Vamos salvar a economia! Mas a troco de que mesmo?

Um questionamento sobre a contrapartida que está sendo oferecida aos brasileiros nesse momento crítico

Olá. Para quem não meu conhece meu nome é Jussara, tenho 33 anos, e a despeito de terem me desenganado já nos primeiros momentos de vida estou sobrevivendo esse tempo todo, ainda que sofrendo com diversas questões de saúde. E a minha é uma das vidas que alguns de vocês estão dispostos a sacrificar pra manter a economia “girando”.

Euzinha na foto de tempos de quarenta. A carinha é de criança mas a imunidade é de idosa :P

Sabe não estou aqui pra chocar ninguém nem pra cair em nenhum preciosismo. Não me acho melhor que ninguém, se eu achasse que a humanidade ia ser salva se eu morresse eu ia pensar no assunto, mas sabe como é: foi muita briga pra sobreviver, muito dinheiro gasto, muito tempo estudando pra vir um governante e dizer que se algumas pessoas como eu morrerem pra salvar a economia está tudo bem, já que assim a população vai ter em troca…. vai ter em troca o que mesmo?

Na verdade quando fez o discurso o presidente não pensou em mim, e só mencionou idosos. Talvez tenha falado algo sobre grupo de risco, mas eu admito que nem vi o discurso todo pois estava tentando me distrair estando em outra cidade pra fazer um exame importantíssimo no dia seguinte.

Grupo de risco quando falamos do COVID-19 na verdade é uma parcela bem grande da população. Idosos eram 28 milhões ou 13,5% do total da população em 2017 (segundo essa noticia já um pouco antiga com dados do IBGE), outro fator bem importante tem sido relacionada a doenças respiratórias graves, segundo dados do IBGE também de 2016, pessoas com doença pulmonar obstrutiva crônica atingiam cerca de 7 milhões de pessoas nessa época (podendo neste grupo conter idosos). A quantidade de imunosuprimidos eu não consegui achar, são pessoas que fazem tratamento com quimioterapia ou corticoides (remédios amplamente utilizado para tratamento de alergias, inflamações e doenças autoimunes) por exemplo, mas acho que já deu pra entender a ideia.

Esses são os grupos de pacientes com maior chance de morte ao que se sabe até agora, mas ainda existe outra gama grande de pessoas que com certeza vão apresentar complicações graves que também podem levar a óbito que tem a ver por exemplo com doenças graves que acometem o trato respiratório, e outros órgãos afetados pela doença.

Vejam, o vírus não achega avaliando ficha médica nem data de nascimento no RG pra escolher quem vive ou não, muitas pessoas estão em grupo de risco e nem sabem por desinformação ou falta de acompanhamento médico adequado. Um doença autoimune rara como as que eu tenho (sjögren e hepatite autoimune) demoram em média de três a cinco anos para serem devidamente diagnosticadas. E velhice não é doença, é apenas um processo comum do corpo que pode funcionar bem diferente para cada pessoa.

E é importante dizer que o vírus por ser similar a gripe…. na verdade os médicos tem comparado mais com uma pneumonia grave, mas vamos continuar assim pra seguir a linha de raciocínio. Por ser similar a gripe o vírus se espalha rápido e pode sofrer “mutações”. A cada nova pessoa e novo ambiente em que ele se espalha pode adquirir características novas e com isso os grupos de risco podem ainda mudar e mesmo aumentar.

Sem testes suficientes para saber quem pegou ou não, com uma quantidade de respiradores risível em cada centro de saúde, e uma estrutura que atualmente mal atende quem precisa de atendimento básico vamos enfrentar em breve uma situação caótica nos hospitais.

Então quando nos expomos à pessoas infectadas estamos todos nos colocando em um tipo roleta russa. E pessoas como eu tem mais balas e menos espaços vazios a disposição.

Mas parando de analogias e números vamos as ações práticas e implicações de ficar em casa: Muita gente está insegura com a falta de emprego e possibilidade de renda com o baque econômico que vamos sofrer. Na verdade, já estamos sofrendo…

Mil coisas já rolaram no mercado financeiro desde que a pandemia começou a se espalhar, várias tretas com a bolsa, variação de câmbio e tudo mais. Coisas quem que não vou entrar no mérito mas importante saber que mesmo as pessoas mais ricas do mundo estão inseguras com os prejuízos que elas vão ter nos próximos meses.

