Obrigado a todos.

Sara Baião
Nest Collective Writing Wall
3 min readOct 24, 2017

15 e 16 de Outubro. A estas datas nunca mais vai ser preciso acrescentar a descrição “o dia em que o centro Portugal ardeu”. Estes dias estão marcados. Nos terrenos, nas estradas, nas placas de sinalização, na mente dos afectados directa e indirectamente, na pele dos que perderam tudo, mesmo dos que pouco tinham a perder.

17 de Outubro. A data que fica escrita na história do Nest Collective e de todos os que de uma forma ou de outra contribuíram para ajudar as vítimas deste flagelo. Gostaríamos de poder mencionar todos os que nos tocaram à campainha carregados de bens e com a promessa de voltar mais tarde para trazer ainda mais. Da senhora que parecia não ter muitas posses mas que trazia o coração e dois sacos bem cheios; daqueles que ao abrir da porta sorriam e nos perguntavam até quando recolhíamos bens. O agradecimento estende-se a todas as entidades patronais do Nest Collective que nos incentivaram e apoiaram, mesmo quando o trabalho se acumulava.

De um dia para o outro começaram a chover pedidos de ajuda nas redes sociais. Famílias, associações e amigos. Amigos que nunca pensámos ver numa situação similar. Infelizmente não fomos contactados apenas por pessoas solidárias, começaram a cair pedidos de ajuda de famílias que perderam tudo, de pessoas cujos amigos e conhecidos tinham perdido os seus bens, estavam incontactáveis e perdidos ainda no meio de um fumo espesso que teimava em ficar. Não podíamos ficar indiferentes, sentados atrás da televisão a ver imagens de um país carbonizado. Foi assim que tudo começou. Cada um de nós contribuiu com roupa e donativos e fomos recebendo ajuda de amigos e familiares mas também de pessoas que apenas queriam ajudar de alguma forma.

A nossa prioridade não foi entregar bens a bombeiros ou associações mas sim chegar onde ainda não tinha chegado ninguém. Para isso, a Dra Elisabete, assistente social de Arganil, foi indispensável. Correu connosco as aldeias, conduziu-nos a quem precisava, muito, da nossa ajuda, de qualquer ajuda. Foram estes rostos que nos levaram a fazer horas de viagens, horas a selecionar de roupas, por tamanhos, por género; a comprar o que nunca pensamos que faz falta. Mas foram as lágrimas, os abraços sentidos, o sorriso de uma criança que recebeu uma bola; uma simples bola, que nos fez continuar a querer ajudar. Que mundo é este em que um casaco quentinho ou um pack de meias parece ser a melhor prenda de uma criança?

Nesta semana percebemos que a ajuda vai muito para além de roupas e enlatados. Pessoas sem água, luz, gás precisavam de tudo um pouco. Conhecemos pessoas que recolhiam entulho das suas casas mas que pediam ajuda para outras famílias, idosos solitários, estrangeiros que procuravam um retiro na natureza sem casa, sem família.

Nesta semana recolhemos mais de 1000kg de roupa, 400kg de comida e 200kg de outros artigos. Percorremos Anceriz, Arganil, São Pedro de Alva, Avô, Coja, Cerdeira e Vila Nova de Alva.

Foi uma experiência que nos ensinou a olhar para a nossa vida de outra forma, a perceber a pobreza que se reflecte nas estatísticas. Gostamos de pensar que fizemos algo bom mas acima de tudo queremos apelar à memória. Não vamos deixar cair estas pessoas no esquecimento. Não vamos deixar que a ajuda fique por aqui. Há hortas para revitalizar, casas para construir, há floresta que precisa de renascer. Há pessoas que não viviam bem mas que agora vivem ainda pior.

E juntos, podemos fazer a diferença.

Um obrigado à Patrícia Pato pela ajuda a redigir este texto.

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