãe aidética entrando em conflitos tribais, o mexicano Lito tenta conciliar sua carreira como ator de filmes de ação e o fato de esconder ser homossexual do resto da sociedade, a coreana Sun que fica entre a promessa que fez a mãe de ajudar o pai e o irmão e fazer o que é certo, a indiana Kala que deve se casar com um homem que não ama e o alemão Wolfgang cujo passado o faz tomar atitudes extremas, o policial Will dos EUA, a hacker Nomi também dos EUA e a DJ Riley da Inglaterra acabam se envolvendo na trama principal com Jonas, um outro sense que deveria servir como guia, mas acaba preso pela organização que caça os senses.

Isso da um panorama geral do conflito de cada um, ainda que seja interessante abordar assuntos que discutam a homossexualidade, como o caso do Lito e da transexual Nomi, há um certo exagero no apelo em relação a sexualidade. Não são poucos os episódios em que ocorra uma cena de sexo, tanto com Lito e o namorado, Nomi e a namorada ou Wolfgang e alguma mulher. Acho interessante incluir a sexualidade dentro da série, mas em exagero, já não sei se é tão bom. Tanto é meu questionamento que liguei o sexo com os casais homossexuais da história, isso porque, tirando o conflito de Lito que quer esconder sua opção sexual e o namorado da mídia, a maneira como a Nomi e a namorada lidam com o assunto é tão artificial e ofuscada por cenas de sexo e sensualismo que parecem excessos a trama. Apesar disso, a relação de Nomi tem um lado interessante, o estereótipo do casal apaixonado que faz tudo um pelo o outro é representado por elas, o que proporciona uma abordagem bem diferente.

Não quero fazer a série parecer ruim, pois ela está muito longe disso, caso contrário eu não teria assistido todos os episódios da primeira temporada. Esses aspectos negativos em relação a profundidade dos personagens, seus agentes motivadores para aderirem a trama da série e o desenvolvimento narrativo lento, convergem para alguns momentos altos que se intensificam após 6 ou 7 episódios. Contudo, cada um deles revela algo que faz com que você queira assistir o próximo, a revelação ou o uso do poder entre eles traz alguns benefícios que gera curiosidade para que as pessoas continuem assistindo a série até esse ponto dos grandes conflitos. O que é muito bom, mas não é só.

Vejo a presença de muitos dos personagens, seus conflitos não muito críveis, apenas como peças para continuidade da trama, um exemplo é quando o queniano se vê em perigo e a coreana Sun toma a posse do corpo de Capheus e luta contra os inimigos. Então, inicialmente, muitos desses personagens parecem simplesmente existir por causa de seus conhecimentos, fazendo com que suas histórias sejam secundárias, mas em algumas discussões que se passam — e isso eu achei bem legal — são as questões mais dramáticas de como os problemas de uma pessoa em uma parte do mundo, não são tão diferentes de outra. Outra questão é o que ser o ser humano. Essa busca pela identidade de cada um deles, de descobrirem o que querem e aceitarem o que são, não como senses, mas como pessoas, leva um pouco de vida e credibilidade a eles, ainda que demore a acontecer.

Logo, gostei bastante da série. A premissa de pessoas conectadas umas as outras carrega uma certa criatividade exótica em tempos de seriados de super heróis. As discussões filosóficas, ainda que ocorram poucas vezes, as críticas, mesmo quando clichés, trazem um pouco de reflexão e um conteúdo que, analisado um pouco mais a fundo, deixa a série interessante. Outra coisa maravilhosa dessa série são os cenários, muito bem escolhidos e apresentados, a direção de alguns episódios ficaram simplesmente fantásticas. Também devo destacar a forma como um sense interage com outro, essa maneira de hora vermos um personagem assumindo o corpo do outro, ou conversando com o outro, ficou bem interessante. No início parece confuso, muito até, mas eu tomo essa confusão como a forma que o próprio sense se sente nas primeiras vezes que isso acontece. Você fica desnorteado como ele.

Ainda que esses lados positivos existam, os aspectos negativos como a trama com um desenvolvimento muito lento, a superficialidade de alguns personagens e uma confusão em como a história é contata, pode afastar algumas pessoas da série. Essa flutuação me pegou muitas vezes. Haviam momentos em que eu queria saber mais sobre um personagem, o bastante para me direcionar ao próximo episódio, mas lem outros, simplesmente assiti sem compreender que significado aquilo teria para a trama.

Felizmente, ou nem tanto, após os 6 primeiros episódios que assisti direto, as coisas começam a se encaixar, a série toma um ritmo mais dinâmico e mais voltado para a trama central, passa-se a descobrir um pouco mais quem são os sense, mas deixa muitas dúvidas, suficientes para querer assistir a próxima temporada. Talvez por essa temática bastante peculiar e criativa que me lembra muito o filme Babel (2006), com um ar de anti heróis, a série tenha me agradado bastante.

Sense8 tem muitos defeitos, muitos problemas e com certeza não é uma série que irá agradar muitas pessoas, mas eu vejo essa ousadia dos diretores e o resultado dela como uma pedra preciosa em tempos em que poucos seriados saem de fórmulas. Heroes foi um seriado em que a forma como a narrativa foi feita, escondia uma história fraca, mas que mostrava um grande potencial. Espero que o potencial que Sense8 mostrou não caia no mesmo abismo que aconteceu com Heroes e que os últimos episódios dessa primeira temporada, guiem os próximos, pois foram muito bons. Talvez a regra que se aplica aqui é de que, para as coisas boas, vale a pena esperar… nem que para isso sejam necessários quase 6 episódios.

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Felipe Massahiro
Nerd / Articles

Jogador compulsivo, escritor obcecado, amante perturbado da literatura e jornalista de vez em quando.