Tópicos quentes de pesquisa na área de Internet — Parte II: Internet das Coisas
Na texto anterior foi iniciada uma série de postagens sobre os tópicos quentes de pesquisa na área de Internet, falando sobre uma visão sobre CDNs. Nesse texto, será abordado outro tópico que está em alta no momento: Internet das coisas.
Apesar do seu nome, não se trata de uma outra Internet no senso estrito da definição. Segundo Whitmore [1], mesmo não havendo uma definição universal para Internet das coisas, o conceito básico é o de que objetos do cotidiano podem ser equipados com funcionalidades de identificação, sensoriamento, roteamento e processamento que permitam a comunicação entre eles e com outros dispositivos e serviços através da Internet para atingir algum objetivo útil. Um exemplo engraçado e até mesmo assustador é explorado por Demi Getschko em sua coluna, onde a geladeira, sabendo a data de aniversário de seu dono, encomenda a comida para uma festa surpresa e convida seus amigos.
As ideias em que se baseiam a Internet das coisas não são novas. Por muitos anos, tecnologias como RFID e rede de sensores têm sido usadas no contexto industrial para rastreamento de itens. A Internet das coisas representa uma evolução no uso dessas tecnologias em termos de quantidade e variabilidade de dispositivos, assim como da comunicação entre eles através da Internet [1].
O universo da Internet das coisas é bastante heterogêneo devido ao uso de vários dispositivos, com diferentes capacidades. Por exemplo, uma das aplicações possíveis da Internet das coisas seria o monitoramento de certas propriedades do meio ambiente para averiguar se estão adequadas para a plantação de uma espécie específica em uma determinada região. Através desse monitoramento, seria possível tomar as atitudes cabíveis a fim de tornar a área mais propícia para a plantação. Além disso, o próprio dispositivo poderia ser capaz de tomar tais providências. Nesse exemplo específico, são necessários diferentes sensores, como de luminosidade, de umidade, de temperatura, etc, para monitorar o ambiente. E então, dependendo da umidade do solo e da temperatura, os sensores poderiam acionar um outro dispositivo que garantisse a irrigação dessa plantação. Todos esses aparelhos devem ser capazes de se comunicar através da rede para enviar e receber as informações pertinentes.
De uma forma resumida, Salman [2] coloca que a Internet das coisas ainda tem vários desafios a enfrentar para que possa se popularizar, como mobilidade, confiabilidade, escalabilidade, gerenciamento, disponibilidade, interoperabilidade, segurança e privacidade.
Quanto à mobilidade, os dispositivos da Internet das coisas precisam se mover livremente e mudar de rede e o seu endereço IP baseadas em sua localização. Assim, o protocolo de roteamento tem que lidar com muita sobrecarga para refazer as rotas cada vez que um dispositivo se conecta ou se desconecta de uma rede. Além disso, a mobilidade pode resultar em uma mudança de prestador de serviços, o que pode adicionar outra camada de complexidade devido à interrupção do serviço e mudança de rede [2].
A confiabilidade significa que um sistema deve estar trabalhando perfeitamente e entregando tudo o que foi especificado para que ele faça de forma correta [2]. É um requisito crítico em aplicações que requerem respostas de emergência, como por exemplo, sistemas de healthcare nos quais há alguma vida assistida. Normalmente, são colocados sensores nos equipamentos de monitoramento utilizados pelos pacientes. A informação recolhida por estes sensores é disponibilizada através da Internet para médicos e membros da família, a fim de melhorar o tratamento e a capacidade de resposta a incidentes [1]. Em casos como o exemplificado, o sistema deve ser altamente confiável e rápido na coleta de dados, comunicando e tomando decisões, visto que eventuais erros podem levar a cenários desastrosos, como a morte de uma pessoa.
A escalabilidade é outro desafio de aplicações de Internet das coisas. Uma vez que há milhões de dispositivos conectados em uma mesma rede, gerenciar sua distribuição não é uma tarefa fácil. Além disso, as aplicações de Internet das coisas devem ser tolerantes a novos serviços e à adesão constante de outros dispositivos na rede e, portanto, devem ser projetadas para permitir a extensão de serviços e de operações [2].
Mais um desafio na Internet das coisas é o gerenciamento desse grande número de dispositivos interconectados, mantendo o controle das falhas, das configurações, da contabilidade, do desempenho e da segurança, conhecido como FCAPS na área de redes [2]. As soluções convencionais de gerenciamento como o Simple Network Management Protocol (SNMP) podem não ser suficientes para dar conta de toda essa complexidade e também podem ser “pesadas” demais para alguns dispositivos.