Serviços essenciais não podem parar e na verdade estamos numa corrida contra o tempo para disponibilizar tratamento adequado para as pessoas que vão ainda vir a serem infectadas.

Vi muitas mensagens questionando a coragem de quem vai continuar m casa nesse cenário. Afinal se os médicos e profissionais essenciais não podem porque a gente poderia? Não podemos também deixar os empresários na mão sem lucro pois assim eles não vão ter como gerar empregos, etc.

Mas assim mesmo se isso tudo fosse verdade (e eu definitivamente não acredito em nada disso) o que a gente está ganhando se arriscando dessa forma?

Eu, por exemplo, não pude esses tempos em isolar totalmente mesmo sabendo dos riscos pois tinha uns exames urgentes pra fazer. Felizmente consegui me locomover sem transporte público muitas vezes e quando precisei tinha pouca gente neles. Quando menos pessoas num ônibus menos chance de eu ser infectada. Quando vocês ficam em casa eu ganho, porque eu não tenho escolha.

E por exemplo até é possível dividir alguns espaços de forma menos arriscada com equipamento adequado. Várias pessoas já aderiram ao uso de máscaras e álcool gel. Agora.. o governo se comprometeu em oferecer esses equipamentos à população? Enquanto dizem que vão fiscalizar preço de álcool no mercado tem hospital fazendo campanha pois o deles já está acabando.

Falta máscara, respirados e álcool gel pros médicos e enfermeiros quem dirá pra quem vai continuar trabalhando em lojas e fábricas.

O remédio que estão prometendo ajudar a curar o COVID-19 entrou em falta nas prateleiras no primeiro dia da notícia deixando pessoas que faziam uso continuo dele como eu a mercê e uma piora e maior sensibilidade a infecções.

A maior das pessoas que compraram máscaras compraram a máscara errada e tem muita gente produzindo máscara de pano achando que isso vai salvá-las. Mas ai colocam uma dessa no rosto e vão trabalhar em lugares fechamos cheios de pessoas que podem ser infectadas.

Não existe como conter a pandemia e nenhum governante nem tem demonstrado nenhum esforço em mentir, ao menos nessa parte.

Agora eu pergunto como vocês acham que vão conseguir salvar os idosos e pacientes de risco que estão em casa, isolando eles de tudo e todos se todo o resto das pessoas vai continuar sua rotina como se nada tivesse acontecido. Já pensaram em como vocês vão fazer isso? o governo já deu alguma solução pra isso?

O governo atual mal consegue deixar de fazer aumentar o desemprego, não resolveu epidemia nem de dengue ou sarampo (ou ao menos demonstrou preocupação com isso), ta faltando vacina até pra h1n1, os portais que tinham informação sobre HIV-aids foram tirados do ar, e vocês acham mesmo que quando eles pedem o sacrifício da gente vão dar algo em troca?

Ao menos nem estão se dando ao trabalho de fingir que vão tentar. O problema é que nós não estamos nos perguntando e nem cobrando essa contrapartida.

A renda mínima é o básico do básico e os governadores tiveram que se reunir à revelia do governo federal para proporcionar isso pra população. Ainda falta garantia de atendimento, equipamento necessário, planos de mitigação de riscos, garantia de atendimento de outras condições de saúde, taxação de grandes fortunas pra propiciar orçamento para viabilizar isso tudo, e muito mais.

O governo federal não está mostrando qualquer indício que vai garantir essas coisas, os empresários estão mais preocupados em salvar as próprias empresas e o próprio bolso a pensar na população (como já era de se esperar, afinal o próposito de uma empresa é o lucro e não o bem estar social) e deixam a gente brigando por migalhas no supermercado e competindo quem vai se ariscar a morrer primeiro pra salvar a economia.

Independente de qualquer coisa nossos empregos não estão a salvo, nossa saúde não está a salvo, nossas vidas não estão a salvo e nem mesmo a nossa rotina está.

Então digo que a segurança financeira dessas pessoas não valem o sacrífico da minha saúde, ou até da minha vida ou daqueles que eu amo. Valem o da sua ou dos seus?

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