A condição humana de interdependência e a solidão — Artigo

Luca FFX
Neurociência, Psicologia e Filosofia
5 min readJan 12, 2018
Série Mr Robot Temporada 3

Somos incapazes de viver de forma separada da sociedade, necessitamos de uma série de conexões em forma de troca de trabalhos para o desenvolvimentos de produtos, necessitamos de outras pessoas para trocas de conhecimentos e a aquisição do mesmo, necessitamos de contato humano para suprir necessidades emocionais. Mas no entanto, apesar de sermos tão conectados vivemos a contradição de querer a solidão. Nesse texto irei lidar com os dois lados da moeda, mais especificamente a interdependência emocional e darei introdução a solidão e como ela é uma resposta a Interdependência.

1.Interdependência

Personagem Dr Manhanttan da HQ Watchmen

Interações cansam, quando você interage com outro ser humano há o comprometimento implícito de diversas ações. Indiretamente você está lidando com o acumulo de experiências que aquela individuo teve durante a vida e como a os seus genes corresponderam a essas situações. Isso cansa, pois nós nunca conseguiremos entender alguém além da superfície, as pessoas estão em constante fluxo de mudança, além da enorme bagagem que carregam. É um trabalho árduo conhecer mesmo que apenas partes de alguém, e muitas vezes um esforço para alcançar algo decepcionante.

Esse é um dos principais problemas com interações, a perspectiva de troca da expectativa imaterial como produto. Se eu ofereço suporte emocional para você, logo espero que quando eu necessitar do amonte de suporte que lhe forneci você me ofereça também, ou seja, eu quantifico e espero retorno. Mas com base em que? Eu faço isso com base nas MINHAS experiências e filtros, algo único, e espero que a pessoa retorne da mesma forma, isso não irá acontecer e com ele vem a frustração.

Como mecanismo de defesa a essa falta de compreensão do outro “eu” tendemos a ver as pessoas como potenciais, acreditamos piamente que com o suficiente de interação o outro irá absorver a nossa personalidade e assim aos poucos atingir o equivalente de reciprocidade que exigimos. Claro que, as pessoas mudam conforme as interações que realizam, mas isso é apenas uma parte dela e uma pessoa é a soma de todas as suas partes, interagindo e modificando-as, então a pessoa irá mudar, mas não para o que você quer, provavelmente nem para o que você consiga enxergar casualmente.

E isso quando levado ao extremo causa a interdependência não saudável, interagir com alguém com base no que ela pode vir a ser e não no que a pessoa realmente é dá base a relacionamentos abusivos, e a todo tipo de relações tóxicas. Um reflexo disso na cultura pop é o culto a relacionamentos sociopatas, não tem problema se a pessoa é inerentemente doente a ponto de ser classificada como um risco social, o que importa é que talvez você consiga molda-la com a sua personalidade a ponto dela conseguir corresponder as suas expectativas.

Série The End of The Fucking World

Estou utilizando aqui exemplos de relação amorosas, mas essas interações permeiam amizades, família e assim por diante. Essa idealização futura frustra os dois lados, pois a pessoa nunca irá atingir o que o outro pede e nem o outro irá ter o que espera da pessoa.

Há também a interdependência saudável, nós SOMOS seres interdependentes, então a questão não é se devemos ser ou não, mas sim em como lidamos com ela. A valorização da individualidade do outro, o reconhecimento e ponderação, “se é isso que você quer para você”, é a maior forma de respeito num relacionamento.

2. Solidão

Neon Genesis Evangelion

Interações são complicadas, difíceis e frustrantes, no entanto isso não quer dizer que sejam ruins, são apenas consequências que podem ser em maior ou menor grau. No entanto, por mais inevitável que seja evitar qualquer tipo de interação por vezes desejamos ficar solitários para sempre, talvez se não precisássemos nos preocupar com o outro sejamos mais livres, e isso é verdade. A interação com o outro limita a nossa liberdade, não a toa que vivemos em um estado democrático de DIREITO que é feito para que a convivência em sociedade seja praticável, limitando assim ações e consequentemente a liberdade, será então que viver isolado seria melhor?

Imagine que você está em um espaço infinito sem nada material, você fica apenas flutuando, não tem noção de direção e nada para referenciar-se, você tem total liberdade. Se eu colocar um chão nesta realidade, você ganhara noção de direção, no entanto perderá a sua liberdade ilimitada. Isso é o que acontece com alguém em total solidão emocional, a pessoa tem liberdade ilimitada com relação a si, porém perde a noção de identificação. Para conseguir se entender é necessário ter referencial e achamos isso no outrem, em um nível exagerado é prejudicial, mas normalmente isso nos guia para a compreensão de si, se não entendermos a nós mesmos o que resta de nossa mente?

A única coisa que sobra quando estamos na total imersão da solidão é a reflexão de momentos passados e a introspecção do “que poderia ser”, pois apesar de continuarmos tendo controle do presente, o passado é a única parte que consegue manter-se como referência, porque perdermos o referencial do presente sem o outrem. Mas o passado torna-se vago com o passar do tempo e assim também a noção de eu quando somos isolados.

Isso pode ocorrer mesmo quando estamos cercados fisicamente de outras pessoas e pode desencadear diversos tipos de patologias, portanto a solidão total não é algo desejável, mas sim um peso que por vezes é construído para se defender das consequências da interdependência.*

*Neste texto não irei me aprofundar nestes temas, mas é importante salientar que a parte de solidão é apenas introduzida e irei explana-la em um texto separado.

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