FOMO e o afastamento social

Aline Cardoso
NeuroBreak
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4 min readNov 11, 2020

A pandemia de coronavírus cancelou muitos dos meus planos e acredito que dos seus planos também, mas uma coisa ela não cancelou, “o medo de ficar por fora”.

A sigla FOMO que vem do termo “Fear of Missing Out” ou “medo de ficar por fora” (tradução livre) é definida pelo Dicionário Inglês de Oxford como

“Ansiedade de que um evento empolgante ou interessante possa estar acontecendo em outro lugar, muitas vezes despertado por postagens vistas nas redes sociais.” (tradução livre)

Ou seja, sabe aquela sensação ruim de incapacidade ou de solidão que você sente quando olha suas redes sociais e vê imagens de pessoas viajando e passeando felizes, enquanto só você está em casa olhando para o teto? Isso é FOMO.

Mas aí você pensa,

se o mundo inteiro está vivendo uma pandemia e deveríamos todos estar fazendo afastamento social, ou seja, evitando sair de nossas casas, porque alguém estaria sentindo FOMO?

Primeiro que são poucas as pessoas que ainda estão fazendo afastamento social. Já são 9 meses de pandemia e ficar 9 meses em casa sem poder conviver com familiares e amigos é de adoecer qualquer um. Por isso quem ainda está em casa, provavelmente tem sentido na pele a ansiedade trazida pelo FOMO. Isso porque usamos as redes sociais para nos conectar com quem está longe e assim nos sentirmos menos isolados, porém são essas mesmas redes sociais que nos trazem a sensação de angústia de “só eu estou em casa enquanto todo mundo está se divertindo”.

Segundo que mesmo que todo mundo das suas redes sociais estejam fazendo afastamento social, é bem provável que você sinta o FOMO quando vê experiências digitais das quais não consegue fazer parte. Isso porque talvez você não tenha tempo, ou esteja muito cansado, ou só sem cabeça para aturar live de musculação e pão fermentado. Mas em compensação você sente uma certa ansiedade e angústia quando vê imagens daquele seu amigo que usou a quarentena para ficar sarado, ou aquela sua amiga que fez 10 trilhas em 1 mês, ou aquela sua outra amiga que tem tempo para fazer pão e massa fresca de macarrão todo dia. E enquanto isso você está sentando em casa extremamente ansioso e cansado, checando as redes sociais a cada 5 min enquanto come Serenata de Amor e toma Coca-Cola no gargalo.

A verdade é que as redes sociais são como a beirada do mar, ou seja, parece o lugar mais seguro de ficar, mas a cada 1 min levamos um caixote de informações superficiais. Assim, o que devemos fazer é ir um pouquinho mais para o fundo. Por mais que pareça que iremos nos afogar, é no fundo que as informações podem ser vistas com profundidade e clareza. É lá que a água está calma o suficiente para podermos nadar com com tranquilidade, mas cuidado para não ir fundo demais e chegar nas teorias da conspiração.

Não sei se todo mundo sabe, mas eu sou aluna de mestrado em fisiologia e neurobiologia. E como boa cientista e depois de perder muita gente conhecida para a COVID-19, estou em casa fazendo afastamento social há 9 meses. Foram vários momentos de estresse e angústia pois a pandemia matou a maioria dos meus planos, além de um forte sentimento de incapacidade por perceber que não estava fazendo meu papel de falar sobre ciência fora do meio acadêmico. Além disso comecei a morar no instagram, pois na minha cabeça, esse seria o único jeito de me conectar com as pessoas que eu gosto.

Tudo isso junto só foi piorando até que eu decidi aproveitar melhor meu tempo e escrever. Foi quase que um ato de desespero no qual eu escrevia para me libertar e também para divulgar todo conhecimento sobre neurociência que tenho adquirido nos últimos anos. Além disso, por mais que pareça óbvio, percebi que mandar uma mensagem diretamente para meus amigos nos conecta muito mais do que ver foto no feed. E também defini um tempo máximo de uso do instagram usando o próprio app (configurações > conta > sua atividade > tempo > definir tempo). Tem funcionado para mim. Não sei se funcionará para você, mas espero que encontre um jeito de se sentir menos ansioso e sozinho.

Se você tem sentido algo do tipo, não deixe procurar ajuda ou de conversar com seu/sua terapeuta sobre o assunto.

Se você ficou interessado em saber se você tem sentido o FOMO ou “medo de ficar por fora”, existe uma medida com 10 itens que usa uma escala Likert na qual as pessoas indicam quão verdadeira é a afirmação de cada item para cada experiência cotidiana.

Esse texto explica direitinho como a medida funciona
Fear of missing Out Scale (FoMOs)

Referências

Hayran, C., Anik, L. and Gürhan-Canli, Z., 2020. A threat to loyalty: Fear of missing out (FOMO) leads to reluctance to repeat current experiences. PloS one, 15(4), p.e0232318.

https://medium.com/behavioral-science-unit/fomo-fear-of-missing-out-scale-da091327ad65.

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Em busca da descomplicação da neurociência do comportamento humano. / Searching for the uncomplicated neuroscience of human behavior.

Aline Cardoso
Aline Cardoso

Written by Aline Cardoso

Estudando o comportamento humano e tentando entender o meu; (ela/dela); Doutoranda em Fisiologia — Neurociência (UFRJ); Brasil