A questão de disponibilidade em Internet das coisas envolve questões de software e hardware. A disponibilidade de software significa que o serviço é prestado para quem está autorizado a recebê-lo, enquanto a disponibilidade de hardware significa que os dispositivos existentes são de fácil acesso e são compatíveis com a funcionalidade e protocolos da Internet das coisas. Além disso, esses protocolos devem ser compactos para serem capazes de ser inseridos em dispositivos restritivos em termos de memória e uso de energia [2].
A interoperabilidade, por sua vez, é a ideia de que os dispositivos e protocolos heterogêneos precisam ser capazes de trabalhar uns com os outros. Este é um desafio devido ao grande número de diferentes plataformas utilizadas no universo da Internet das coisas. A interoperabilidade deve ser tratada tanto pelos desenvolvedores de aplicativos quanto pelos fabricantes de dispositivos, a fim de que os serviços funcionem, independentemente da especificação da plataforma ou do hardware utilizado pelo cliente [2].
Na referência [2] é apresentado o cenário de protocolos usados no universo da Internet das coisas, conforme pode ser observado na tabela abaixo.
Dentre eles, há ainda um uso grande de protocolos proprietários. O seu uso dificulta a interoperabilidade entre os diversos dispositivos, ou seja, torna-se mais difícil a comunicação entre eles. Além disso, os protocolos usualmente utilizados em computadores e servidores nem sempre são adequados às necessidades dos dispositivos da Internet das coisas. Comumente há restrições em relação à memória e ao consumo de energia neles. O cenário é bastante complexo e têm suscitado muitas pesquisas sobre o tema.
Na parte de protocolos de rede, há um grupo do Internet Engineering Task Force (IETF) chamado 6Lo trabalhando na padronização de alternativas mais enxutas do IPv6 para o uso com as diferentes tecnologias do universo da Internet das coisas. A padronização do 6LowPan, que é um protocolo usado para redes com o padrão IEEE 802.15.4, é um resultado desse grupo. O IEEE 802.15.4, por sua vez, é um padrão que especifica a camada física e efetua o controle de acesso para redes sem fio pessoais de baixas taxas de transmissão.
A criptografia é vista como uma questão chave para garantir a segurança da informação no universo da Internet das coisas [1]. Porém, muitos dispositivos dentro desse cenário não são poderosos o suficiente para aguentar criptografia robusta. Para permitir criptografia no universo da Internet das coisas, os algoritmos precisam ser mais eficientes e usar menos energia, além de ser necessária uma forma eficiente de distribuição das chaves criptográficas.
Finalmente, quanto mais objetos tornam-se rastreáveis através da Internet das coisas, mais sérias tornam-se as ameaças à privacidade. É importante que esteja bem clara e definida para os usuários de quem é a propriedade dos dados coletados pelos dispositivos. Uma ideia é interessante é a de que os objetos inteligentes na Internet das coisas sejam equipados com políticas de privacidade. Quando dois objetos entram em contato, eles podem verificar a política de privacidade um do outro para checar a compatibilidade entre elas antes de se comunicarem [1].
Uma visão de futuro para a Internet das coisas é o da Web das coisas, que propõe o uso de padrões web para integrar objetos inteligentes com a World Wide Web. Através do uso dessas tecnologias será mais fácil para os desenvolvedores construírem aplicações utilizando objetos inteligentes, uma vez que os protocolos atuais podem permitir a interoperabilidade e comunicação mais facilmente de diferentes dispositivos [1].
Outra visão de futuro que envolve a integração de ainda mais dispositivos na Internet das coisas é a Internet das nano-coisas. A Internet de nano-coisas pode ser descrita como a interligação de dispositivos em nanoescala com redes de comunicação e a Internet. Embora a proposta seja de que estes dispositivos se comuniquem através sinais eletromagnéticos, existem inúmeros desafios técnicos que devem ser superados antes que a ideia se torne viável [1].
Continuem acompanhando essa série de posts, onde continuarei a falar sobre os tópicos quentes de pesquisa na área de Internet!
Bibliografia:
[1] Whitmore, A. et al. The Internet of Things — A survey of topics and trends. Information Systems Frontiers 17, 2 (April 2015), 261–274. Disponível em: < http://dl.acm.org/citation.cfm?id=2750627 >. Acesso em: 24 out. 2016.
[2] Salman, T. Internet of Things Protocols and Standards. Disponível em < http://www.cse.wustl.edu/~jain/cse570-15/ftp/iot_prot/ >. Acesso em: 14 out. 2016.